quarta-feira, 7 de outubro de 2015

STF proíbe doações de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais e partidos políticos. Entenda a decisão


Contribuições para campanhas eleitorais e partidos políticos
A legislação eleitoral permite que pessoas físicas e pessoas jurídicas façam doações em dinheiro (ou em bens estimáveis em dinheiro) para campanhas eleitorais e também para partidos políticos. Isso está previsto na Lei nº 9.504/97 (conhecida como Lei das Eleições) e na Lei nº 9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos).

Veja abaixo os dois principais artigos que tratam sobre o tema:

Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições):
Art. 81. As doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais poderão ser feitas a partir do registro dos comitês financeiros dos partidos ou coligações.

Lei nº 9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos):
Art. 39. Ressalvado o disposto no art. 31, o partido político pode receber doações de pessoas físicas e jurídicas para constituição de seus fundos.

ADI 4650
O Conselho Federal da OAB ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4650) no STF pedindo que sejam declarados inconstitucionais os dispositivos da legislação eleitoral (Leis nº 9.096/95 e nº 9.504/97) que autorizam doações de empresas a candidatos e a partidos políticos.
Na ação, a entidade também pede que seja fixado um limite máximo para as doações feitas por pessoas físicas.
Para a OAB, existe uma infiltração do poder econômico nas eleições, o que gera graves distorções, como a desigualdade política, na medida em que aumenta a influência dos mais ricos sobre o resultado dos pleitos eleitorais, e, consequentemente, sobre a atuação do próprio Estado. Além disso, essa forte influência do poder econômico inviabiliza a possibilidade de sucesso eleitoral dos candidatos que não têm patrimônio para suportar os gastos de campanha nem acesso aos financiadores privados.

Qual foi o resultado do julgamento?
O STF julgou parcialmente procedente a ADI e entendeu que:
• os dispositivos legais que autorizam as contribuições de pessoas JURÍDICAS para campanhas eleitorais e partidos políticos são inconstitucionais.
• por outro lado, as contribuições de pessoas FÍSICAS são válidas e podem continuar sendo feitas de acordo com a legislação em vigor.
STF. Plenário. ADI 4650/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 16 e 17/9/2015 (Info 799).

Veja abaixo o resumo dos principais argumentos utilizados pelo STF:

Violação ao regime democrático e à cidadania
Para o STF, as doações feitas por pessoas jurídicas para campanhas eleitorais não são compatíveis com o regime democrático e com a cidadania.

Pessoa jurídica não exerce cidadania
O exercício de cidadania, em sentido estrito, pressupõe três modalidades de atuação física:
a) o “jus sufragius”: direito de votar;
b) o “jus honorum”: o direito de ser votado; e
c) o direito de influir na formação da vontade política por meio de instrumentos de democracia direta como o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular de leis.

Essas modalidades de exercício da cidadania são inerentes às pessoas naturais e, por isso, é desarrazoado estendê-las para as pessoas jurídicas.

Doações feitas por pessoas jurídicas inflacionam os custos das campanhas
A participação de pessoas jurídicas apenas encarece o processo eleitoral, sem oferecer, como contrapartida, a melhora e o aperfeiçoamento do debate.
Esse aumento dos custos de campanhas não é acompanhado do aprimoramento do processo político, com a veiculação de ideias e de projetos pelos candidatos.
Na verdade, o que se observa é que os candidatos que gastam maiores recursos em suas campanhas possuem, em geral, maior êxito nas eleições.

Desequilíbrio da competição e a violação do princípio da igualdade
A excessiva participação do poder econômico no processo político desequilibra a competição eleitoral e viola a igualdade política entre candidatos. Isso acaba repercutindo na formação do quadro representativo, ou seja, nas pessoas que são eleitas.
O êxito das eleições atualmente depende mais dos recursos despendidos nas campanhas do que das plataformas e ideias políticas. Essa realidade é muito nociva porque faz com que grande parte da população fique desestimulada a disputar os pleitos eleitorais já que não teria condições econômicas de ter sucesso.

