sábado, 4 de agosto de 2018

O art. 942 do CPC é aplicado no caso de apelação não unânime em processo no qual se apura a prática de ato infracional por adolescente?



Técnica de julgamento do art. 942 do CPC/2015 (técnica de complementação de julgamento não unânime)
O resultado do julgamento da apelação pode ser unânime (quando todos os Desembargadores concordam) ou por maioria (quando no mínimo um Desembargador discorda dos demais).
Se o resultado por maioria, o CPC prevê uma nova “chance” de a parte que “perdeu” a apelação, reverter o resultado. Como assim?
Se o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em uma nova sessão que será marcada e que contará com a presença de novos Desembargadores que serão convocados, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial.
Ex: o resultado da apelação foi 2x1; 2 Desembargadores votaram pelo provimento da apelação (em favor de João) e um Desembargador votou pela manutenção da sentença (em favor de Pedro); significa dizer que deverá ser designada uma nova sessão e para essa nova sessão serão convocados dois novos Desembargadores que também irão emitir votos; neste nosso exemplo, foram convocados 2 porque a convocação dos novos julgadores deverá ser em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial (se os dois novos Desembargadores votarem com a minoria, o placar se inverte para 3x2).
Veja a previsão legal:
Art. 942. Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores.

Prosseguimento na mesma sessão
Sendo possível, o prosseguimento do julgamento pode ocorrer na mesma sessão, colhendo-se os votos de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado (§ 1º do art. 942).

Juízo de retratação
Os julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento (§ 2º do art. 942). Mesmo que isso ocorra, ou seja, que alguém mude de opinião, ainda assim deverão ser colhidos os votos dos Desembargadores convocados. Nesse sentido:
Enunciado 599-FFPC: A revisão do voto, após a ampliação do colegiado, não afasta a aplicação da técnica de julgamento do art. 942.

Esse art. 942 é uma espécie de recurso?
NÃO. Trata-se de uma “técnica de complementação de julgamento nas decisões colegiadas não unânimes de segunda instância”.

A parte que “perdeu” a apelação precisa pedir a aplicação do art. 942?
NÃO. Essa técnica de julgamento é obrigatória e aplicável de ofício, automaticamente, pelo Tribunal. A parte não precisa requerer a sua aplicação.

Essa técnica vale apenas para a apelação?
NÃO. Além da apelação, a técnica de julgamento prevista no art. 942 aplica-se também para o julgamento não unânime proferido em:
a) ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença, devendo, nesse caso, seu prosseguimento ocorrer em órgão de maior composição previsto no regimento interno;
b) agravo de instrumento, quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito.

Embargos infringentes
Os embargos infringentes eram uma espécie de recurso prevista no CPC/1973.
Os embargos infringentes só cabiam para questionar acórdão. Não bastava, contudo, que fosse acórdão. Era necessário que ele fosse NÃO UNÂNIME, ou seja, acórdão em que houve voto vencido.
A finalidade dos embargos infringentes era a de renovar a discussão para fazer prevalecer as razões do voto vencido.
Segundo o art. 530 do CPC/1973, cabiam embargos infringentes em duas hipóteses:
1) contra acórdão não unânime (por maioria) que reformasse, em grau de apelação, a sentença de mérito.
2) contra acórdão não unânime (por maioria) que julgasse procedente a ação rescisória.

O CPC/2015 acabou com a existência dos embargos infringentes, mas criou essa “técnica de julgamento” do art. 942 que possui algumas semelhanças com os embargos infringentes, mas que não se trata de recurso.

“(...) Esse mecanismo, conquanto não tenha natureza recursal, faz lembrar os embargos infringentes. Por não ser recurso, no entanto, não depende de interposição, constituindo apenas uma fase do julgamento da apelação, do agravo de instrumento contra decisão de mérito e da ação rescisória, não unânime.”
(GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 885).

