sábado, 18 de abril de 2015

Registradores civis passam a ter o dever de comunicar à Receita Federal e à Secretaria de Segurança a relação dos óbitos ocorridos (Lei 13.114/2015)



Olá amigos do Dizer o Direito,

Foi publicada ontem mais uma novidade legislativa.

Trata-se da Lei n.° 13.114/2015, que altera a Lei de Registros Públicos (Lei n.° 6.015/73) para acrescentar mais um dever aos registradores civis.

Comunicar óbitos à Receita Federal e Secretaria de Segurança
A Lei n.° 13.114/2015 determinou que os titulares de Registros Civis de Pessoas Naturais (na linguagem popular: “os donos de cartório” de registro civil), quando lavrarem a certidão de óbito de uma pessoa, em regra, deverão comunicar essa morte à Receita Federal do Brasil e à Secretaria de Segurança do Estado no qual ela tinha a carteira de identidade.

Exceção: não haverá a comunicação se, em razão da idade do falecido, essa informação for manifestamente desnecessária.

Assim, o art. 80 da Lei n.° 6.015/73 (que trata sobre certidão de óbito) passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único:

Art. 80 (...)
Parágrafo único. O oficial de registro civil comunicará o óbito à Receita Federal e à Secretaria de Segurança Pública da unidade da Federação que tenha emitido a cédula de identidade, exceto se, em razão da idade do falecido, essa informação for manifestamente desnecessária.

Qual é o motivo de haver essa comunicação?
Na prática, é comum constatarmos que criminosos utilizam documentos (RG, CPF) de pessoas que já morreram para abrir empresas, efetuar crediários, contrair empréstimos e praticar uma série de outros delitos.
A Lei n.° 13.114/2015 busca, portanto, evitar esse fato determinando que o Oficial do Registro Civil, após lavrar a certidão de óbito da pessoa que morreu, já comunique esse falecimento à Receita e à Secretaria de Segurança. Com isso, tais órgãos poderão alimentar seus sistemas com a informação de que o titular daquele número de CPF ou RG morreu.
Assim, quando o estelionatário tentar abrir uma empresa com aquele CPF, não conseguirá, já que haverá uma informação de que aquele CPF está inativo.
De igual modo, se um bandido for preso e tentar utilizar o número de RG de uma pessoa que já morreu (substituindo apenas a foto), esse fato poderá, em tese, ser descoberto pelo Delegado de Polícia, desde que, obviamente, a Secretaria de Segurança daquele Estado possua um banco de dados informatizado com os dados sobre o RG dos indivíduos.

Falhas da lei
Infelizmente, a Lei n.° 13.114/2015, apesar de conter praticamente um único dispositivo, apresenta três falhas: a) ausência de prazo para o registrador fazer a comunicação; b) ausência de sanção para seu descumprimento; c) previsão de uma exceção que não tem justificativa de existir. Vejamos:

a) Ausência de prazo
O parágrafo único do art. 80 da LRP, acrescentado pela Lei n.° 13.114/2015, não prevê prazo para que o Registrador Civil comunique o óbito à Receita Federal e à Secretaria de Segurança Pública.
O legislador não estabeleceu, portanto, um marco a partir do qual o Oficial do Registro estaria em atraso.
Diante dessa lacuna, restam ao intérprete três opções possíveis:
1ª) Entender que não existe, por enquanto, prazo, e aguardar para que os Tribunais de Justiça editem provimentos fixando esse prazo enquanto órgão regulador dos serviços registrais;
2ª) Aplicar o prazo de 5 dias do art. 106 da LRP, por analogia;
3ª) Aplicar o prazo do art. 68 da Lei n.° 8.212/91, por analogia (até o 10º dia do mês seguinte).

b) Ausência de sanção para seu descumprimento
A segunda falha do parágrafo único do art. 80 da LRP, acrescentado pela Lei n.° 13.114/2015, foi a de não prever qualquer sanção para o Registrador Civil que deixar de comunicar o óbito à Receita Federal e à Secretaria de Segurança Pública.
Vale ressaltar, no entanto, que mesmo diante da ausência de sanção específica, o Registrador poderá ser punido disciplinarmente pela Corregedoria do Tribunal de Justiça considerando que a inobservância das prescrições legais constitui-se em infração disciplinar (art. 31, I, da Lei n.° 8.935/94).

c) Exceção injustificada
A terceira falha do parágrafo único do art. 80 da LRP, acrescentado pela Lei n.° 13.114/2015, foi a de prever uma exceção na qual o Registrador fica dispensado de comunicar o óbito. Confira:
Art. 80 (...) Parágrafo único. O oficial de registro civil comunicará o óbito à Receita Federal e à Secretaria de Segurança Pública da unidade da Federação que tenha emitido a cédula de identidade, exceto se, em razão da idade do falecido, essa informação for manifestamente desnecessária.

O legislador entendeu que a idade do falecido poderia influenciar na relevância de se comunicar ou não o óbito aos órgãos competentes. Essa, contudo, é uma conclusão precipitada e temerária.
Apesar de ser mais raro que criminosos utilizem documentos de crianças ou idosos para se aplicar golpes, não se pode descartar, de forma absoluta, sua ocorrência. Além disso, o legislador transfere para a subjetividade do Registrador decidir se ele acha que é necessário ou não informar o falecimento em razão da idade do falecido.
Dessa forma, o ideal seria que o legislador tivesse fixado o dever para todo e qualquer caso de falecimento, independentemente da idade.

Vigência
A Lei n.° 13.114/2015 não possui prazo de vacatio legis, de forma que o parágrafo único do art. 80 da LRP já se encontra em vigor.

Previsões semelhantes
Apesar de a Lei n.° 13.114/2015 ter a sua importância, vale ressaltar que já existiam outros dispositivos legais prevendo o dever de os registradores civis comunicarem os óbitos para outros órgãos públicos. Confira:

Código Eleitoral
Determina que os Oficiais de Registro Civil devem enviar, até o dia 15 de cada mês, ao juiz eleitoral da zona em que oficiarem, comunicação dos óbitos de cidadãos alistáveis, ocorridos no mês anterior, para cancelamento das inscrições (art. 71, § 3º).
Desse modo, essa comunicação tem por objetivo fazer com que o título de eleitor do cidadão morto seja cancelado.
Em caso de descumprimento, o Oficial de Registro poderá responder pelas penas do art. 293 do Código Eleitoral.

Lei 8.212/91
Determina que o Titular do Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais fica obrigado a comunicar, ao INSS, até o dia 10 de cada mês, o registro dos óbitos ocorridos no mês imediatamente anterior, devendo da relação constar a filiação, a data e o local de nascimento da pessoa falecida (art. 68).
Essa comunicação ao INSS tem por objetivo fazer com que a autarquia cancele os eventuais benefícios previdenciários que a pessoa falecida receba, evitando que continue pagando, por exemplo, aposentadoria para o morto.
Como os sistemas sobre registro de óbito do INSS e da Receita Federal são interligados, na prática, a Receita, mesmo antes da Lei n.° 13.114/2015, já recebia, indiretamente, as comunicações dos Oficiais de Registro Civil sobre pessoas mortas.
A falta de comunicação na época própria, bem como o envio de informações inexatas, sujeitará o Titular do Cartório à multa.

Márcio André Lopes Cavalcante
Professor



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