sexta-feira, 2 de outubro de 2020

É possível o reconhecimento, para fins previdenciários, do trabalho rural exercido antes dos 12 anos de idade?

 

Crianças e adolescentes podem trabalhar?

O art. 7º, XXXIIII, da CF/88 prevê que:

• criança não pode trabalhar;

• adolescente pode trabalhar a partir de 14 anos, na condição de aprendiz;

• a partir de 16 anos, o adolescente pode trabalhar normalmente (mesmo sem ser aprendiz), salvo se for um trabalho noturno, perigoso ou insalubre;

• trabalho noturno, perigoso ou insalubre só pode ser realizado por maiores de 18 anos.

 

Trabalho infantil em atividades rurais familiares

Em diversos Municípios do interior do país era muito comum que as crianças trabalhassem nas atividades rurais auxiliando seus pais e irmãos na lavoura.

Assim, garotos e garotas com 8, 10, 12 anos participavam da agricultura familiar plantando sementes, arando o solo, colhendo etc.

Esses meninos e meninas cresceram, tornaram-se adultos e agora pretendem se aposentar como trabalhadores rurais. Eles tentam aproveitar esse tempo de trabalho infantil, mas o INSS não aceita alegando que, como se trata de trabalho proibido (vedado pela Constituição Federal), não pode ser computado para fins previdenciários.

Além disso, a autarquia previdenciária argumenta que o art. 11, § 6º da Lei nº 8.213/91 prevê que somente as pessoas maiores de 16 (dezesseis) anos podem ser segurado especial.

Resta, então, aos trabalhadores buscarem a via judicial.

 

O que entende a jurisprudência? O STJ acolhe o pedido dos trabalhadores para aproveitar esse tempo trabalhado na agricultura enquanto eram criança?

SIM. É possível o reconhecimento, para fins previdenciários, do trabalho rural exercido antes dos 12 anos de idade.

O objetivo da Previdência é a proteção social do indivíduo. Se o trabalho infantil não fosse admitido para fins previdenciários isso representaria uma dupla punição ao trabalhador, que teve sua infância sacrificada e que agora, na velhice, não pode computar tal período para fins de acesso ao benefício previdenciário a que faz jus.

Em simples palavras, a legislação, ao vedar o trabalho infantil, tem por escopo proteger o menor, não podendo ser utilizada em prejuízo do trabalhador.

O trabalho da criança e do adolescente deve ser reprimido pelo poder público. No entanto, uma vez prestado o labor, o respectivo tempo deve ser computado para fins previdenciários, sendo esse cômputo o mínimo que se pode fazer para mitigar o prejuízo sofrido pelo infante. Vale ressaltar, ainda, que isso não exonera o empregador das punições legais previstas para quem se utiliza do trabalho de menores.

 

Em suma:

Apesar da proibição do trabalho infantil, o tempo de labor rural prestado por menor de 12 anos deve ser computado para fins previdenciários.

STJ. 1ª Turma. AgInt no AREsp 956.558-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 02/06/2020 (Info 674).

 

O STF possui o mesmo entendimento:

O art. 7º, XXXIII, da Constituição não pode ser interpretado em prejuízo da criança ou adolescente que exerce atividade laboral, haja vista que a regra constitucional foi criada para a proteção e defesa dos trabalhadores, não podendo ser utilizada para privá-los dos seus direitos.

STF. 1ª Turma. RE 600.616- AgR/RS, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 26/08/2014.

 

Veja como o tema já foi cobrado em prova:

ý (Promotor MP/ES 2010) O trabalho infantil é repudiado pelo ordenamento jurídico brasileiro, de acordo com a CF, de modo que é inadmissível a contagem do trabalho rural em regime de economia familiar antes dos quatorze anos de idade, para efeito de aposentadoria. (errado) 



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