quinta-feira, 5 de julho de 2018

Código de Procedimentos em matéria processual


Olá amigos do Dizer o Direito,

O Estado de Pernambuco aprovou o primeiro Código de Procedimentos em matéria processual do Brasil.

O Presidente da comissão que auxiliou os Deputados na elaboração do texto foi o grande processualista civil Leonardo José Carneiro da Cunha.

Uma pergunta que muitos de vocês podem estar se fazendo é a seguinte: o Estado-membro possui competência para editar um Código de Procedimentos em matéria processual?
SIM. Isso porque neste caso o Estado-membro não está legislando sobre Processo Civil, que é de competência privativa da União (art. 22, I, da CF/88).
Trata-se de uma lei sobre PROCEDIMENTOS, sendo isso de competência concorrente, nos termos do art. 22, XI, da CF/88:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
(...)
XI - procedimentos em matéria processual;

PROCESSO: competência privativa da União.
PROCEDIMENTOS em matéria processual: competência concorrente da União, Estados e DF.

Dessa feita, em matéria de procedimento, cabe à União estabelecer as normas gerais (art. 24, § 1º) e os Estados têm competência para suplementar, ou seja, complementar (detalhar) essas normas gerais.

O CPC (Lei federal nº 13.105/2015) traz regras de processo e também algumas normas gerais sobre procedimento.

Desse modo, os Estados-membros podem legislar sobre procedimentos naquilo que não contrariar as normas gerais da União.

Se não houver normas gerais da União tratando sobre procedimento, os Estados possuem competência legislativa plena.

É isso que preveem os parágrafos do art. 24:
Art. 24 (...)
§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.
§ 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.
§ 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
§ 4º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.

Assim, não há qualquer inconstitucionalidade formal na edição de um Código de Procedimentos em matéria processual por parte dos Estados-membros. Ao contrário, trata-se de medida salutar, que aumenta a transparência e garante segurança jurídica. Como já explicou o Min. Gilmar Mendes:
“(...) a prerrogativa de legislar sobre procedimentos possui também o condão de transformar os Estados em verdadeiros laboratórios legislativos. Ao conceder-se aos Entes federados o poder de regular o procedimento de uma matéria, baseando-se em peculiaridades próprias, está a possibilitar-se que novas e exitosas experiências sejam formuladas. Os Estados passariam a ser partícipes importantes no desenvolvimento do direito nacional e a atuar ativamente na construção de possíveis experiências que poderão ser adotadas por outros Entes ou em todo território federal.” (STF. Plenário. ADI 2922/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/4/2014).

Obviamente, o Código Estadual de Procedimentos não pode contrariar o CPC nem qualquer outra norma geral da União sobre procedimentos. De igual forma, o Código Estadual deverá ficar restrito a tratar de normas de procedimento, não podendo extravasar sua competência e tratar sobre regras processuais.

Qual é a diferença entre normas de processo e normas de procedimento?
Carnelutti define procedimento como “uma sucessão de atos não só finalmente mas também causalmente vinculados, porquanto cada um deles supõe o precedente e assim o último supõe o grupo todo”. Já o processo seria “o conjunto de todos os atos necessários em cada caso para a composição da lide” (CARNELUTTI, Francesco. Instituições do Processo Civil. V. 1 Tradução: Adrián Sotero De Witt Batista. Campinas: Servanda, 1999, p. 472-473).

Humberto Theodoro Júnior explica que
“Processo e procedimento são conceitos diversos e que os processualistas não confundem.
Processo, como já se afirmou, é o método, isto é, o sistema de compor a lide em juízo através de uma relação jurídica vinculativa de direito público, enquanto procedimento é a forma material com que o processo se realiza em cada caso concreto.
(...)
O processo, outrossim, não se submete a uma única forma. Exterioriza-se de várias maneiras diferentes, conforme as particularidades da pretensão do autor e da defesa do réu. Uma ação de cobrança não se desenvolve, obviamente, como uma de inventário e nem muito menos como uma possessória. O modo próprio de desenvolver-se o processo, conforme as exigências de cada caso, é exatamente o procedimento do feito, isto é, o seu rito.
É o procedimento, de tal sorte, que dá exterioridade ao processo, ou à relação processual, revelando-lhe o modus faciendi com que se vai atingir o escopo da tutela jurisdicional. Em outras palavras, é o procedimento que, nos diferentes tipos de demanda, define e ordena os diversos atos processuais necessários.” (Curso de Direito Processual Civil. Vol. I, 56ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 156).

São exemplos de normas PROCESSUAIS aquelas que tratam sobre:
·       condições da ação;
·       pressupostos processuais;
·       intervenção de terceiros;
·       provas;
·       recursos;
·       coisa julgada.

São exemplos de normas de PROCEDIMENTO:
·       forma de autuação das petições;
·       forma de registro das decisões, sentenças e acórdãos;
·       regras sobre o funcionamento do serviço de protocolo;
·       regras sobre a expedição de certidões;
·       disciplina do arquivamento dos processos;
·       instruções sobre o levantamento dos alvarás judiciais;
·       instruções sobre a sistemática para carga dos autos;
·       informações que devem constar nos mandados de prisão e nos alvarás de soltura.

Vale ressaltar, contudo, que nem sempre é fácil estabelecer essa distinção.

Clique AQUI para ler o Código Pernambucano de Procedimentos em matéria processual.



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