sábado, 29 de fevereiro de 2020

Não é cabível a realização de audiência de custódia por meio de videoconferência



Audiência de custódia
Audiência de custódia consiste...
- no direito que a pessoa presa possui
- de ser conduzida (levada),
- sem demora (CPP adotou o máximo de 24h),
- à presença de uma autoridade judicial (magistrado)
- que irá analisar se os direitos fundamentais dessa pessoa foram respeitados (ex: se não houve tortura)
- se a prisão em flagrante foi legal ou se deve ser relaxada (art. 310, I, do CPP)
- e se a prisão cautelar (antes do trânsito em julgado) deve ser decretada (art. 310, II) ou se o preso poderá receber a liberdade provisória (art. 310, III) ou medida cautelar diversa da prisão (art. 319).

Previsão
A audiência de custódia é prevista na Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), que ficou conhecida como “Pacto de San Jose da Costa Rica”, promulgada no Brasil pelo Decreto 678/92.
Veja o que diz o artigo 7º, item 5, da Convenção:
Artigo 7º - Direito à liberdade pessoal
(...)
5. Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais (...)

Regulamentação
Ocorre que, até o final de 2019, não havia uma lei no Brasil disciplinando a audiência de custódia.
Diante desse cenário, e a fim de dar concretude à previsão da CADH, o STF, em 09/09/2015, deferiu medida cautelar na ADPF 347/DF e determinou que, no prazo de até 90 dias, os Juízes e Tribunais viabilizassem “o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, contado do momento da prisão” (Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJe 19/02/2016)
Diante disso, em 15/12/2015, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 213, disciplinando a audiência de custódia.
No fim de 2019, foi editada a Lei nº 13.964/2019 (chamada de Pacote Anticrime) inserindo no CPP a previsão expressa da audiência de custódia. Vejamos os dispositivos inseridos ou alterados pela Lei nº 13.964/2019:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
Antes da Lei 13.964/2019
ATUALMENTE
Art. 287.  Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará à prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado.
Art. 287. Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará a prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado, para a realização de audiência de custódia.

Houve o detalhamento da audiência de custódia no art. 310 do CPP, com redação dada pela Lei nº 13.964/2019.

CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
Antes da Lei 13.964/2019
ATUALMENTE
Art. 310.  Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:
(...)
Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente:
(...)
                                                                                         
Parágrafo único.  Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.
§ 1º Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato em qualquer das condições constantes dos incisos I, II ou III do caput do art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento obrigatório a todos os atos processuais, sob pena de revogação.

Proibição genérica de liberdade provisória
O novo § 2º do art. 310 afirma que o juiz deverá negar liberdade provisória se o flagranteado:
• for reincidente;
• integrar organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de fogo de uso restrito.
                                                                                         
Não havia § 2º do art. 310.
§ 2º Se o juiz verificar que o agente é reincidente ou que integra organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de fogo de uso restrito, deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares.

Possibilidade deste novo § 2º do art. 310 ser declarado inconstitucional
O STF entende que é inconstitucional a lei que proíbe a liberdade provisória de forma genérica.
A lei, quando afasta a concessão de liberdade provisória de forma genérica, retira do juiz a oportunidade de, no caso concreto, analisar os pressupostos da necessidade ou não da prisão cautelar.
Cabe ao magistrado, e não ao legislador, verificar se se configuram ou não, em cada caso, hipóteses que justifiquem a prisão cautelar. Isso porque a Constituição Federal não permite a prisão ex lege (ou seja, apenas por força de lei).
Nesse sentido: STF. Plenário. HC 104339/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 10/5/2012.

Responsabilização da autoridade que, injustificadamente, deu causa à não realização da audiência de custódia
Não havia § 3º do art. 310.
§ 3º A autoridade que deu causa, sem motivação idônea, à não realização da audiência de custódia no prazo estabelecido no caput deste artigo responderá administrativa, civil e penalmente pela omissão.

Não realização da audiência de custódia em 24 horas enseja a ilegalidade da prisão
Vale ressaltar que, mesmo sendo reconhecida a ilegalidade, o flagranteado não será necessariamente colocado em liberdade considerando que é possível a decretação da prisão preventiva:

Não havia § 4º do art. 310.
§ 4º Transcorridas 24 (vinte e quatro) horas após o decurso do prazo estabelecido no caput deste artigo, a não realização de audiência de custódia sem motivação idônea ensejará também a ilegalidade da prisão, a ser relaxada pela autoridade competente, sem prejuízo da possibilidade de imediata decretação de prisão preventiva.*

* Observação:
No dia 22/01/2020, o Ministro Luiz Fux, vice-presidente do STF, proferiu decisão monocrática nas ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305, suspendendo a eficácia de diversos dispositivos da Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime). Esse novo § 4º do art. 310 do CPP, que prevê a liberalização da prisão pela não realização da audiência de custódia no prazo de 24 horas, encontra-se suspenso até que o Plenário do STF aprecie a decisão cautelar. Ao estudar, confira se essa decisão foi mantida ou não e se o dispositivo está produzindo efeitos.

