segunda-feira, 27 de abril de 2020

Lei 13.994/2020: altera a Lei dos Juizados Especiais para possibilitar a conciliação não presencial no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis



Olá, amigos do Dizer o Direito,

Foi publicada hoje mais uma novidade legislativa.

A Lei nº 13.994/2020 altera a Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95), para possibilitar a conciliação não presencial no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis.

Vamos entender um pouco mais sobre o tema.

Lei nº 9.099/95
A Lei nº 9.099/95 dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais.
Segundo o art. 2º da Lei, o processo nos Juizados deve se orientar pelos seguintes critérios:
• oralidade
• simplicidade
• informalidade
• economia processual e
• celeridade.

Além disso, a Lei afirma que se deve, sempre que possível, buscar a conciliação ou a transação.

Conciliação
Desse modo, a tentativa de conciliação é uma fase obrigatória no procedimento dos Juizados Especiais, prevista no art. 21 da Lei nº 9.099/95.

Quais são as etapas até se chegar a essa fase de conciliação?
1) Instauração
O processo é instaurado com a apresentação do pedido.
A petição inicial pode ser apresentada na Secretaria do Juizado:
• de forma escrita (a parte ou seu advogado leva o pedido escrito); ou
• de forma oral (a parte narra os fatos e seu pedido. Esse pedido oral será reduzido a escrito pela Secretaria do Juizado, podendo ser utilizado o sistema de fichas ou formulários impressos).

2) Requisitos da petição inicial
Do pedido constarão, de forma simples e em linguagem acessível:
I - o nome, a qualificação e o endereço das partes;
II - os fatos e os fundamentos, de forma sucinta;
III - o objeto e seu valor.

3) Registro do pedido e designação da conciliação
O pedido do autor é registrado e a Secretaria do Juizado, independentemente de distribuição e autuação, já designa uma sessão (audiência) de conciliação, que deverá ser realizada no prazo de 15 dias.
Obs: é raro acontecer na prática, no entanto, se o autor do pedido for no Juizado já acompanhado da parte requerida, a Secretaria do Juizado pode instaurar imediatamente a sessão de conciliação, sem precisar fazer registro prévio do pedido e citação. Havendo pedidos contrapostos, poderá ser dispensada a contestação formal e ambos serão apreciados na mesma sentença. Essa realidade, como eu disse, é incomum, mas pode eventualmente acontecer em comarcas do interior.

Juiz togado, juiz leigo e conciliador
No sistema dos Juizados Especiais existem três personagens que podem atuar nas audiências:

JUIZ TOGADO
JUIZ LEIGO
CONCILIADOR
É o membro do Poder Judiciário aprovado no concurso para Juiz de Direito ou Juiz Federal.
É um auxiliar da justiça, ou seja, alguém que poderá realizar algumas atividades que seriam feitas pelo juiz togado.
Deve ser um advogado com mais de cinco anos de experiência.
Os Juízes leigos ficarão impedidos de exercer a advocacia perante os Juizados Especiais, enquanto no desempenho de suas funções.
É um auxiliar da justiça, que atuará na audiência de conciliação.
Deve ser, preferencialmente, um bacharel em Direito.
Competências:
• audiência de conciliação;
• audiência de instrução;
• homologação de acordos;
• homologação de decisões proferidas por juízes leigos;
• prolação de sentenças.
Competências:
• pode conduzir as audiências de conciliação;
• pode dirigir audiências de instrução e julgamento, sob a supervisão do juiz togado;
• o juiz leigo que tiver dirigido a instrução proferirá sua decisão e imediatamente a submeterá ao juiz togado, que poderá homologá-la, proferir outra em substituição ou, antes de se manifestar, determinar a realização de atos probatórios indispensáveis.
Competência:
Pode conduzir a audiência de conciliação.

Sessão de conciliação
No dia marcado para a audiência de conciliação, após ser aberta a sessão, as partes serão avisadas sobre as vantagens de se fazer a conciliação, além dos os riscos e das consequências de se prosseguir o litígio.
Em seguida, será iniciada a tentativa de conciliação.
Essa audiência de conciliação pode ser conduzida pelo Juiz togado, pelo Juiz leigo ou pelo conciliador.

Enunciado 6-FONAJE: Não é necessária a presença do juiz togado ou leigo na Sessão de Conciliação, nem a do juiz togado na audiência de instrução conduzida por juiz leigo.

Obtida a conciliação, esta será reduzida a escrito e homologada pelo Juiz togado mediante sentença com eficácia de título executivo.

