quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Em que consiste a chamada propaganda comparativa? Se o juiz reconhecer que houve propaganda comparativa ofensiva, os danos morais e materiais são considerados presumidos?

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte:

A Nissan veiculou, na televisão e internet, filme publicitário em que faz referência, de forma não autorizada, aos veículos da Toyota.

Na referida campanha publicitária, a Nissan afirmava que seu automóvel Nissan Frontier teria sido eleito a Melhor Compra 2010 pela revista Quatro Rodas na categoria picapes cabine dupla.

Além disso, passava a mensagem de que os veículos Hilux (Toyota) e Amarok (Volkswagen) seriam apenas uma maquiagem de um utilitário, veículos para cidade, não aptos nem competentes a enfrentar as condições hostis do ambiente e atividades rurais, enquanto o Frontier seria.

A cena se passa num ambiente de posto de gasolina, onde uma dupla de cowboys (denominados “Railuque & Maloque”) canta e dança, tendo sempre ao fundo os automóveis Hilux (Toyota) e Amarok (VW). Após a música, a cena vai para um banho de lama dado pela Frontier na dupla de cowboys.

A Toyota ajuizou ação inibitória e indenizatória contra a Nissan.

Pediu que a ré fosse condenada a deixar de veicular a propaganda, sob pena de multa diária.

Requereu, ainda, a condenação em danos materiais e morais.

A discussão chegou até o STJ. Vejamos o que decidiu o Tribunal.

 

No caso concreto, temos aquilo que se denomina de “propaganda comparativa”. Em que consiste isso?

A propaganda comparativa é forma de publicidade na qual se compara, explícita ou implicitamente, produtos ou serviços concorrentes, a fim de conquistar a escolha do consumidor.

Em nosso país, não há lei definindo o que seja publicidade comparativa.

A doutrina e o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária do CONAR afirmam que a publicidade comparativa, em regra, é permitida, desde que não viole alguns princípios.

Segundo já decidiu o STJ, é lícita a propaganda comparativa entre produtos de marcas distintas e de preços próximos no caso em que:

a) a comparação tenha por objetivo principal o esclarecimento do consumidor;

b) as informações vinculadas sejam verdadeiras, objetivas, não induzam o consumidor a erro, não depreciem o produto ou a marca, tampouco sejam abusivas (art. 37, § 2º, do CDC); e

c) os produtos e marcas comparados não sejam passíveis de confusão.

A publicidade comparativa não é vedada pelo CDC, desde que obedeça ao princípio da veracidade das informações, seja objetiva e não abusiva.

De igual forma, em regra, a propaganda comparativa não é proibida pela Lei 9.279/96 (LPI). Para que a propaganda comparativa viole o direito marcário do concorrente, as marcas devem ser passíveis de confusão ou a menção à marca do concorrente deve ser feita de forma depreciativa, acarretando a degradação (desgaste do outro produto) e o consequente desvio de clientela.

STJ. 4ª Turma. REsp 1377911-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/10/2014 (Info 550).

 

No caso de propaganda comparativa, não há confusão entre marcas, nem falsificação de símbolo ou indução do consumidor a confundir uma marca por outra. Ao contrário, a propaganda serve para as distinguir, até para enaltecer uma marca em face das outras marcas comparadas.

 

No presente caso, houve condenação em danos morais?

SIM.

No caso concreto, houve propaganda comparativa claramente ofensiva.

Logo, trata-se de hipótese de dano moral in re ipsa.

 

No presente caso, houve condenação em danos materiais?

NÃO.

No caso concreto, apesar de ter existido propaganda comparativa ofensiva, o autor não comprovou, de maneira efetiva, qual o prejuízo sofrido.

É equivocado o reconhecimento de um dano material in re ipsa sem expressa previsão legal, a partir da utilização comparativa, por mera analogia, de violação de direito marcário, esta sim com indicativos objetivos na Lei de Propriedade Industrial.

O reconhecimento de dano material in re ipsa, sem expressa previsão legal, a dispensar a comprovação mínima de existência desse dano, é indevida, inviável.

 

No contexto de propaganda comparativa ofensiva, não é viável impor a obrigação de indenização por danos materiais sem a devida demonstração de prejuízo. 

STJ. 4ª Turma. AgInt nos EDcl no REsp 1.770.411-RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Rel. para acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 14/2/2023 (Info 781).


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