sábado, 6 de fevereiro de 2016

Incide o IPI em importação de veículos automotores por pessoa física, ainda que não desempenhe atividade empresarial, e o faça para uso próprio



IPI
IPI é a sigla para Imposto sobre Produtos Industrializados.
Trata-se de um tributo federal e que incide sobre a produção e a circulação de produtos industrializados.
O IPI foi instituído por meio da Lei nº 4.502/64.

Fato gerador do IPI
Segundo o art. 46 do CTN, o IPI possui três fatos geradores:
I — o desembaraço aduaneiro do produto industrializado, quando de procedência estrangeira;
II — a saída do produto industrializado do estabelecimento industrial ou equiparado a industrial;
III — a arrematação do produto industrializado, quando apreendido ou abandonado e levado a leilão.

Feitas estas considerações, imagine a seguinte situação hipotética:
João, rico advogado, decide importar da Itália, por conta própria, uma Ferrari para utilizar durante os finais de semana.
A Receita Federal cobrou dele o pagamento do IPI, com base no art. 46, I, do CTN.
O advogado ajuizou ação contestando a cobrança sob o argumento de que não incidiria IPI no desembaraço aduaneiro de veículo importado por consumidor para uso próprio.
Segundo argumentou João, o fato gerador do IPI é o exercício de atividade mercantil ou assemelhada, quadro no qual não se encaixa o consumidor final que importa o veículo para uso próprio e não para fins comerciais.
Argumentou, ainda, que o IPI é um imposto não cumulativo (art. 153, § 3º, II, da CF/88), o que significa que é possível compensar o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores, ou seja, o valor pago na operação imediatamente anterior pode ser abatido do mesmo imposto em operação posterior (art. 49 do CTN). João argumentou que o IPI só pode incidir nos casos em que a pessoa que importou ainda irá “repassar” esse custo do imposto para a pessoa que comprar depois. No caso dele, como ninguém irá comprar depois, ele não tem que pagar o IPI.

A questão chegou até o STF. O que decidiu a Corte? Incide IPI no caso de importação de veículos para uso próprio?
SIM.

Incide o IPI em importação de veículos automotores por pessoa natural, ainda que não desempenhe atividade empresarial, e o faça para uso próprio.
STF. Plenário. RE 723651/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 03/02/2016.

Não existe imunidade para a importação de veículos
A CF/88 estabelece a imunidade do IPI para produtos exportados. Isso não ocorre, contudo, para produtos importados. Assim, não existe imunidade no caso de importação de veículos. E não importa se quem importou é pessoa física ou jurídica, assim como também não interessa o fato de o importador não exercer o comércio e adquirir o bem para uso próprio.

Não há bitributação e o princípio da não cumulatividade não autoriza a dispensa do imposto
A cobrança do IPI não afronta o princípio da não cumulatividade nem implica bitributação.
Não há que se falar em bitributação porque o IPI só incidirá uma vez: no momento do desembaraço aduaneiro. Caso posteriormente ele decida vender o carro, não terá que pagar novamente o IPI.
Não há que se falar em não exigência do imposto por conta do princípio da não cumulatividade. Isso porque o fato de não haver uma operação posterior na qual o importador pudesse fazer o abatimento do valor pago na importação não conduz à conclusão de que o tributo, nesta hipótese, será indevido, pois tal conclusão equivaleria a conceder uma isenção de tributo, ao arrepio da lei.
Nas importações para uso próprio, o importador age como substituto tributário do exportador, que não pode ser alcançado pelas leis brasileiras, descaracterizando o IPI como tributo indireto, em tais hipóteses.

Princípio da isonomia
A cobrança do IPI para importação de veículos está de acordo com o princípio da isonomia, uma vez que promove igualdade de condições tributárias entre o fabricante nacional, já sujeito ao imposto em território nacional, e o fornecedor estrangeiro. Isso porque o fornecedor estrangeiro, como está exportando o produto, não paga imposto no país de origem e este chegaria ao Brasil em condições muito mais favoráveis que os produtos produzidos na indústria nacional.

Mudança de entendimento
Vale ressaltar que o julgamento acima representa radical mudança de entendimento. Isso porque tanto o STF como o STJ entendiam que NÃO incidia IPI na importação de veículos para uso próprio. O tema havia sido recentemente firmado pelo STJ em sede de recurso especial repetitivo:  “É firme o entendimento no sentido de que não incide IPI sobre veículo importado para uso próprio, tendo em vista que o fato gerador do referido tributo é a operação de natureza mercantil ou assemelhada e, ainda, por aplicação do princípio da não cumulatividade.” (STJ. 1ª Seção. REsp 1396488/SC, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 25/02/2015).
Havia também precedentes do STF neste mesmo sentido: RE 550170 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 7/6/2011; RE 255090 AgR, Rel. Min. Ayres Britto, julgado em 24.8.2010.

Negada a modulação dos efeitos
Como houve uma mudança de entendimento do STF sobre o tema, o Min. Roberto Barroso suscitou a possibilidade de haver a modulação dos efeitos.
Contudo, o Plenário da Corte rejeitou a modulação dos efeitos.
Assim, a tese firmada (incidência do IPI) se aplica também às operações de importação realizadas anteriormente à decisão do STF. Isso significa que quem importou veículos para uso próprio confiando nas decisões do STJ e do STF vai ter uma surpresa desagradável e terá que pagar o imposto.



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