A audiência de custódia deve ser realizada apenas em casos de prisão em flagrante ou também nas demais espécies de prisão (exs: prisão preventiva, prisão temporária etc)?
Também nas demais espécies. Nesse sentido, veja o que diz o art. 13 da Resolução 213/2015 do CNJ:
Art. 13. A apresentação à autoridade judicial no prazo de 24 horas também será assegurada às pessoas presas em decorrência de cumprimento de mandados de prisão cautelar ou definitiva, aplicando-se, no que couber, os procedimentos previstos nesta Resolução.
Parágrafo único. Todos os mandados de prisão deverão conter, expressamente, a determinação para que, no momento de seu cumprimento, a pessoa presa seja imediatamente apresentada à autoridade judicial que determinou a expedição da ordem de custódia ou, nos casos em que forem cumpridos fora da jurisdição do juiz processante, à autoridade judicial competente, conforme lei de organização judiciária local.

A nova redação o art. 287 do CPP, dada pela Lei nº 13.964/2019, também indica que não apenas a prisão em flagrante, mas também as prisões decorrentes de mandado (ex: prisão preventiva) ensejam a realização de audiência de custódia. Veja:
Art. 287. Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará a prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado, para a realização de audiência de custódia.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:
O Juízo Federal da 4ª Vara de Guarulhos decretou a prisão preventiva de João.
O cumprimento do mandado de prisão ocorreu na cidade de Curitiba/PR, sendo o preso levado para a Superintendência da Polícia Federal no Paraná.
O Juízo Federal da 4ª Vara de Guarulhos foi informado de que houve a prisão. Ele, então, expediu carta precatória para que um dos Juízes Federais de Curitiba fizesse a audiência de custódia.
A carta precatória foi distribuída para o Juízo Federal da 2ª Vara de Curitiba, que se declarou incompetente para a realização do ato por entender que a audiência de custódia poderia ser realizada pelo Juízo Deprecante (Juízo Federal da 4ª Vara de Guarulhos) por meio de videoconferência.
O Juízo Federal da 4ª Vara de Guarulhos não concordou com a providência, razão pela qual ficou configurado conflito negativo de competência, a ser resolvido pelo STJ (art. 105, I, “d”, da CF/88).

O STJ concordou com o argumento do Juízo Federal de Curitiba? A audiência deverá ser realizada por videoconferência?
NÃO.
A Resolução nº 213 do CNJ é clara ao estabelecer que, no caso de cumprimento de mandado de prisão fora da jurisdição do Juiz que a determinou, a apresentação do preso, para a audiência de custódia, deve ser feita à autoridade competente na localidade em que ocorreu a prisão, de acordo com a Lei de Organização Judiciária local.
Uma das finalidades precípuas da audiência de custódia é verificar se houve respeito aos direitos e garantias constitucionais da pessoa presa. Esse exame precisa ser feito pelo magistrado com jurisdição na localidade em que ocorreu a prisão. É essa autoridade judicial que tem competência para tomar medidas para resguardar a integridade do preso, bem assim de fazer cessar agressões aos seus direitos fundamentais, e também determinar a apuração das responsabilidades, caso haja relato de que houve prática de torturas e maus tratos.
Justamente por isso, a realização por videoconferência atenta contra ratio essendi (razão de ser) da audiência de custódia.
Outro motivo apontado pelo STJ foi a ausência de previsão legal. Assim, também porque não há previsão legal de audiência de custódia por meio de videoconferência, compete a sua realização ao Juízo com jurisdição na localidade em que se deu o cumprimento do mandado de prisão preventiva.

Em suma:
Não é cabível a realização de audiência de custódia por meio de videoconferência.
A audiência de custódia, no caso de mandado de prisão preventiva cumprido fora do âmbito territorial da jurisdição do Juízo que a determinou, deve ser efetivada por meio da condução do preso à autoridade judicial competente na localidade em que ocorreu a prisão. Não se admite, por ausência de previsão legal, a sua realização por meio de videoconferência, ainda que pelo Juízo que decretou a custódia cautelar.
STJ. 3ª Seção. CC 168.522-PR, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 11/12/2019 (Info 663).

Decisão do Min. Dias Toffoli como Presidente do CNJ
Vale ressaltar que, administrativamente, em 19/11/2019, o Min. Dias Toffoli, no exercício da função de Presidente do CNJ, deferiu medida liminar para suspender resolução que permitia a realização da audiência de custódia por videoconferência (Processo 0008866-60.2019.2.00.0000 – CNJ). Veja alguns trechos da decisão:
“De outro lado, sem olvidar da reconhecida importância da ferramenta ora em análise para o trâmite dos procedimentos judiciais [videoconferência], sua utilização para as audiências de custódia aparentemente contrasta com os princípios e as garantias constitucionais que a institucionalização deste procedimento buscou preservar.
(...)
(...) a apresentação pessoal do preso é fundamental para inibir e, sobretudo, coibir, as indesejadas práticas de tortura e maus tratos, eis que a 'transmissão de som e imagem' não tem condições de remediar as vantagens que o contato e a relação direta entre juiz e jurisdicionado proporciona'. (...)”

