Dizer o Direito

domingo, 17 de agosto de 2025

A responsabilidade do arrematante pelos tributos sobre imóvel adquirido em hasta pública não depende da data de imissão na posse

Imagine a seguinte situação hipotética:

No dia 15 de março de 2020, João arrematou um imóvel em um leilão judicial. Ele (arrematante) assinou o auto de arrematação junto com o juiz e o leiloeiro.

Ocorre que, logo após a arrematação, o antigo proprietário do imóvel apresentou embargos à arrematação, questionando a validade do procedimento. Essa discussão judicial se estendeu por três anos.

Durante esse período, João não conseguiu tomar posse do imóvel nem utilizá-lo de forma alguma, permanecendo o bem ocupado pelo antigo proprietário enquanto os embargos tramitavam na Justiça.

Somente em abril de 2023, após o julgamento definitivo dos embargos, foi expedida a carta de arrematação e João finalmente conseguiu registrar o imóvel em seu nome no cartório de registro de imóveis.

Durante esses três anos de litígio (2020, 2021 e 2022), o Município lançou cobranças de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e TLP (Taxa de Limpeza Pública) em nome de João, considerando-o responsável pelo pagamento do tributo desde a data da arrematação em março de 2020.

Inconformado, João ingressou com ação questionando essa cobrança, sob o argumento de que somente deveria ser responsável pelos tributos a partir da expedição da carta de arrematação em abril de 2023, momento em que efetivamente se tornou proprietário e passou a usufruir do bem.

 

O STJ concordou com os argumentos de João?

NÃO.

Quando um indivíduo arremata um imóvel em leilão judicial (hasta pública), ele passa a ser considerado proprietário do bem a partir do momento em que o auto de arrematação é assinado pelo juiz, pelo leiloeiro e pelo próprio arrematante, e não apenas quando ele passa a ter a posse efetiva do imóvel ou quando é expedida e registrada a carta de arrematação.

Logo, o arrematante é responsável pelo pagamento do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e da TLP (Taxa de Limpeza Pública) a partir da data da arrematação, mesmo que ele ainda não tenha sido imitido na posse do imóvel.

O art. 130 do CTN prevê que, nos casos de arrematação, os débitos anteriores à arrematação ficam sub-rogados no preço do bem, ou seja, são descontados do valor pago no leilão:

Art. 130. Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, subrogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação.

Parágrafo único. No caso de arrematação em hasta pública, a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço.

 

No entanto, os tributos gerados após a arrematação são de responsabilidade do novo proprietário (o arrematante).

A responsabilidade tributária nesse caso decorre do fato de o arrematante já ser considerado proprietário desde a assinatura do auto de arrematação, e não apenas após o registro da carta de arrematação no cartório de imóveis.

O registro é necessário para que terceiros reconheçam oficialmente a nova titularidade, mas entre o arrematante e o Poder Público (para fins tributários), a propriedade já se configura com a arrematação.

Eventuais entraves judiciais, como embargos à arrematação propostos pelo antigo proprietário, não impedem a incidência do IPTU ao arrematante, pois tais discussões não alteram o fato de que ele passou a ser o titular do imóvel para fins de incidência do tributo a partir da arrematação. Além disso, segundo o art. 34 do CTN, o contribuinte do IPTU é o proprietário do bem, e não se exige que ele tenha a posse ou esteja usando o imóvel:

Art. 34. Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título.

 

Vale ressaltar, por fim, que a arrematação judicial é considerada perfeita e acabada com a assinatura do auto. A expedição da carta de arrematação ou o registro no cartório apenas formalizam e completam os efeitos dessa expropriação para fins de publicidade frente a terceiros. Portanto, o arrematante não pode se eximir da responsabilidade pelos tributos gerados após a arrematação sob a alegação de que ainda não obteve a posse do imóvel.

 

Em suma:

A partir da expedição do auto de arrematação, assinado pelo juiz, leiloeiro e arrematante, este torna-se responsável pelo pagamento dos tributos do imóvel, ainda que postergada a respectiva imissão na posse. 

STJ. 1ª Turma. AgInt no AREsp 2.689.401-PE, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 24/2/2025 (Info 25 - Edição Extraordinária).


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