sexta-feira, 15 de maio de 2015

Plenário do STF decide que Ministério Público pode realizar a investigação de crimes, atendidos certos parâmetros


O Ministério Público pode realizar diretamente a investigação de crimes?
SIM. O MP pode promover, por autoridade própria, investigações de natureza penal.

Mas a CF/88 expressamente menciona que o MP tem poder para investigar crimes?
NÃO. A CF/88 não fala isso de forma expressa. Adota-se aqui a teoria dos poderes implícitos.
Segundo essa doutrina, nascida nos EUA (Mc CulloCh vs. Maryland – 1819), se a Constituição outorga determinada atividade-fim a um órgão, significa dizer que também concede todos os meios necessários para a realização dessa atribuição.
A CF/88 confere ao MP as funções de promover a ação penal pública (art. 129, I). Logo, ela atribui ao Parquet também todos os meios necessários para o exercício da denúncia, dentre eles a possibilidade de reunir provas para que fundamentem a acusação.
Ademais, a CF/88 não conferiu à Polícia o monopólio da atribuição de investigar crimes. Em outras palavras, a colheita de provas não é atividade exclusiva da Polícia.
Desse modo, não é inconstitucional a investigação realizada diretamente pelo MP.
Esse é o entendimento do STF e do STJ.

Qual é o fundamento constitucional?
Além da doutrina dos poderes implícitos, podemos citar como fundamento constitucional que autoriza, de forma implícita, o poder de investigação do MP:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;
(...)
VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva;
VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;
VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;
IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.

Existe algum fundamento legal?
A Lei Complementar n.° 75/1993, também de forma implícita, autoriza a realização de atos de investigação nos seguintes termos:

Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência:
I - notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada;
(...)
V - realizar inspeções e diligências investigatórias;
(...)
VII - expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar;

Decisão do Plenário do STF
O STJ e a 2ª Turma do STF possuíam diversos precedentes reconhecendo o poder de investigação do Ministério Público.
A novidade está no fato de que esse entendimento foi reafirmado agora pelo Plenário do STF no julgamento do RE 593727, submetido a repercussão geral, e apreciado no dia de ontem (14/05/2015).
No julgamento, o Plenário do STF reconheceu a legitimidade do Ministério Público para promover, por autoridade própria, investigações de natureza penal, mas ressaltou que essa investigação deverá respeitar alguns parâmetros (requisitos).

Parâmetros que devem ser respeitados para que a investigação conduzida diretamente pelo MP seja legítima
1) Devem ser respeitados os direitos e garantias fundamentais dos investigados;
2) Os atos investigatórios devem ser necessariamente documentados e praticados por membros do MP;
3) Devem ser observadas as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição, ou seja, determinadas diligências somente podem ser autorizadas pelo Poder Judiciário nos casos em que a CF/88 assim exigir (ex: interceptação telefônica, quebra de sigilo bancário etc);
4) Devem ser respeitadas as prerrogativas profissionais asseguradas por lei aos advogados;
5) Deve ser assegurada a garantia prevista na Súmula vinculante 14 do STF (“É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”);
6) A investigação deve ser realizada dentro de prazo razoável;
7) Os atos de investigação conduzidos pelo MP estão sujeitos ao permanente controle do Poder Judiciário.

Tese fixada para fins de repercussão geral
Como dito, o STF apreciou o tema em um recurso extraordinário submetido à sistemática da repercussão geral.
Nesse tipo de julgamento, o STF redige um enunciado que serve como tese que será aplicada para os casos semelhantes. É como se fosse uma súmula.

A tese fixada pela Corte foi a seguinte:


“O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, por seus agentes, as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos, em nosso País, os Advogados (Lei 8.906/94, artigo 7º, notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da possibilidade – sempre presente no Estado democrático de Direito – do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente documentados (Súmula Vinculante 14), praticados pelos membros dessa instituição”.

STF. Plenário. RE 593727/MG, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 14/5/2015.



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