Lei nº 13.964/2019
Vale ressaltar que o caso acima foi analisado antes da Lei nº 13.964/2019. No entanto, penso que a solução seria a mesma porque essa Lei não disciplinou o tema de forma diferente da Resolução do CNJ, que continuará a ser aplicada para os casos omissos do CPP.

ALGUNS ASPECTOS SOBRE A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA QUE COSTUMAM SER COBRADOS EM PROVAS
A explicação do julgado acabou. No entanto, se você ainda tiver um tempo, veja alguns pontos muito cobrados nas provas:

Se for preso com foro privativo
No caso de prisão em flagrante delito da competência originária de Tribunal, a apresentação do preso poderá ser feita a um juiz que o Presidente do Tribunal ou Relator designar para esse fim.

Se o preso estiver internado ou impossibilitado de comparecer
Estando a pessoa presa acometida de grave enfermidade, ou havendo circunstância comprovadamente excepcional que a impossibilite de ser apresentada ao juiz no prazo do caput, deverá ser assegurada a realização da audiência no local em que ela se encontre e, nos casos em que o deslocamento se mostre inviável, deverá ser providenciada a condução para a audiência de custódia imediatamente após restabelecida sua condição de saúde ou de apresentação.

Se não tiver juiz na comarca
Se, por qualquer motivo, não houver juiz na comarca, a pessoa presa será levada imediatamente ao substituto legal.

Quem participa da audiência
A audiência de custódia será realizada na presença do Ministério Público e da Defensoria Pública, caso a pessoa detida não possua defensor constituído.
É vedada a presença dos agentes policiais responsáveis pela prisão ou pela investigação durante a audiência de custódia (IMPORTANTE).

(Cespe – Defensor Público – DPE – DF/2019 – adaptada) Na audiência de custódia, caso não tenha advogado particular, o preso poderá contar com a assistência de defensor público, que acompanhará o ato na presença do juiz, do promotor de justiça, do secretário de audiência e dos policiais que promoveram
a prisão. (ERRADO)

Se a pessoa presa em flagrante delito constituir advogado até o término da lavratura do auto de prisão em flagrante, o Delegado de polícia deverá notificá-lo, pelos meios mais comuns, tais como correio eletrônico, telefone ou mensagem de texto, para que compareça à audiência de custódia.

Direito à conversa reservada antes de começar a audiência
Antes da apresentação da pessoa presa ao juiz, será assegurado seu atendimento prévio e reservado por advogado por ela constituído ou defensor público, sem a presença de agentes policiais. Deve ser reservado local apropriado para garantir a confidencialidade do atendimento prévio com advogado ou defensor público.

O que o juiz deverá perguntar e fazer durante a audiência:
Na audiência de custódia, a autoridade judicial entrevistará a pessoa presa em flagrante, devendo:
1) esclarecer o que é a audiência de custódia, ressaltando as questões a serem analisadas pela autoridade judicial;
2) assegurar que a pessoa presa não esteja algemada, salvo em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, devendo a excepcionalidade ser justificada por escrito;
3) dar ciência sobre seu direito de permanecer em silêncio;
4) questionar se lhe foi dada ciência e efetiva oportunidade de exercício dos direitos constitucionais inerentes à sua condição, particularmente o direito de consultar-se com advogado ou defensor público, o de ser atendido por médico e o de comunicar-se com seus familiares;
5) indagar sobre as circunstâncias de sua prisão ou apreensão;
6) perguntar sobre o tratamento recebido em todos os locais por onde passou antes da apresentação à audiência, questionando sobre a ocorrência de tortura e maus tratos e adotando as providências cabíveis;
7) verificar se houve a realização de exame de corpo de delito, determinando sua realização nos casos em que:
a) não tiver sido realizado;
b) os registros se mostrarem insuficientes;
c) a alegação de tortura e maus tratos referir-se a momento posterior ao exame realizado;
d) o exame tiver sido realizado na presença de agente policial;

8) abster-se de formular perguntas com finalidade de produzir prova para a investigação ou ação penal relativas aos fatos objeto do auto de prisão em flagrante;

(Cespe – Defensor Público – DPE – DF/2019 – adaptada) Na audiência de custódia, ao entrevistar o preso, o juiz deverá abster-se de formular perguntas com a finalidade de produzir provas sobre os fatos objeto do auto da prisão em flagrante, mas deverá indagar acerca do tratamento recebido nos locais por onde o autuado passou antes da apresentação à audiência, questionando sobre a ocorrência de tortura e maus tratos. (CERTO)

9) adotar as providências a seu cargo para sanar possíveis irregularidades;
10) averiguar, por perguntas e visualmente, hipóteses de gravidez, existência de filhos ou dependentes sob cuidados da pessoa presa em flagrante delito, histórico de doença grave, incluídos os transtornos mentais e a dependência química, para analisar o cabimento de encaminhamento assistencial e da concessão da liberdade provisória, sem ou com a imposição de medida cautelar.

