segunda-feira, 1 de agosto de 2022

A semi-imputabilidade (art. 46 da LD), por si só, não afasta o tráfico de drogas e o seu caráter hediondo, tal como a forma privilegiada do § 4º do art. 33

 

Semi-imputabilidade da Lei de Drogas

O art. 46 da Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006) estabelece o seguinte:

Art. 46. As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

 

Esse dispositivo prevê uma causa especial de diminuição de pena aplicada quando o juiz entender que o réu não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Trata-se de hipótese da semi-imputabilidade.

 

Imagine agora a seguinte situação hipotética envolvendo semi-imputabilidade:

João foi preso em flagrante com entorpecente.

Ele foi denunciado pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, Lei nº 11.343/2006).

Ao final da instrução, João foi condenado.

O juiz aplicou ao réu a pena de 3 anos e 6 meses de reclusão em regime fechado.

Vale ressaltar que o magistrado afastou a causa de diminuição do art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/2006 (tráfico privilegiado) por ser o réu reincidente.

No entanto, o juiz aplicou a causa de diminuição de pena prevista no art. 46, da Lei nº 11.343/2006, porque, segundo o laudo psiquiátrico juntado aos autos, o réu era “portador de desenvolvimento mental retardado em grau leve”.

A sentença transitou em julgado e se iniciou a execução penal (cumprimento da pena).

A Defensoria Pública requereu ao Juízo da Execução Penal que fosse excluída a classificação de “delito assemelhado a hediondo” e que João tivesse direito aos benefícios da execução penal aplicáveis aos condenados por crime “comum” (não hediondo ou equiparado).

 

Mas o art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2005 não é equiparado a hediondo?

SIM. O crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2005) é equiparado a hediondo.

No entanto, a Defensoria Pública sustentou a seguinte tese:

- no caso concreto, foi reconhecida a incidência da causa de diminuição de pena prevista no art. 46, da Lei nº 11.343/2006;

- isso significa que a conduta do réu teve um menor grau de culpabilidade. Logo, deve-se afastar a pecha de hediondez do crime;

- o STF decidiu que o tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006) não pode ser equiparado a crime hediondo (STF HC 118.553/MS);

- esse mesmo raciocínio deve ser aqui utilizado para afastar a hediondez nos casos de semi-imputabildiade;

- ora, se o tráfico privilegiado não é equiparado a hediondo, a semi-imputabilidade do art. 46 da LD também deve afastar o caráter hediondo do tráfico.

 

A tese da Defensoria Pública foi acolhida pelo STJ?

NÃO.

Não existe previsão legal afirmando que a semi-imputabilidade, por si só, afasta a hediondez do tráfico de drogas.

A semi-imputabilidade (art. 46 da LD) é uma situação distinta do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º), que traz condições objetivas de redução da pena e que são capazes de afastar a hediondez do delito.

 

Em suma:

A semi-imputabilidade, por si só, não afasta o tráfico de drogas e o seu caráter hediondo, tal como a forma privilegiada.

STJ. 6ª Turma. AgRg no HC 716.210-DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 10/05/2022 (Info 737).


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