A conciliação pode ser feita de forma não presencial?
SIM. A Lei nº 13.994/2020 incluiu um parágrafo ao art. 22 da Lei nº 9.099/95 prevendo expressamente essa possibilidade. Veja:
Art. 22 (...)
§ 2º É cabível a conciliação não presencial conduzida pelo Juizado mediante o emprego dos recursos tecnológicos disponíveis de transmissão de sons e imagens em tempo real, devendo o resultado da tentativa de conciliação ser reduzido a escrito com os anexos pertinentes. (Incluído pela Lei nº 13.994/2020).

Assim, é possível que a audiência de conciliação seja feita por meio de chamadas de vídeo ou por aplicativos que transmitem sons e imagens, como o WhasApp, o Skype, o Zoom, o Google Hangouts, entre outros.

Se o demandado não comparecer ou recusar-se a participar da tentativa de conciliação não presencial, o Juiz togado proferirá sentença (art. 23 da Lei nº 9.099/95).

O dispositivo acima foi inserido na Lei nº 9.099/95, que rege os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Estadual. Ocorre que existem também os Juizados Especiais Federais e os Juizados da Fazenda Pública. Diante disso, indaga-se: essa regra vale também para os procedimentos regidos por esses outros Juizados?
SIM. Deixa eu explicar com calma.
Quando falamos em “sistema dos Juizados Especiais”, podemos identificar a existência de três microssistemas, cada um deles destinado a julgar determinados tipos de causas, possuindo regras específicas de procedimento. Veja:
1) Juizados Especiais Cíveis e Criminais estaduais
Compete ao Juizado Especial Criminal processar e julgar infrações penais de menor potencial ofensivo que sejam de competência da Justiça Estadual.
Compete ao Juizado Especial Cível processar e julgar causas cíveis de menor complexidade que sejam de competência da Justiça Estadual.
Ficam excluídas deste microssistema as causas cíveis de interesse da Fazenda Pública.
Lei nº 9.099/95
2) Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal.
Compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar as infrações de menor potencial ofensivo que sejam de competência da Justiça Federal.
Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de 60 salários mínimos, bem como executar as suas sentenças.
Neste microssistema, é permitida a participação da União, autarquias, fundações e empresas públicas federais, desde que na condição de rés.

Lei nº 10.259/2001
3) Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados,
do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios.
Compete ao Juizado Especial da Fazenda Pública processar e julgar as causas cíveis de interesse dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 salários mínimos.
Neste microssistema, são julgadas as causas de até 60 salários mínimos, de competência da Justiça Estadual, e que tenham como réus os Estados, o Distrito Federal, os Territórios e os Municípios, bem como autarquias, fundações e empresas públicas a eles vinculadas.

Lei nº 12.153/2009

Desse modo, cada um dos três “Juizados” possui uma lei própria. No entanto, é importante ressaltar que o legislador optou por eleger a Lei nº 9.099/95 como uma espécie de lei geral dos Juizados e tratou na Lei nº 10.259/2001 e na Lei nº 12.153/2009 somente sobre aquilo que ele queria que fosse diferente.
Assim, para os Juizados Especiais Federais e para os Juizados Especiais da Fazenda Pública devem ser aplicadas todas as regras da Lei nº 9.099/95, salvo aquilo que for tratado de forma diferente nas leis específicas.
Confira o que eu disse na Lei:
Lei nº 10.259/2001
Art. 1º São instituídos os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta Lei, o disposto na Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.

Lei nº 12.153/2009
Art. 27. Aplica-se subsidiariamente o disposto nas Leis nºs 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, 9.099, de 26 de setembro de 1995, e 10.259, de 12 de julho de 2001.

A permissão para que a conciliação seja feita de forma não presencial não conflita com as disposições das Leis nº 10.259/2001 e 12.153/2009, de modo que o novo § 2º do art. 22 da Lei nº 9.099/95 deve ser aplicado também para os Juizados Especiais Federais e para os Juizados Especiais da Fazenda Pública.

Autoria do projeto
Deve ser feita uma última observação.
O projeto que deu origem a essa Lei foi de autoria do então Deputado Federal Luiz Flávio Gomes, recentemente falecido.
Fica a homenagem a este grande Professor e Jurista.

É possível que a audiência de instrução seja feita de forma não presencial?

A Lei não trata sobre o tema. No entanto, neste período de pandemia algumas audiências têm sido realizadas por videoconferência. Particularmente, em princípio, não vejo nulidade, especialmente em se tratando de Juizados Especiais.



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