Dizer o Direito

sábado, 21 de março de 2020

Três principais mudanças promovidas pela MP 926/2020 na Lei 13.979/2020 (medidas de enfrentamento do coronavírus)



No início de fevereiro, foi editada a Lei nº 13.979/2020, prevendo medidas para o enfrentamento do coronavírus. Naquela época, os problemas causados pelo vírus já ocorriam em outros lugares do mundo, mas a doença ainda não havia chegado no Brasil.

No dia de hoje, foi editada uma Medida Provisória alterando alguns dispositivos da Lei nº 13.979/2020.

Irei destacar aqui as três principais alterações.

1) a MP 926/2020 deixa claro que somente o Governo Federal poderá autorizar que sejam restringidos os transportes interestadual e intermunicipal

Alguns Estados e Municípios editaram, nos últimos dias, decretos restringindo a entrada e saída de pessoas nos seus territórios.
O Governo Federal, contudo, entendeu que tais medidas não poderiam ser adotadas e, por meio da MP 926/2020, alterou a Lei nº 13.979/2020, para deixar expresso que somente por ato do Poder Executivo federal será possível a restrição da locomoção interestadual e intermunicipal por rodovias, portos ou aeroportos. Veja:

Lei 13.979/2020
Antes da MP 926/2020
Depois da MP 926/2020
Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, poderão ser adotadas, entre outras, as seguintes medidas:
Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as seguintes medidas:
VI – restrição excepcional e temporária de entrada e saída do País, conforme recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por rodovias, portos ou aeroportos;
VI – restrição excepcional e temporária, conforme recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, por rodovias, portos ou aeroportos de:               
a) entrada e saída do País; e
b) locomoção interestadual e intermunicipal;

Segundo o § 6º do art. 3º da Lei nº 13.979/2020, essa medida de restrição do inciso VI acima mencionada somente poderá ser determinada segundo o que for previsto em um ato conjunto editado pelos Ministros da Saúde e da Justiça e Segurança Pública.
O § 7º afirma que os órgãos gestores locais de saúde só podem determinar a medida do inciso VI se forem autorizados pelo Ministério da Saúde.

2) a MP afirma que, mesmo quando houver restrições, deverá ser permitido o exercício e o funcionamento de serviços públicos e atividades essenciais

A MP 926/2020 acrescenta um dispositivo afirmando que as medidas previstas no art. 3º da Lei nº 13.979/2020, quando adotadas, deverão resguardar o exercício e o funcionamento de serviços públicos e atividades essenciais.

A MP afirma também que é proibido restringir a circulação:
• de trabalhadores, se isso afetar o funcionamento de serviços públicos e atividades essenciais; e
• de cargas de qualquer espécie que possam acarretar desabastecimento de gêneros necessários à população.

O que são serviços públicos e atividades essenciais?
O Presidente da República editou o Decreto nº 10.282, de 20 de março de 2020, regulamentando isso.

São serviços públicos e atividades essenciais aqueles indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, assim considerados aqueles que, se não atendidos, colocam em perigo a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população, tais como (rol exemplificativo):
I - assistência à saúde;
II - assistência social;
III - segurança pública e privada;
IV - defesa nacional e de defesa civil;
V - transporte intermunicipal, interestadual e internacional de passageiros e o transporte de passageiros por táxi ou aplicativo;
VI - telecomunicações e internet;
VII - água;
VIII - esgoto e lixo;
IX - energia elétrica e gás;
X - iluminação pública;
XI - produtos de saúde, higiene, alimentos e bebidas;
XII - serviços funerários;
XIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas, de equipamentos e de materiais nucleares;
XIV - vigilância e certificações sanitárias e fitossanitárias;
XV - prevenção, controle e erradicação de pragas dos vegetais e de doença dos animais;
XVI - vigilância agropecuária internacional;
XVII - controle de tráfego aéreo, aquático ou terrestre;
XVIII - compensação bancária, redes de cartões de crédito e débito, caixas bancários eletrônicos e outros serviços não presenciais de instituições financeiras;
XIX - serviços postais;
XX - transporte e entrega de cargas em geral;
XXI - serviço relacionados à tecnologia da informação e de processamento de dados (data center) para suporte de outras atividades;
XXII - fiscalização tributária e aduaneira;
XXIII - transporte de numerário;
XXIV - fiscalização ambiental;
XXV - produção, distribuição e comercialização de combustíveis e derivados;
XXVI - monitoramento de construções e barragens que possam acarretar risco à segurança;
XXVII - dados geológicos com vistas à garantia da segurança coletiva;
XXVIII  - mercado de capitais e seguros;
XXIX - cuidados com animais em cativeiro;
XXX - assessoramento em resposta às demandas que continuem em andamento e às urgentes;
XXXI - atividades médico-periciais relacionadas com a previdência e assistência social;
XXXII - atividades médico-periciais relacionadas com reconhecimento de direitos por pessoas com deficiência;
XXXIII - outras prestações médico-periciais da carreira de Perito Médico Federal indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

Decreto nº 10.288/2020
Art. 3º As medidas previstas na Lei nº 13.979, de 2020, deverão resguardar o exercício pleno e o funcionamento das atividades e dos serviços relacionados à imprensa, considerados essenciais no fornecimento de informações à população, e dar efetividade ao princípio constitucional da publicidade em relação aos atos praticados pelo Estado.
Parágrafo único.  A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto no art. 220, § 1º, da Constituição.