Mesmo sem as doações de pessoas jurídicas, será possível a realização das campanhas
Vale ressaltar que o fim das doações feitas por pessoas jurídicas não prejudicará a sobrevivência dos partidos políticos nem impedirá que os candidatos façam suas campanhas. Isso porque todos os partidos políticos têm acesso ao fundo partidário e à propaganda eleitoral gratuita nos veículos de comunicação, podendo assim promover suas ideais e propostas.

Não basta melhorar os mecanismos de controle dos financiamentos de campanha
Havia um argumento no sentido de que as doações de pessoas jurídicas deveriam continuar sendo permitidas e que o mais importante seria melhorar os mecanismos de controle desse financiamento.
Tal argumentação foi afastada.
Entendeu-se que isso seria insuficiente para resolver o atual cenário, no qual o poder político mostra-se atraído pelo poder econômico.

Mas as pessoas jurídicas poderão continuar doando para campanhas e partidos de forma escondida ("caixa dois")...
É verdade. Isso é possível. No entanto, tal realidade não pode servir como argumento para evitar que o STF declare inconstitucionais as leis que autorizam a doação por pessoas jurídicas.
A possibilidade de que as empresas continuem a investir elevadas quantias — não contabilizadas (caixa dois) — nas campanhas eleitorais não constitui empecilho para que o STF declare ser errado o atual modelo.

Violação à isonomia
O STF invocou ainda um último argumento para declarar inconstitucionais as doações por pessoas jurídicas. Trata-se do fato de que o art. 24 da Lei das Eleições proíbe que determinadas pessoas jurídicas façam doações. É o caso, por exemplo, das associações de classe, entidades sindicais e entidades do terceiro setor. Como resultado dessa proibição, o que se observava, na prática, é que apenas as empresas privadas (que se destinam ao lucro) faziam doações. Isso representava um tratamento desigual entre as próprias pessoas jurídicas, já que as empresas privadas poderiam doar e as entidades sem fins lucrativos e os sindicatos não.

Dispositivos declarados inconstitucionais:
O STF declarou inconstitucionais:
• o art. 23, §1º, I e II; o art. 24; e o art. 81, “caput” e § 1º, da Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições), que tratam de doações a campanhas eleitorais por pessoas físicas e jurídicas, no ponto em que cuidam de doações por pessoas jurídicas.
• o art. 31; o art. 38, III; o art. 39, “caput” e § 5º, da Lei nº 9.096/95 (Lei Orgânica dos Partidos Políticos), que regulam a forma e os limites em que serão efetivadas as doações aos partidos políticos, também exclusivamente no que diz respeito às doações feitas por pessoas jurídicas.

Votos vencidos
Ficaram vencidos os Ministros Teori Zavascki, Gilmar Mendes e Celso de Mello.

Modulação dos efeitos
O STF cogitou modular os efeitos da decisão, fazendo com que ela somente produzisse efeitos daqui a alguns anos. No entanto, não foi atingido o número mínimo de votos necessários para a modulação (segundo o art. 27 da Lei nº 9.868/99, exige-se o voto de 2/3  dos membros do STF - 8 Ministros - para que haja a modulação dos efeitos).

Assim, a presente decisão já se aplica para as eleições de 2016. O STF afirmou também que a decisão já vale independentemente da publicação do acórdão (algo que não é ordinário, comum, de acontecer).


Em outras palavras, nas próximas eleições (em 2016 e nas seguintes) já não mais serão permitidas doações de PESSOAS JURÍDICAS para as campanhas eleitorais e para os partidos políticos. As leis que permitiam isso foram declaradas inconstitucionais (inválidas).

As doações feitas por PESSOAS FÍSICAS continuam sendo possíveis, na forma como prevista na legislação eleitoral.

STF. Plenário. ADI 4650/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 16 e 17/9/2015 (Info 799).




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