Perguntas do MP e depois da defesa
Após o juiz ouvir a pessoa presa, deverá conceder a palavra ao Ministério Público e depois à defesa técnica, para que estes façam reperguntas compatíveis com a natureza do ato, devendo indeferir as perguntas relativas ao mérito dos fatos que possam constituir eventual imputação.

Requerimentos do MP e da defesa
Depois das perguntas, o MP e a defesa poderão requerer:
I – o relaxamento da prisão em flagrante;
II – a concessão da liberdade provisória sem ou com aplicação de medida cautelar diversa da prisão;
III – a decretação de prisão preventiva;
IV – a adoção de outras medidas necessárias à preservação de direitos da pessoa presa.

Registro em mídia
A oitiva da pessoa presa será registrada, preferencialmente, em mídia, dispensando-se a formalização de termo de manifestação da pessoa presa ou do conteúdo das postulações das partes, e ficará arquivada na unidade responsável pela audiência de custódia.
A ata da audiência conterá, apenas e resumidamente, a deliberação fundamentada do magistrado quanto à legalidade e manutenção da prisão, cabimento de liberdade provisória sem ou com a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, considerando-se o pedido de cada parte, como também as providências tomadas, em caso da constatação de indícios de tortura e maus tratos.
Concluída a audiência de custódia, cópia da sua ata será entregue à pessoa presa em flagrante delito, ao Defensor e ao Ministério Público, tomando-se a ciência de todos, e apenas o auto de prisão em flagrante, com antecedentes e cópia da ata, seguirá para livre distribuição.

Se o juiz entender que não é devida ou necessária a prisão
Proferida a decisão que resultar no relaxamento da prisão em flagrante, na concessão da liberdade provisória sem ou com a imposição de medida cautelar alternativa à prisão, ou quando determinado o imediato arquivamento do inquérito, a pessoa presa em flagrante delito será prontamente colocada em liberdade, mediante a expedição de alvará de soltura, e será informada sobre seus direitos e obrigações, salvo se por outro motivo tenha que continuar presa.

Se o preso declarar que foi torturado

Havendo declaração da pessoa presa em flagrante delito de que foi vítima de tortura e maus tratos ou entendimento da autoridade judicial de que há indícios da prática de tortura, será determinado o registro das informações, adotadas as providências cabíveis para a investigação da denúncia e preservação da segurança física e psicológica da vítima, que será encaminhada para atendimento médico e psicossocial especializado.



sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Para que se configure o crime do art. 5º da Lei 13.260/2016 (atos preparatórios de terrorismo) exige-se que o sujeito tenha agido por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião



Lei Antiterrorismo
Em 2016, foi editada a Lei nº 13.260/2016, que “regulamenta o disposto no inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal, disciplinando o terrorismo, tratando de disposições investigatórias e processuais e reformulando o conceito de organização terrorista” (art. 1º).
A Lei de Terrorismo prevê os seguintes crimes:
• Praticar atos de terrorismo (art. 2º);
• Promover, constituir, integrar ou prestar auxílio à organização terrorista (art. 3º);
• Realizar atos preparatórios de terrorismo (art. 5º);
• Receber, oferecer, obter, investir etc recursos de qualquer natureza para a prática de crimes previstos na Lei nº 13.260/2016 (art. 6º).

Conceito legal de terrorismo
A Lei nº 13.260/2016 define o crime de terrorismo nos seguintes termos:
Art. 2º O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.

Crime de terrorismo
O crime de terrorismo está tipificado no § 1º do art. 2º da Lei nº 13.260/2016:
Art. 2º (...)
§ 1º São atos de terrorismo:
I - usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa;
II – (VETADO);
III - (VETADO);
IV - sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento;
V - atentar contra a vida ou a integridade física de pessoa:
Pena - reclusão, de doze a trinta anos, além das sanções correspondentes à ameaça ou à violência.

Atos preparatórios de terrorismo
Art. 5º Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito:
Pena - a correspondente ao delito consumado, diminuída de um quarto até a metade.
§ 1º Incorre nas mesmas penas o agente que, com o propósito de praticar atos de terrorismo:
I - recrutar, organizar, transportar ou municiar indivíduos que viajem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade; ou
II - fornecer ou receber treinamento em país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade.
§ 2º Nas hipóteses do § 1º, quando a conduta não envolver treinamento ou viagem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade, a pena será a correspondente ao delito consumado, diminuída de metade a dois terços.

Sujeito ativo: este delito por ser praticado por qualquer pessoa; trata-se de crime comum.

Sujeito passivo: é a coletividade.