Art. 4º São considerados essenciais as atividades e os serviços relacionados à imprensa, por todos os meios de comunicação e divulgação disponíveis, incluídos a radiodifusão de sons e de imagens, a internet, os jornais e as revistas, dentre outros.
§ 1º Também são consideradas essenciais as atividades acessórias e de suporte e a disponibilização dos insumos necessários à cadeia produtiva relacionados às atividades e aos serviços de que trata o caput.
§ 2º É vedada a restrição à circulação de trabalhadores que possa afetar o funcionamento das atividades e dos serviços essenciais de que trata este Decreto.
§ 3º Na execução das atividades e dos serviços essenciais de que trata este Decreto deverão ser adotadas todas as cautelas para redução da transmissibilidade da covid-19.



3) a MP trouxe novas regras para as dispensas de licitação destinadas ao enfrentamento do coronavírus

Possibilidade de dispensa da licitação
O art. 4º da Lei nº 13.979/2020, com redação dada pela MP 926/2020, prevê que é dispensável a licitação para aquisição de bens, serviços, inclusive de engenharia, e insumos destinados ao enfrentamento da emergência decorrente do coronavírus.
A dispensa de licitação é temporária e aplica-se apenas enquanto perdurar a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus.

Podem ser comprados equipamentos usados
A aquisição de bens e a contratação de serviços a que se refere o caput do art. 4º não se restringe a equipamentos novos, desde que o fornecedor se responsabilize pelas plenas condições de uso e funcionamento do bem adquirido (art. 4º-A).

Situação de emergência está presumida
Nas dispensas de licitação decorrentes do coronavírus, presumem-se atendidas as condições de:
I - ocorrência de situação de emergência;
II - necessidade de pronto atendimento da situação de emergência;
III - existência de risco a segurança de pessoas, obras, prestação de serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares; e
IV - limitação da contratação à parcela necessária ao atendimento da situação de emergência.

Não será necessária a elaboração de estudos preliminares
Para as contratações de bens, serviços e insumos necessários ao enfrentamento da emergência de que trata esta Lei, não será exigida a elaboração de estudos preliminares quando se tratar de bens e serviços comuns.

Termo de referência simplificado ou projeto básico simplificado
Será admitida a apresentação de termo de referência simplificado ou de projeto básico simplificado.
O termo de referência simplificado ou o projeto básico simplificado conterá:
I - declaração do objeto;
II - fundamentação simplificada da contratação;
III - descrição resumida da solução apresentada;
IV - requisitos da contratação;
V - critérios de medição e pagamento;
VI - estimativas dos preços obtidos por meio de, no mínimo, um dos seguintes parâmetros:
a) Portal de Compras do Governo Federal;
b) pesquisa publicada em mídia especializada;
c) sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo;
d) contratações similares de outros entes públicos; ou
e) pesquisa realizada com os potenciais fornecedores; e
VII - adequação orçamentária.

Restrição de fornecedores ou de prestadores de serviço
Na hipótese de haver restrição de fornecedores ou prestadores de serviço, a autoridade competente, excepcionalmente e mediante justificativa, poderá dispensar a apresentação de documentação relativa à regularidade fiscal e trabalhista ou, ainda, o cumprimento de um ou mais requisitos de habilitação, ressalvados a exigência de apresentação de prova de regularidade relativa à Seguridade Social e o cumprimento do disposto no inciso XXXIII do caput do art. 7º da Constituição.

Duração dos contratos
Os contratos regidos por esta Lei terão prazo de duração de até 6 meses e poderão ser prorrogados por períodos sucessivos, enquanto perdurar a necessidade de enfrentamento dos efeitos da situação de emergência de saúde pública.

Percentual de acréscimos ou supressões obrigatórias
Para os contratos decorrentes dos procedimentos previstos nesta Lei, a administração pública poderá prever que os contratados fiquem obrigados a aceitar, nas mesmas condições contratuais, acréscimos ou supressões ao objeto contratado, em até 50% do valor inicial atualizado do contrato.

Divulgação das contratações ou aquisições realizadas
Todas as contratações ou aquisições realizadas com fundamento na Lei nº 13.979/2020 serão imediatamente disponibilizadas em site oficial específico na internet, contendo, dentre outras informações, o nome do contratado, o prazo e o valor do contrato.



Print Friendly and PDF