quarta-feira, 18 de julho de 2012

O que são “juros no pé”? Eles são considerados lícitos pelo ordenamento jurídico brasileiro?



Os “juros no pé” são juros de caráter compensatório cobrados, do promitente comprador, pela incorporadora imobiliária (promitente vendedora), antes da entrega das chaves do imóvel em construção. 

Imaginemos a seguinte situação hipotética:

Lucas deseja comprar um apartamento e procura uma incorporadora imobiliária.

Lucas celebra então um contrato de promessa de compra e venda com a incorporadora para aquisição de um apartamento que será entregue em julho/2016.

Lucas compromete-se a pagar todos os meses uma determinada quantia e a incorporadora obriga-se a entregar o apartamento nesta data futura e certa.

O contrato firmado prevê que, a partir da assinatura do pacto, ou seja, mesmo antes da entrega do imóvel, a incorporadora poderá cobrar de Lucas, nas parcelas, além do valor principal, correção monetária pelo INCC mais juros compensatórios de 1% ao mês.

Esses juros compensatórios cobrados antes da entrega do imóvel é que são chamados de “juros no pé”. A expressão foi utilizada pelo STJ, mas já era empregada na prática do mercado imobiliário e tem a ver com o fato de que o imóvel (normalmente apartamentos) ainda não foi construído, ou seja, são cobrados juros mesmo o imóvel ainda estando "no pé" (na planta, no chão).

A cláusula contratual que impõe a cobrança de juros, durante o período de construção do imóvel prometido à venda, é abusiva em virtude de impor ao consumidor desvantagem exagerada? Em outras palavras, os “juros no pé” são abusivos?
R: NÃO.

A Segunda Seção (3ª e 4ª Turmas) do STJ decidiu, no último dia 13/06, que NÃO É ABUSIVA a cláusula de cobrança de juros compensatórios incidentes em período anterior à entrega das chaves nos contratos de compromisso de compra e venda de imóveis em construção sob o regime de incorporação imobiliária (Segunda Seção. EREsp 670.117-PB, Rel. originário Min. Sidnei Beneti, Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, julgados em 13/6/2012).

Desse modo, os juros no pé são admitidos pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Segundo o Min. Antonio Carlos Ferreira, relator do processo no STJ, a rigor, o pagamento pela compra de um imóvel em fase de produção deveria ser feito à vista. Assim, em nosso exemplo, “Lucas” deveria ter pago o apartamento à vista.

Apesar disso, para ajudar financeiramente o comprador, o incorporador pode estipular o adimplemento da obrigação mediante o parcelamento do preço, inclusive, a prazos que vão além do tempo previsto para o término da obra.

Em tal situação, é legítimo que o incorporador cobre juros compensatórios, pois ele, além de assumir os riscos do empreendimento, antecipa os recursos para que o prédio seja construído.

Desse modo, o Ministro Relator concluiu que seria injusto que o comprador pagasse, na compra parcelada, o mesmo valor que pagaria se tivesse feito a compra à vista.

Para a segurança do consumidor, em observância ao direito de informação (art. 6º, II, do CDC), é conveniente a previsão expressa dos juros compensatórios sobre todo o valor parcelado na aquisição do bem, permitindo, dessa forma, o controle pelo Judiciário.

Com base nesse entendimento, a Segunda Seção do STJ reconheceu que é legítima a cláusula contratual que preveja a cobrança dos juros compensatórios de 1% ao mês a partir da assinatura do contrato.

Vale ressaltar que, antes dessa decisão da Segunda Seção do STJ, havia certa divergência sobre este tema na Corte e prevalecia a posição de que os “juros no pé” seriam abusivos. Nesse sentido podemos mencionar os seguintes julgados: AgRg no Ag 1402399/RJ, julgado em 21/06/2011, DJe 28/06/2011; REsp 670.117/PB, julgado em 14/09/2010, DJe 23/09/2010.

Esta decisão da Segunda Seção representa, portanto, uma mudança na jurisprudência do STJ.

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