Atos preparatórios:
Em regra, os atos preparatórios de um delito não são punidos. A punição, normalmente, só pode existir se o agente iniciou a prática de atos executórios (art. 14, II, do Código Penal).
O legislador, no entanto, decidiu punir os atos preparatórios do delito de terrorismo. Para isso, ele criou um tipo específico: o presente art. 5º da Lei nº 13.260/2016.
Desse modo, o que o art. 5º pune são os atos preparatórios do crime de terrorismo. Assim, antes que o sujeito inicie a execução do terrorismo, ele já pode ser punido pelo art. 5º.
Vale ressaltar que existem outros exemplos disso, como é o caso do art. 34 da Lei de Drogas.

Caráter subsidiário:
O art. 5º é considerado um crime subsidiário considerando que ele só irá incidir se o agente não praticar nenhum ato executório. Se o agente praticar ato executório, incidirá o próprio crime de terrorismo (art. 2º) e não mais o delito do art. 5º.
Assim, o delito do art. 5º funciona como “soldado de reserva” em relação ao delito de terrorismo previsto no art. 2º, ambos da Lei nº 13.260/2016.

Tipo penal aberto:
A previsão do caput do art. 5º é criticada por alguns doutrinadores porque possui uma redação extremamente aberta já que não descreve quais seriam esses atos preparatórios. Em razão disso, há quem afirme que ele seria inconstitucional.

Conspiração ao terrorismo:
“Realizar atos preparatórios é praticar ou fazer qualquer feito introdutório ou preliminar de terrorismo, razão pela qual, esse tipo pode ser identificado como a criminalização da conspiração ao terrorismo, vocábulo que se assemelha ao crime de conspiracy do direito anglo-saxão, o qual se satisfaz com o planejamento da prática de um único crime. Por exemplo, um terrorista que desenvolve um programa de computador capaz de controlar o sistema de transporte de uma cidade e produzir inúmeros acidentes de trânsito, mas antes de executá-lo ou instalá-lo, é detido em razão de investigações policiais.” (SOUZA, Renee do Ó. Leis penais especiais. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 1948)

Elemento subjetivo: o crime é punido a título de dolo, sendo exigida uma motivação especial. Assim, o agente deve ter praticado a conduta por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião.

Motivação especial:
A tipificação da conduta descrita no art. 5º da Lei Antiterrorismo (atos preparatórios de terrorismo) exige a motivação por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, expostas no art. 2º do mesmo diploma legal.
STJ. 6ª Turma. HC 537.118-RJ, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 05/12/2019 (Info 663).

Conforme vimos, a criminalização dos atos preparatórios do delito de terrorismo exige a interpretação sistemática, não se podendo, portanto, perder de vista a redação do art. 2º ao se analisar o art. 5º.
Assim, não se mostra admissível, do ponto de vista hermenêutico, que o delito subsidiário (art. 5º) tenha âmbito de aplicação diferente do delito principal (art. 2º).
Por esse motivo, a tipificação da conduta descrita no art. 5º exige a motivação por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, expostas no art. 2º da Lei Antiterrorismo.

DOD Plus – investigação e competência
O art. 11 da Lei nº 13.260/2016 prevê o seguinte:
Art. 11. Para todos os efeitos legais, considera-se que os crimes previstos nesta Lei são praticados contra o interesse da União, cabendo à Polícia Federal a investigação criminal, em sede de inquérito policial, e à Justiça Federal o seu processamento e julgamento, nos termos do inciso IV do art. 109 da Constituição Federal.


(Promotor MPE GO 2016 banca própria) A Lei do Terrorismo considerou que os crimes nela previstos são praticados contra o interesse da União, cabendo à Polícia Federal a investigação criminal, em sede de inquérito policial, e à Justiça Federal o seu processamento e julgamento, nos termos do inciso IV do art. 109 da Constituição da República. (CERTO)

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

É possível o inventário extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado



Inventário
Inventário é o procedimento, judicial ou extrajudicial, por meio do qual são arrecadados, descritos, avaliados e liquidados os bens e outros direitos que pertenciam à pessoa morta, e, após serem pagas as dívidas do falecido, o eventual saldo positivo será distribuído entre os seus sucessores (partilha).

Espécies de inventário
• Inventário judicial: é um processo judicial.
• Inventário extrajudicial: é o inventário realizado por meio de escritura pública.

Obs: a possibilidade de o inventário ser feito extrajudicialmente foi criada com a Lei nº 11.441/2007. Antes dessa Lei, o inventário só podia ser judicial.

Quais são as exigências para que o inventário seja feito extrajudicialmente?
Segundo a lição tradicional que se encontra nos manuais de Direito Civil, o inventário extrajudicial exigiria o cumprimento de quatro requisitos cumulativos:
1) herdeiros capazes: todos os herdeiros devem ser capazes; havendo interessado incapaz, deve ser feito o inventário judicial.
2) consenso: deve haver consenso entre os herdeiros quanto à divisão dos bens; todos devem ser concordes.
3) advogado: todas as partes interessadas devem estar assistidas por advogado ou por defensor público.
4) inexistência de testamento: o falecido não pode ter deixado testamento; pela lei, havendo testamento, deveria ser feito inventário judicial.

