quarta-feira, 12 de novembro de 2025
Súmula vinculante 63
TRÁFICO PRIVILEGIADO NÃO É CRIME HEDIONDO OU EQUIPARADO
Tráfico privilegiado (art.
33, § 4º da Lei nº 11.343/2006)
A Lei de
Drogas prevê, em seu art. 33, § 4º, a figura do “traficante privilegiado”,
também chamada de “traficância menor” ou “traficância eventual”:
Art. 33 (...)
§ 4º Nos delitos
definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um
sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde
que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades
criminosas nem integre organização criminosa.
Qual é a natureza jurídica deste § 4º?
Trata-se de uma causa de diminuição de
pena.
Redução:
de 1/6 a 2/3
O magistrado tem plena autonomia para
aplicar a redução no quantum que
reputar adequado de acordo com as peculiaridades do caso concreto. Vale
ressaltar, no entanto, que essa fixação deve ser suficientemente fundamentada e
não pode utilizar os mesmos argumentos adotados em outras fases da dosimetria
da pena (STF HC 108387, 06.03.12). Dito de
outra forma, não se pode utilizar os mesmos fundamentos para fixar a pena-base
acima do mínimo legal e para definir o quantum da redução prevista neste
dispositivo, sob pena de bis in idem.
Jurisprudência
em Teses do STJ (ed. 131)
Tese 25:
Diante da ausência de parâmetros legais, é possível que a fração de redução da
causa de diminuição de pena estabelecida no art. 33, § 4º, da Lei n.
11.343/2006 seja modulada em razão da qualidade e da quantidade de droga
apreendida, além das demais circunstâncias do delito.
Vedação
à conversão em penas restritivas de direitos
O STF já declarou, de forma incidental,
a inconstitucionalidade da expressão “vedada a conversão em penas restritivas
de direitos”, constante deste § 4º do art. 33, de modo que é possível, segundo
avaliação do caso concreto, a concessão da substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos, desde que cumpridos os requisitos do art.
44 do CP.
Requisitos:
Para ter direito à minorante
prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006, é necessário o preenchimento
de quatro requisitos autônomos:
a) primariedade;
b) bons antecedentes;
c) não dedicação a atividades
criminosas; e
d) não integração à organização
criminosa.
ý
(Promotor MP/MG 2019) São requisitos para o reconhecimento do tráfico
privilegiado que o agente seja primário, de bons antecedentes e boa conduta
social, que não se dedique às atividades criminosas nem integre organização
criminosa. (errado)
Se o réu não preencher algum
desses requisitos, não terá direito à minorante. São requisitos cumulativos:
Jurisprudência
em Teses do STJ
Tese 22: A
causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas só
pode ser aplicada se todos os requisitos, cumulativamente, estiverem presentes.
Esse benefício se aplica
para quais delitos?
• Art. 33, caput: tráfico de
drogas.
• Art. 33, § 1º, I: importar, exportar, produzir, adquirir,
vender, guardar matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação
de drogas.
• Art. 33, § 1º, II: semear,
cultivar, fazer a colheita de plantas que são matéria-prima para preparação de
drogas.
• Art. 33, § 1º, III: utilizar
local ou bem de sua propriedade, posse, administração guarda ou vigilância, ou
consentir que alguém utilize para o tráfico ilícito de drogas.
• Art. 33, § 1º, IV: vende ou
entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à
preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal
ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos
probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
þ
(Juiz de Direito TJ-MS 2020 FCC) No que concerne à lei de drogas, cabível a
redução da pena de um sexto a dois terços para o agente que tem em depósito,
sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar,
matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas,
desde que primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades
criminosas nem integre organização criminosa. (CERTO)
Tráfico privilegiado (art. 33, §
4º, da Lei 11.343/2006) não é crime equiparado a hediondo
Veja o que diz o § 5º do art. 112 da LEP:
Art. 112
(...)
§ 5º Não
se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de
tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto
de 2006. (Lei nº 13.964/2019 – Pacote Anticrime)
ý
(Juiz Federal TRF2 2017) Presente a causa de diminuição de pena prevista no §
4º do art. 33 da Lei 11.343/2006, por ser o agente primário, de bons
antecedentes, não dedicado a atividades criminosas e não integrante de
organização criminosa, ainda assim é hediondo o crime de tráfico por ele
praticado. (errado)
Mesmo antes da inserção desse §
5º do art. 112 pela Lei nº 13.964/2019, a jurisprudência já entendia que o
tráfico privilegiado não é crime hediondo:
O chamado "tráfico privilegiado", previsto no § 4º do
art. 33 da Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas), não deve ser considerado crime
equiparado a hediondo.
