sexta-feira, 22 de julho de 2022

É possível que uma lei conceda aos servidores públicos isenção do pagamento da taxa de inscrição nos concursos públicos?

 

É possível que uma lei conceda aos servidores públicos isenção do pagamento da taxa de inscrição nos concursos públicos?

NÃO.

O concurso público é um mecanismo que proporciona a realização concreta dos princípios constitucionais da isonomia e da impessoalidade. Logo, não se admite que seja feito discrímen (distinção) que, ao invés de fomentar a igualdade de acesso aos cargos e empregos públicos, amplia a desigualdade entre os possíveis candidatos.

Com base nisso, o STF já afirmou que são constitucionais normas que instituem benefícios em favor de grupos sociais desfavorecidos. Isso porque, neste caso, o que está buscando é a realização da igualdade material.

No entanto, uma lei estadual que conceda isenção para servidores públicos estaduais não atende o princípio da igualdade nem em seu sentido formal e muito menos no sentido material.

Ao contrário. Essa lei se mostra discriminatória porque, de forma anti-isonômica, favorece uma categoria que já recebe remuneração em detrimento de um grupo de pessoas que, por insuficiência de recursos, não conseguiria arcar com os custos da inscrição, restringindo, consequentemente, o acesso à via do concurso público.

O argumento apresentado pela Assembleia Legislativa foi o de que o tratamento diferenciado teria por objetivo oferecer ao servidor público estadual um incentivo para que permaneça nessa condição, invocando-se como fim último da norma a concretização do princípio da eficiência. Todavia, esse tratamento desigual não se justifica à luz do ordenamento constitucional, além de não haver correlação lógica entre o fator de discriminação escolhido e o tratamento desigual estipulado pela norma.

O tratamento desigual só se justifica quando o critério de distinção escolhido é legítimo e tem a finalidade de colocar os indivíduos eventualmente em desvantagem no mesmo patamar que os demais, a fim de promover os relevantes valores consagrados no texto constitucional.

No caso das leis impugnadas, mesmo que a isenção da taxa de inscrição tenha conferido tratamento uniforme a todos os servidores públicos no âmbito do Estado, não se pode olvidar que eles compõem a única categoria favorecida pela norma.

Além disso, o fato de que o tratamento díspare estabelecido entre servidores públicos e outros que não o são não tem a finalidade de franquear o acesso à via concursal àqueles que estão em situação de hipossuficiência econômica, ou, ainda, aos que encontram menos oportunidades no mercado de trabalho. Ao contrário, como declarado, pretende-se com tal medida incentivar os servidores estaduais a se manter nos quadros de pessoal do Estado, esperando-se, com isso, alcançar eficiência na atividade administrativa.

Ao conceder a isenção a uma categoria que teria condições de arcar com os custos da inscrição no certame, o Estado amplia a desvantagem daqueles que, por insuficiência de recursos, não conseguem pagar tal quantia – e, portanto, não têm sequer a chance de concorrer por um cargo na administração estadual –, restringindo, consequentemente, o acesso à via do concurso público.

É por meio do concurso público que a Administração seleciona os melhores candidatos para servi-la, realizando os princípios da isonomia, da impessoalidade e do amplo acesso aos cargos e empregos públicos.

Logo, nada mais natural que se exigir que a porta de entrada para o concurso público seja igualmente acessível a todos os cidadãos, sendo válidas as medidas que fomentem essa igualdade de acesso, e não as que ampliem a desigualdade entre os possíveis candidatos.

 

Em suma:

É inconstitucional lei estadual que isenta servidores públicos da taxa de inscrição em concursos públicos promovidos pela Administração Pública local, privilegiando, sem justificativa razoável para tanto, um grupo mais favorecido social e economicamente.

STF. Plenário. ADI 5818/CE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, redator do acórdão Min. Dias Toffoli, julgado em 13/5/2022 (Info 1054).

STF. Plenário. ADI 3918/SE, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 13/5/2022 (Info 1054).

 

Duas leis previam esse benefício e foram declaradas inconstitucionais

Com base nesse entendimento, o Plenário do STF, por maioria, julgou procedentes as ações diretas para declarar a inconstitucionalidade:

i) do parágrafo único do art. 4º da Lei nº 11.449/88, inserido pela Lei nº 11.551/89, do Estado do Ceará; e

ii) do art. 6º, III, “d”, da Lei nº 2.778/89, do Estado do Sergipe.


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