Esses quatro requisitos são extraídos do art. 610 do CPC/2015:
Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial.
§ 1º Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.
§ 2º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

Vale ressaltar, contudo, que essa quarta exigência (inexistência de testamento) sempre foi muito criticada pela doutrina.
Anderson Schreiber, um dos maiores civilistas da atualidade, afirma que a exigência relativa à ausência de testamento “não tem razão de ser. Pelo contrário, cria no Brasil um cenário insólito em que o testador que realiza testamento, pretendendo justamente evitar conflitos futuros entre seus herdeiros, acaba por lhes impor a via judicial, mesmo que não haja nenhum herdeiro incapaz e todos estejam de acordo quanto à divisão dos bens. Trata-se de verdadeiro contrassenso.” (Direito Civil contemporâneo. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020, p. 1432).

O STJ encampou essa crítica da doutrina? Cumpridos os demais requisitos legais, é possível realizar o inventário judicial mesmo que o falecido tenha deixado testamento? É possível afastar essa quarta exigência acima exposta?
SIM. A 4ª Turma do STJ decidiu que:
É possível o inventário extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado, desde que o testamento tenha sido previamente registrado judicialmente ou haja a expressa autorização do juízo competente.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.808.767-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2019 (Info 663).

O Min. Luis Felipe Salomão, relator do recurso especial, propôs uma nova forma de interpretar o art. 610 do CPC, de modo que, mesmo havendo testamento, seria possível o inventário extrajudicial.
Para ele, a partir de uma leitura sistemática do caput e do § 1º do art. 610 do CPC/2015 c/c os arts. 2.015 e 2.016 do CC/2002, mostra-se possível o inventário extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado, desde que o testamento tenha sido previamente registrado judicialmente ou haja a expressa autorização do juízo competente.
A mens legis que autorizou o inventário extrajudicial foi justamente a de desafogar o Judiciário, afastando a via judicial de processos nos quais não se necessita da chancela judicial, assegurando solução mais célere e efetiva em relação ao interesse das partes.
O processo deve ser um meio, e não um entrave, para a realização do direito. Se a via judicial é prescindível, não há razoabilidade em proibir, na ausência de conflito de interesses, que herdeiros, maiores e capazes, socorram-se da via administrativa para dar efetividade a um testamento já tido como válido pela Justiça.

Registrado judicialmente ou expressa autorização do juízo competente: o que é isso?
Todo testamento, para o seu cumprimento, deve, antes de qualquer outra providência, ser registrado em juízo em processo judicial específico chamado “ação judicial de cumprimento de testamento”, regulado pelos arts. 735 a 737 do CPC/2015.
Assim, mesmo que o falecido deixe testamento será possível realizar o inventário extrajudicial desde que estejam cumpridos os demais requisitos e desde que, antes do inventário, os herdeiros instaurem o processo judicial para abertura, registro e cumprimento de testamento.
“Nesse ato de abertura e registro de testamento, que é judicial, possíveis vícios formais serão apreciados e o testamento somente será executado se atender os requisitos formais. Assim, de um modo ou de outro, o inventário extrajudicial somente poderá ser iniciado após o registro do testamento e da ordem de cumprimento em processo judicial específico,” (FIGUEIREDO, Ivanildo. Inventário extrajudicial na sucessão testamentária: possibilidade, legalidade, alcance e eficácia. Revista Nacional de Direito de Família e Sucessões n. 8 - set./out./2015, pp. 97-98).

Enunciados doutrinários sobre o tema
Como já dito, a decisão do STJ acima exposta encontra eco na opinião da doutrina especializada que, por meio de enunciados, já defendeu essa mesma posição:
• Enunciado 600 da VII Jornada de Direito Civil do CJF: Após registrado judicialmente o testamento e sendo todos os interessados capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é possível que se faça o inventário extrajudicial.
• Enunciado 77 da I Jornada sobre Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios: Havendo registro ou expressa autorização do juízo sucessório competente, nos autos do procedimento de abertura e cumprimento de testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes, o inventário e partilha poderão ser feitos por escritura pública, mediante acordo dos interessados, como forma de pôr fim ao procedimento judicial.
• Enunciado 51 da I Jornada de Direito Processual Civil do CJF: Havendo registro judicial ou autorização expressa do juízo sucessório competente, nos autos do procedimento de abertura, registro e cumprimento de testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes, poderão ser feitos o inventário e a partilha por escritura pública.
• Enunciado 16 do IBDFAM: Mesmo quando houver testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é possível que se faça o inventário extrajudicial.

Cuidado com o que dizem alguns livros
Muitos livros explicam o tema de forma diferente e dizem que a ausência de testamento é um requisito. Não é mais a posição a ser adotada nas provas. Veja esta questão de prova que demonstra bem a mudança:
 (MP/PR 2014) A existência de testamento, mesmo que todos os herdeiros sejam maiores e capazes, impede a realização de inventário extrajudicial.


