quarta-feira, 18 de novembro de 2015

O fato de a empresa contratante pertencer ao irmão do preso impede que ele tenha direito ao trabalho externo?



Trabalho externo
O preso que está cumprindo pena pode trabalhar. Esse trabalho pode ser:

a) interno (intramuros): é aquele que ocorre dentro da própria unidade prisional. O trabalho interno é executado pelos presos condenados que cumprem pena nos regimes fechado e semiaberto.

b) externo (extramuros): é aquele realizado pelo detento fora da unidade prisional. O reeducando é autorizado a sair para trabalhar, retornando ao final do expediente. As regras sobre o trabalho externo variam de acordo com o regime prisional. Vejamos:

Fechado
Semiaberto
Aberto
O preso poderá realizar trabalho externo somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina (art. 36).
O limite máximo do número de presos será de 10% do total de empregados na obra (§ 1º).
Caberá ao órgão da administração, à entidade ou à empresa empreiteira a remuneração do trabalho (§ 2º).
A prestação de trabalho à entidade privada depende do consentimento expresso do preso (§ 3º).
É admitido o trabalho externo, bem como a frequência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de ensino médio ou superior.

Ao contrário do regime fechado, o preso em regime semiaberto pode trabalhar não apenas em obras públicas, mas também em empresas privadas e até mesmo como trabalhador autônomo.

O trabalho é sempre externo.

Durante o dia, o condenado trabalha, frequenta cursos ou realiza outras atividades autorizadas, fora do estabelecimento e sem vigilância.

A pessoa pode trabalhar em obras públicas, em empresas ou como trabalhador autônomo.

Durante o período noturno e nos dias de folga, permanece recolhido na Casa do Albergado.

Três principais vantagens do trabalho para o preso:
1) O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena (art. 126 da LEP). Assim, para cada 3 dias de trabalho, o preso tem direito de abater 1 dia de pena.
2) Um dos requisitos para que o preso obtenha a progressão do regime semiaberto para o aberto é a de que ele esteja trabalhando ou comprove a possibilidade de trabalhar imediatamente quando for para o regime aberto (inciso I do art. 114 da LEP);
3) É reinserido ao mercado de trabalho, recebe salários por isso e, se o trabalho for externo, ainda poderá passar um tempo fora do estabelecimento prisional.

Feitos os devidos esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética:
João, que cumpria pena em regime fechado, teve direito à progressão, passando ao regime semiaberto.
O reeducando requereu, então, ao juízo da execução penal o direito de, todos os dias úteis, sair para trabalhar, retornando ao final do expediente (trabalho externo).
Para fazer esse requerimento, o preso deverá comprovar que recebeu possui uma proposta de trabalho.
A fim de cumprir essa exigência, João apresentou uma proposta de trabalho da empresa "XXX" que declarava que iria contratá-lo.
Ocorre que o Ministério Público opôs ao deferimento do pedido sob o argumento de que a empresa "XXX" pertence ao irmão de João. Logo, na visão do MP, não haveria nenhuma garantia de que o preso iria realmente trabalhar no local, podendo ele ser acobertado em suas faltas em razão do parentesco.

A tese do MP foi aceita? O simples fato de a empresa contratante pertencer ao irmão do preso impede que ele tenha direito ao trabalho externo?
NÃO. O fato de o irmão do apenado ser um dos sócios da empresa empregadora não constitui óbice à concessão do benefício do trabalho externo, ainda que se argumente sobre o risco de ineficácia da realização do trabalho externo devido à fragilidade na fiscalização.
STJ. 5ª Turma. HC 310.515-RS, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 17/9/2015 (Info 569).

A execução penal tem como objetivo principal propiciar o retorno do condenado ao convívio em sociedade, com o escopo de reeducá-lo e ressocializá-lo, sendo que o trabalho é essencial para esse processo. Nesse contexto, é importante considerar que os riscos de ineficácia da realização de trabalho externo em empresa familiar, sob o argumento de fragilidade na fiscalização, não podem ser óbice à concessão do referido benefício.

Em primeiro lugar, porque é muito difícil para o apenado conseguir emprego. Impedir que o preso seja contratado por parente é medida que reduz ainda mais a possibilidade de vir a conseguir uma ocupação lícita e, em consequência, sua perspectiva de reinserção na sociedade.

Em segundo lugar, porque o Estado deve envidar todos os esforços possíveis no sentido de ressocializar os condenados, a fim de evitar que voltem a praticar crimes.

Além disso, deve-se esclarecer que o Estado possui o dever de fiscalizar o efetivo cumprimento do trabalho extramuros (trabalho externo), estando autorizado a revogar o benefício nas hipóteses elencadas no parágrafo único do art. 37 da LEP. Logo, se ficar demonstrado que está havendo um favorecimento irregular do preso, o juiz poderá revogar a autorização.

Por fim,  importante relembrar que não há qualquer vedação na LEP quanto à concessão de trabalho externo em empresa da família do sentenciado, de sorte que se estaria proibindo um benefício sem amparo legal.



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