sábado, 17 de janeiro de 2015

Competência para julgar conduta de militar que dispara tiros contra civil



Olá amigos do Dizer o Direito,

Vamos aproveitar o sábado para reforçar a preparação para o concurso da DPU que se aproxima.

O tema abaixo é bastante interessante e pode ser cobrado na sua prova.

Bons estudos.

Se um militar, no exercício de sua função, pratica lesão corporal contra vítima civil, qual será o juízo competente?
JUSTIÇA MILITAR, considerando que se trata de crime militar (art. 9º, II, c, do CPM):
Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:
II - os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados:
c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil;

Se um militar, no exercício de sua função, pratica tentativa de homicídio (ou qualquer outro crime doloso contra a vida) contra vítima civil, qual será o juízo competente?
JUSTIÇA COMUM ESTADUAL, por força do parágrafo único do art. 9º do CPM:
Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:
Parágrafo único.  Os crimes de que trata este artigo quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão da competência da justiça comum, salvo quando praticados no contexto de ação militar realizada na forma do art. 303 da Lei n.° 7.565, de 19 de dezembro de 1986 - Código Brasileiro de Aeronáutica.


Atenção para a alteração promovida no parágrafo único do art. 9º:

Redação anterior à Lei n.° 12.432/2011
Redação atual
(dada pela Lei n.° 12.432/2011)
Parágrafo único. Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil, serão da competência da justiça comum.
Parágrafo único. Os crimes de que trata este artigo quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão da competência da justiça comum, salvo quando praticados no contexto de ação militar realizada na forma do art. 303 da Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986 - Código Brasileiro de Aeronáutica.


Assim, se um militar, no exercício de sua função, pratica tentativa de homicídio ou homicídio consumado contra vítima civil em ação militar relacionada à abordagem e eventual abate de aeronave (“Lei do Abate”), qual será o juízo competente?
JUSTIÇA MILITAR (trata-se de exceção à regra do parágrafo único do art. 9º do CPM).

Resumindo:

SITUAÇÃO
JUÍZO COMPETENTE
Militar, no exercício de sua função, pratica lesão corporal contra vítima civil.
Justiça Militar
Militar, no exercício de sua função, pratica tentativa de homicídio contra vítima civil.
Justiça Comum Estadual
(salvo se foi praticado em abate de aeronave – art. 303, CBA)
Militar, no exercício de sua função, pratica tentativa de homicídio ou homicídio contra vítima civil ao abater aeronave hostil.
Justiça Militar

Feitos os devidos esclarecimentos, imagine a seguinte situação adaptada:
Pedro (civil) estava dirigindo seu veículo e, na sua frente, havia uma blitz policial.
João (Sargento PM) fez sinal com a mão para que Pedro parasse o veículo, no entanto, este não obedeceu a ordem e seguiu em frente.
Diante disso, o militar efetuou um disparo contra o carro de Pedro que, assustado, parou o automóvel.
Pedro não foi atingido.
O Juiz de Direito da Auditoria Militar entendeu que houve tentativa de homicídio e, por isso, determinou a remessa dos autos à vara criminal comum.
O juiz da vara criminal, por sua vez, sustentou que não havia indícios do animus necandi (intenção de matar), razão pela qual, não havendo crime doloso contra a vida, a competência para julgar o fato seria da Justiça Militar.

O caso chegou até o STJ. Onde esse fato deverá ser julgado?
Justiça Comum.

Segundo decidiu o STJ, havendo dúvida sobre a existência do elemento subjetivo do crime de homicídio, o processo deverá tramitar na Justiça Comum (e não na Justiça Militar).
Os crimes dolosos contra a vida cometidos por militar contra civil, mesmo que no desempenho de suas atividades, serão da competência da Justiça Comum (Tribunal do Júri), nos termos do art. 9º, parágrafo único, do CPM.
Para se eliminar a eventual dúvida quanto ao elemento subjetivo da conduta, de modo a afirmar se o agente militar agiu com dolo ou culpa, é necessário o exame aprofundado de todo o conjunto probatório, a ser coletado durante a instrução criminal, observados o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.
Dessa forma, o feito deve tramitar na Justiça Comum, pois, nessa situação, prevalece o princípio do in dubio pro societate, o que leva o julgamento para o Tribunal do Júri, caso seja admitida a acusação em eventual sentença de pronúncia.

RESUMINDO:
Os crimes dolosos contra a vida cometidos por militar contra civil, mesmo que no desempenho de suas atividades, serão da competência da Justiça comum (Tribunal do Júri), nos termos do art. 9º, parágrafo único, do Código Penal Militar.
Se um militar desferiu um tiro contra um civil, mas há dúvidas a respeito de sua intenção (não se sabe ainda se queria matar, lesionar, assustar etc.), esse fato deverá ser apurado na Justiça comum (e não na Justiça Militar).
Somente com a análise aprofundada de todo o conjunto probatório a ser produzido durante a instrução criminal será possível identificar, categoricamente, a intenção do militar ao efetuar o disparo de arma de fogo no carro da vítima. Assim, havendo fundada dúvida quanto ao elemento subjetivo, o feito deve tramitar na Justiça Comum, por força do princípio in dubio pro societate.
STJ. 3ª Seção. CC 129.497-MG, Rel. Min. Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP), julgado em 8/10/2014 (Info 550).



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