Na época da prova, o gabarito indicou a resposta como CORRETA. No entanto, atualmente, o gabarito deveria assinar como ERRADO.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

A competência para julgar estelionato que ocorre mediante depósito ou transferência bancária é do local da agência beneficiária do depósito ou transferência bancária (local onde se situa a agência que recebeu a vantagem indevida)



Imagine a seguinte situação hipotética:
João, morador de Brasília (DF) viu um anúncio na internet que oferecia empréstimo “rápido e fácil”.
Ele entrou em contato com a pessoa que se identificou como Henrique.
João combinou de receber um empréstimo de R$ 70 mil, no entanto, para isso, ele precisaria depositar uma parcela de R$ 1 mil a título de “custas” para a conta bancária de Henrique, vinculada a uma agência bancária localizada em São Paulo (SP).
João efetuou o depósito e, então, percebeu que se tratava de uma fraude porque nunca recebeu o dinheiro do suposto empréstimo.

Quem será competente para processar e julgar este crime de estelionato: o juízo da comarca de Brasília (onde foi feito o depósito) ou o juízo da comarca de São Paulo (local onde o dinheiro foi recebido)?
O juízo da comarca de São Paulo.
Na hipótese em que o estelionato se dá mediante vantagem indevida, auferida mediante o depósito em favor de conta bancária de terceiro, a competência deverá ser declarada em favor do juízo no qual se situa a conta favorecida.
No caso em que a vítima, induzida em erro, efetuou depósito em dinheiro e/ou transferência bancária para a conta de terceiro (estelionatário), a obtenção da vantagem ilícita ocorreu quando o estelionatário se apossou do dinheiro, ou seja, no momento em a quantia foi depositada em sua conta.
STJ. 3ª Seção. CC 167.025/RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 14/08/2019.
STJ. 3ª Seção. CC 169.053-DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 11/12/2019 (Info 663).

Nos termos do art. 70 do CPP, a competência será de regra determinada pelo lugar em que se consumou a infração e o estelionato, crime tipificado no art. 171 do CP, consuma-se no local e momento em que é auferida a vantagem ilícita.
O prejuízo alheio, apesar de fazer parte do tipo penal, está relacionado à consequência do crime de estelionato e não à conduta propriamente.
O núcleo do tipo penal é obter vantagem ilícita, razão pela qual a consumação se dá no momento em que os valores entram na esfera de disponibilidade do autor do crime, o que somente ocorre quando o dinheiro ingressa efetivamente em sua conta corrente.

• estelionato que ocorre por meio do saque (ou compensação) de cheque clonado, adulterado ou falsificado: a competência é do local onde a vítima possui a conta bancária.
Isso porque, nesta hipótese, o local da obtenção da vantagem ilícita é aquele em que se situa a agência bancária onde foi sacado o cheque adulterado, ou seja, onde a vítima possui conta bancária. Aplica-se o raciocínio da súmula 48 do STJ:
Súmula 48-STJ: Compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato cometido mediante falsificação de cheque.

• estelionato que ocorre quando a vítima, induzida em erro, se dispõe a fazer depósitos ou transferências bancárias para a conta de terceiro (estelionatário): a competência é do local onde o estelionatário possui a conta bancária.
Isso porque, neste caso, a obtenção da vantagem ilícita ocorre quando o estelionatário efetivamente se apossa do dinheiro, ou seja, no momento em que ele é depositado em sua conta.

Nesse sentido:
2. Deve prevalecer a orientação que estabelece diferenciação entre a hipótese em que o estelionato se dá mediante cheque adulterado ou falsificado (consumação no banco sacado, onde a vítima mantém a conta bancária), do caso no qual o crime ocorre mediante depósito ou transferência bancária (consumação na agência beneficiária do depósito ou transferência bancária).
3. Se o crime de estelionato só se consuma com a efetiva obtenção da vantagem indevida pelo agente ativo, é certo que só há falar em consumação, nas hipóteses de transferência e depósito, quando o valor efetivamente ingressa na conta bancária do beneficiário do crime.
4. No caso, considerando que a vantagem indevida foi auferida mediante o depósito em contas bancárias situadas em São Paulo/SP, a competência deverá ser declarada em favor daquele Juízo (suscitado). (...)
STJ. 3ª Seção. CC 169.053/DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 11/12/2019.

(...) nas hipóteses de estelionato no qual a vítima efetua pagamento ao autor do delito por meio de cheque, a competência para a apuração do delito é do Juízo do local da agência bancária da vítima, porque a consumação se dá quando o cheque é descontado pelo banco sacado. Já no caso de a vítima ter feito o pagamento mediante depósito bancário em dinheiro, como ocorreu no caso concreto, a jurisprudência firmada nessa Corte entende que o delito consuma-se no local onde verificada a obtenção da vantagem indevida, ou seja, no momento em que o valor entra na esfera de disponibilidade do autor do crime. (...)
STJ. 3ª Seção. CC 161.881/CE, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 13/03/2019.