STF. Plenário. HC 118533/MS, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em
23/6/2016 (Info 831).
O tráfico ilícito de drogas na sua forma privilegiada (art. 33,
§ 4º, da Lei nº 11.343/2006) não é crime equiparado a hediondo e, por
conseguinte, deve ser cancelado o Enunciado 512 da Súmula do Superior Tribunal
de Justiça.
STJ. 3ª Seção. Pet 11.796-DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis
Moura, julgado em 23/11/2016 (Recurso Repetitivo – Tema 600) (Info 595).
PELO FATO DE NÃO TER NATUREZA HEDIONDA, NÃO SE APLICA PARA O
TRÁFICO PRIVILEGIADO (ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/2006) OS PARÂMETROS MAIS
RIGOROSOS DE PROGRESSÃO DE REGIME E DE LIVRAMENTO CONDICIONAL
O caso concreto foi o
seguinte:
O Defensor Público-Geral Federal apresentou ao Supremo
Tribunal Federal uma proposta de edição de súmula vinculante, com fundamento no
art. 3º, VI, da Lei nº 11.417/2006:
Art. 3º São legitimados a propor a
edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante:
(...)
VI - o Defensor Público-Geral da União;
O objetivo era transformar em
súmula vinculante o entendimento do STF de que o tráfico privilegiado (art. 33,
§ 4º, da Lei nº 11.343/2006) não é hediondo.
O STF concordou com os
argumentos invocados pela Defensoria Pública da União?
SIM.
O STF, no julgamento do HC
118.533, decidiu que o tráfico de entorpecentes privilegiado (art. 33, § 4º, da
Lei n. 11.343/2006) não se harmoniza com a hediondez do tráfico de
entorpecentes definido no caput e § 1º do art. 33 da Lei de Tóxicos: STF.
Plenário. HC 118.533, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 23/6/2016.
Mais recentemente, o Plenário do
STF reafirmou o entendimento ao consolidar a possibilidade de concessão de
indulto a condenado por tráfico privilegiado, tendo em vista que o crime não
teria natureza hedionda. A tese foi fixada na sistemática da repercussão geral,
no julgamento do RE 1.542.482 (Tema 1.400):
É constitucional a concessão de indulto a condenado por tráfico
privilegiado, uma vez que o crime não tem natureza hedionda.
STF. Plenário. RE 1.542.482/SP, Rel. Min. Roberto Barroso,
julgado em 31/05/2025 (Repercussão Geral – Tema 1.400) (Info 1180).
Desse modo, a jurisprudência do
STF afirma que o tráfico de entorpecentes privilegiado, previsto no art. 33, §
4º, da Lei nº 11.343/2006, não tem natureza hedionda.
O enunciado vinculante proposto
vai além da tese firmada em repercussão geral no julgamento do RE 1.542.482 RG,
tendo por objetivo fixar, em caráter vinculante, a não hediondez do tráfico
privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006), afastando-se a incidência
dos parâmetros mais gravosos previstos na legislação para a progressão de
regime e para o livramento condicional, aplicáveis aos crimes hediondos.
Explicando melhor
O art. 112 da Lei nº 7.210/1984
(Lei de Execuções Penais – LEP) prevê os requisitos para a concessão de
progressão de regime. Esse artigo estabelece requisitos mais rigorosos para a
progressão caso o apenado tenha sido condenado por crime hediondo.
As regras sobre o livramento
condicional estão elencadas nos arts. 83 a 90 do CP e arts. 131 a 146 da LEP. Para
que seja concedido o livramento condicional, o juiz deverá verificar se o
condenado preenche os requisitos subjetivos e objetivos previstos no art. 83 do
Código Penal. Esse artigo também estabelece requisitos mais rigorosos para o
livramento condicional caso o réu tenha sido condenado por crime hediondo.
Dizendo de forma simples: é mais
difícil a progressão de regime e o livramento condicional para crimes
hediondos.
Qual foi o objetivo da súmula
vinculante: deixar claro que o tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da LD) não
é crime hediondo nem equiparado e, portanto, não está sujeito a esses
requisitos mais rigorosos.
Em suma: condenados por tráfico
privilegiado têm direito à progressão de regime e livramento condicional com
requisitos menos rigorosos; isso porque o tráfico privilegiado não é crime
hediondo nem equiparado.
Veja a redação dada para a
súmula vinculante:
Súmula vinculante 63: O tráfico privilegiado (art.
33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006) não configura crime hediondo, afastando-se a
aplicação dos parâmetros mais rigorosos de progressão de regime e de livramento
condicional.
STF. Plenário.
PSV 125/DF, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 26/09/2025 (Info 1193).