IMPORTANTE. Situações nas quais não se aplicará a técnica de julgamento do art. 942
Não se aplica a técnica de julgamento do art. 942 do CPC ao julgamento:
I - do incidente de assunção de competência e ao de resolução de demandas repetitivas;
II - da remessa necessária;
III - não unânime proferido, nos tribunais, pelo plenário ou pela corte especial.

A técnica de julgamento do art. 942 é aplicada no caso de rescisão apenas parcial do julgado rescindendo?
SIM. Enunciado 63 – Jornada CJF: A técnica de que trata o art. 942, § 3º, I, do CPC aplica-se à hipótese de rescisão parcial do julgado.

A técnica de julgamento do art. 942 é aplicada no julgamento de apelação em processo de mandado de segurança?
SIM. Enunciado 62 – Jornada CJF: Aplica-se a técnica prevista no art. 942 do CPC no julgamento de recurso de apelação interposto em mandado de segurança.

A técnica de julgamento do art. 942 é aplicada nos Juizados Especiais?
NÃO. É a posição da doutrina majoritária:
Enunciado 552-FPPC: Não se aplica a técnica de ampliação do colegiado em caso de julgamento não unânime no âmbito dos Juizados Especiais.

A técnica de julgamento do art. 942 é aplicada no caso de apelação não unânime em processo no qual se apura a prática de ato infracional por adolescente?
5ª Turma do STJ: SIM
Admite-se a incidência do art. 942 do CPC/2015 para complementar o julgamento da apelação julgada por maioria nos procedimentos relativos ao estatuto do menor. 
STJ. 5ª turma. AgRg no REsp 1.673.215-RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 17/05/2018 (Info 627).

Por quê?
O art. 198 do ECA diz que, nos procedimentos de competência da Justiça da Infância e da Juventude, inclusive os relativos à execução das medidas socioeducativas, deve-se adotar o sistema recursal previsto no CPC.
Como o sistema recursal do CPC prevê a técnica de complementação do julgamento (art. 942), isso deverá ser também aplicado para os recursos do ECA.

6ª Turma do STJ: DEPENDE
• Se a decisão não unânime foi favorável ao adolescente infrator: não se deve aplicar o art. 942 do CPC/2015.
• Se a decisão não unânime foi contrária ao adolescente infrator: deve-se aplicar o art. 942.

É inaplicável a técnica de julgamento prevista no artigo 942 do CPC/2015 nos procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude quando a decisão não unânime for favorável ao adolescente.
STJ. 6ª Turma. 6ª Turma. REsp 1.694.248-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 03/05/2018 (Info 626

Por quê?
Realmente o sistema recursal do CPC deve ser aplicado para os procedimentos da Justiça da Infância e da Juventude. Isso está expressamente previsto no art. 198 do ECA.
Ocorre que ao menor infrator devem ser assegurados os mesmos direitos de que gozam os maiores de 18 anos que forem réus em processo criminal.
Por mais que a medida socioeducativa não seja considerada “pena”, ela possui, indiscutivelmente, uma natureza sancionatória.
Se for aplicado o art. 942 do CPC em uma apelação não unânime que tenha sido favorável ao adolescente infrator (ex: o Tribunal rejeitou a medida socioeducativa), isso significa que esse adolescente terá um tratamento mais gravoso do que os réus maiores de 18 anos possuem no processo penal. No processo penal, se a apelação for favorável ao réu, não se aplica o art. 942 do CPC nem caberão os embargos infringentes do art. 609 do CPP. Isso porque os embargos infringentes somente são cabíveis na hipótese de o julgamento por maioria tiver sido contrário ao réu. Em outras palavras, os embargos infringentes são um recurso exclusivo da defesa.
Ora, se não cabem embargos infringentes do art. 609 do CPP quando o acórdão não unânime foi favorável ao réu, com maior razão também não se pode admitir a técnica do art. 942 do CPC se o acórdão não unânime foi favorável ao adolescente infrator.




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