Cuidado com o Jurisprudência em Teses
A tese 9 do Jurisprudência em Teses nº 84 do STJ afirma o seguinte:
9) O delito de estelionato é consumado no local em que se verifica o prejuízo à vítima.


Cuidado porque essa tese não pode ser tomada de forma absoluta e não se aplica, por exemplo, para a hipótese acima explicada. Assim, no caso de estelionato que ocorre quando a vítima, induzida em erro, se dispõe a fazer depósitos ou transferências bancárias para a conta de terceiro (estelionatário): a competência é do local onde o estelionatário possui a conta bancária.



domingo, 23 de fevereiro de 2020

INFORMATIVO Comentado 964 STF


Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 964 STF.

Confira abaixo o índice. Bons estudos.


ÍNDICE DO INFORMATIVO 964 DO STF

Direito Constitucional
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
É possível, em tese, o ajuizamento de ADI contra deliberação administrativa de tribunal, desde que ela tenha conteúdo normativo com generalidade e abstração, devendo, contudo, em regra, a ação ser julgada prejudicada caso essa decisão administrativa seja revogada.
Exige-se quórum de maioria absoluta dos membros do STF para modular os efeitos de decisão proferida em julgamento de recurso extraordinário no caso em que não tenha havido declaração de inconstitucionalidade.

ENTIDADES DESPORTIVAS
É inconstitucional previsão do Estatuto do Torcedor que condicionava a participação dos times em campeonatos à comprovação da regularidade fiscal e trabalhista.

DIREITO ADMINISTRATIVO
SERVIDORES PÚBLICOS
STF modulou os efeitos da decisão que afirmou que os servidores públicos federais não possuem direito aos quintos no período de 08/04/1998 a 04/09/2001; com isso, o Tribunal resguardou a situação daqueles que recebiam as verbas por força de decisão judicial ou administrativa.
É inconstitucional o pagamento de subsídio mensal e vitalício a ex-Vereadores, assim, como o pagamento de pensão por morte aos dependentes dos ex-ocupantes deste cargo

FUNDEF
União deverá indenizar Estados prejudicados com o cálculo incorreto do VMNA

DIREITO PROCESSUAL CIVIL
COMPETÊNCIA
Justiça comum deve julgar causa de servidor celetista que passou a ser regido pelo regime estatutário (pós CF/88).

REPERCUSSÃO GERAL
O STF reconheceu a repercussão geral na discussão sobre a inclusão dos expurgos inflacionários na correção monetária dos depósitos judiciais (Tema 1.016) e determinou a suspensão nacional de todos os processos que envolvam o tema.

DIREITO PENAL
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA
O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/90.

DIREITO PROCESSUAL PENAL
INQUÉRITO POLICIAL
Não há nulidade na ação penal instaurada a partir de elementos informativos colhidos em inquérito policial que não deveria ter sido conduzido pela Polícia Federal considerando que a situação não se enquadrava no art. 1º da Lei 10.446/2002.

PROVAS
Não viola a SV 14 quando se nega que o investigado tenha acesso a peças que digam respeito a dados sigilosos de terceiros e que não estejam relacionados com o seu direito de defesa.
É constitucional lei estadual que transforma o cargo de datiloscopista da Polícia Civil em perito papiloscopista.

NULIDADES
Não viola a SV 11 a decisão que mantém as algemas durante julgamento no júri de réu que integra milícia, possui extensa folha de antecedentes criminais e foi transferido para presídio federal de segurança máxima em virtude da sua alta periculosidade.

HABEAS CORPUS
Não cabe HC contra decisão de Ministro do STF que decreta a prisão preventiva de investigado ou réu
A concessão do benefício da transação penal impede a impetração de habeas corpus em que se busca o trancamento da ação penal?

EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA
Se o Tribunal de 2ª instância não analisou a necessidade da prisão preventiva em razão de ter aplicado o antigo entendimento do STF sobre a execução provisória, antes de ser decretada a liberdade, deve o Tribunal fazer essa análise.
Se o Tribunal de 2ª instância determinou a execução provisória da pena, mas o juiz já havia negado o direito do condenado de recorrer em liberdade, não cabe a soltura do réu com base no novo entendimento do STF de que é proibida a execução provisória da pena.
Não se conhece de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de Ministro do STJ que nega liminar mantendo decisão do TJ que determinou a execução provisória da pena em caso de condenação pelo Tribunal do Júri.

DIREITO TRIBUTÁRIO
IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
A lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF/88.

DIREITO DO TRABALHO / PROCESSO DO TRABALHO
COMPETÊNCIA
Justiça comum deve julgar causa de servidor celetista que passou a ser regido pelo regime estatutário (pós CF/88).











INFORMATIVO Comentado 964 STF - Versão Resumida


Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 964 STF - Versão Resumida.

Bons estudos.