quinta-feira, 26 de abril de 2012

Foro privativo previsto na CE e crime doloso contra a vida - questão de concurso



O concurso de Juiz de Direito do TJ AC, realizado no último dia 14 de abril, em uma de suas questões, perguntou se a seguinte afirmação estava correta:

Se o acusado de crime de instigação ao suicídio tiver prerrogativa de função prevista na constituição estadual, ele deverá ser processado perante foro especial, ou seja, perante o tribunal de justiça do respectivo estado.

A referida alternativa está ERRADA.

O delito de instigação ao suicídio está previsto no art. 122 do Código Penal, sendo classificado como crime doloso contra a vida.

A Constituição Federal determina que os crimes dolosos contra a vida devem ser julgados pelo Tribunal do Júri (art. 5º, XXXVIII, d).

Segundo informa o enunciado da questão, o acusado possui foro por prerrogativa de função no Tribunal de Justiça, segundo previsão da Constituição Estadual.

Diante disso, temos um impasse:
A CF/88 determina que esse réu (do enunciado) seja julgado pelo Tribunal do Júri (1ª instância) e a Constituição Estadual preconiza que o foro competente é o Tribunal de Justiça (2ª instância).

Qual dos dois comandos deverá prevalecer?
R: a Constituição Federal, por ser hierarquicamente superior.

Logo, qual é a conclusão:
Se determinada pessoa possui por foro prerrogativa de função previsto na Constituição Estadual e comete crime doloso contra a vida, deverá ser julgada pelo Tribunal do Júri, não prevalecendo o foro privativo estabelecido na Constituição Estadual.

Este é o entendimento sumulado do STF:
Súmula 721: A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição estadual.

Exemplo comum de autoridade que tem foro por prerrogativa de função previsto apenas na Constituição Estadual: Vice-Governador.

O Governador de Estado, segundo a CF/88, deve ser processado e julgado, no caso de crimes, pelo STJ (art. 105, I, a, CF).

A CF/88 não fala nada quanto aos Vice-Governadores. Logo, muitas Constituições Estaduais preveem que os Vice-Governadores serão julgados criminalmente pelo Tribunal de Justiça.

Imaginemos agora a seguinte situação hipotética:

“A” é Vice-Governador do Estado “X”
A Constituição do Estado “X” prevê que os Vice-Governadores serão julgados criminalmente pelo TJ.

“A” pratica crime contra licitação
(art. 89, da Lei n.° 8.666/93).
“A” será julgado pelo Tribunal de Justiça
“A” pratica crime doloso contra a vida
(arts. 121 a 126 do CP).
“A” será julgado pelo Tribunal do Júri

Vale ressaltar que esta diferença entre crimes dolosos contra a vida e demais delitos somente se aplica para os casos em que o foro por prerrogativa de função for previsto apenas na Constituição Estadual.

Se o foro por prerrogativa de função for previsto na Constituição Federal, a pessoa será julgada no foro privativo mesmo que o crime seja doloso contra a vida. Vamos a mais um exemplo:

“B” é prefeito de uma cidade do interior.

“B” pratica crime contra licitação
(art. 89, da Lei n.° 8.666/93).
“B” será julgado pelo Tribunal de Justiça
“B” pratica crime doloso contra a vida
(arts. 121 a 126 do CP).
“B” será julgado pelo Tribunal de Justiça
(e não pelo Tribunal do Júri)

Por que?
Porque o foro por prerrogativa de função dos prefeitos é previsto na própria CF (art. 29, X).

Logo, temos a previsão da CF/88 dizendo que as pessoas que cometem crimes dolosos contra a vida serão julgadas pelo Tribunal do Júri (art. 5º, XXXVIII, d). E temos a previsão, também da CF/88, dizendo que os Prefeitos serão julgados pelo Tribunal de Justiça (art. 29, X).

As duas normas são de mesma hierarquia (as duas são da CF/88).

Qual deve ser aplicada então?
R: a norma mais específica, ou seja, a norma que prevê que o foro por prerrogativa de função (os crimes cometidos por Prefeito serão julgados pelo Tribunal de Justiça).

Vale ressaltar, no entanto, que o Prefeito será julgado pelo TJ se o crime for de competência da Justiça Estadual. Se for da competência da Justiça Federal, será julgado pelo TRF e se for da Justiça Eleitoral, pelo TRE. Este é o entendimento sumulado do STF. Confira:

Súmula 702-STF: A competência do Tribunal de Justiça para julgar prefeitos restringe-se aos crimes de competência da justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau.

Crime comum praticado por Prefeito:
· Crime estadual: TJ
· Crime federal: TRF
· Crime eleitoral: TRE

Bem, por hoje é isso.

Ainda esta semana estaremos publicando o Informativo Esquematizado 495 do STJ.

Bons estudos!

Fiquem com Deus.

Grande abraço.

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