sábado, 27 de maio de 2023

Em embargos de terceiro extintos sem resolução do mérito por ausência de interesse processual, aplica-se o Tema 1076, impondo-se o arbitramento de honorários ao patrono do vencedor no percentual de 10% a 20% sobre o valor atualizado da causa

TEMA 1076

Para entender o que decidiu o STJ, é necessário explicar novamente o que foi decidido no Tema 1076.

 

Imagine a seguinte situação hipotética:

A empresa “ABC” Ltda ajuizou ação de cobrança contra a empresa “XYZ” Ltda cobrando R$ 1 milhão.

O juiz julgou o pedido improcedente, reconhecendo a prescrição.

A sentença condenou a empresa autora a pagar honorários advocatícios em favor do advogado da empresa ré no valor de apenas R$ 10 mil. O magistrado argumentou o seguinte:

- normalmente, a condenação em honorários advocatícios é fixada segundo os critérios do art. 85, § 2º do CPC:

Art. 85 (...)

§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

I - o grau de zelo do profissional;

II - o lugar de prestação do serviço;

III - a natureza e a importância da causa;

IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

 

- ocorre que, se eu aplicasse esse dispositivo no caso concreto, os honorários seriam fixados entre 10% e 20% sobre R$ 1 milhão, ou seja, o advogado receberia entre R$ 100 mil a R$ 200 mil;

- esse valor seria muito alto para uma causa que foi resolvida de forma simples com o reconhecimento da prescrição;

- desse modo, como o valor da causa é muito elevado (R$ 1 milhão), os honorários devem ser fixados por apreciação equitativa, aplicando-se por analogia o art. 85, § 8º do CPC:

Art. 85 (...)

§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.

 

- fazendo uma apreciação equitativa, entendo que R$ 10 mil é um valor razoável para o trabalho do advogado.

O STJ concorda com o argumento do magistrado nesse caso hipotético acima narrado?

NÃO.

 

Se a condenação não envolver a Fazenda Pública, a regra geral é a do § 2º do art. 85

Se a condenação não envolver a Fazenda Pública, como regra, os honorários advocatícios deverão ser fixados de acordo com os critérios do § 2º do art. 85.

Desse modo, o § 2º do art. 85 do CPC/2015 traz uma regra geral e obrigatória. 

A regra geral e obrigatória é a de que os honorários sucumbenciais devem ser fixados no patamar de 10% a 20%. Esse percentual deverá incidir:

• 1ª opção: sobre o valor da condenação;

• 2ª opção: sobre o proveito econômico objetivo; ou

• 3ª opção: sobre o valor atualizado da causa (caso não seja possível mensurar o proveito econômico).

 

Se a condenação envolver a Fazenda Pública, a regra geral é a do § 3º do art. 85

Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º do art. 85, com os percentuais do § 3º.

 

Aplicação da regra de equidade do § 8º do art. 85 do CPC é excepcional

O CPC somente autoriza a aplicação do § 8º do art. 85 (apreciação equitativa do juiz) nas seguintes situações excepcionais:

1) se o proveito econômico for inestimável;

2) se o proveito econômico for irrisório; ou

3) se o valor da causa for muito baixo.

 

O Enunciado nº 6 da I Jornada de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF é nesse sentido: “A fixação dos honorários de sucumbência por apreciação equitativa só é cabível nas hipóteses previstas no § 8º, do art. 85 do CPC”.

Confira novamente a redação do dispositivo:

Art. 85 (...)

§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.

 

Veja que o CPC não permite que se aplique o § 8º do art. 85 nos casos em que o valor da condenação, o valor da causa ou o valor do proveito econômico forem elevados. Não existe essa previsão no § 8º acima transcrito.

Logo, não cabe ao Poder Judiciário, ainda que sob o manto da proporcionalidade e razoabilidade, reduzir a aplicabilidade do dispositivo legal em comento, decorrente de escolha legislativa explicitada com bastante clareza.

 

O que significa proveito econômico “inestimável”? Poderíamos enquadrar nessa previsão o proveito econômico muito elevado?

NÃO. Quando o § 8º do art. 85 menciona proveito econômico “inestimável”, ele está se referindo àquelas causas em que não é possível atribuir um valor patrimonial à lide. Exemplos: nas demandas ambientais ou nas ações de família. Não se deve, portanto, confundir “valor inestimável” com “valor elevado”.

 

O § 3º do art. 85 do CPC/2015 teve por objetivo superar o antigo entendimento jurisprudencial

Antes do CPC/2015, o STJ possuía jurisprudência firmada no sentido de que deveriam ser aplicados honorários por equidade quando a Fazenda Pública fosse vencida, o que se fazia com base no art. 20, § 4º, do CPC revogado.

Esse § 3º do art. 85 teve a intenção de superar esse antigo posicionamento jurisprudencial.

Vale ressaltar que o fato de a nova legislação ter surgido como uma reação capitaneada pelas associações de advogados à postura dos tribunais de fixar honorários em valores irrisórios, quando a demanda tinha a Fazenda Pública como parte, não torna a norma inconstitucional nem autoriza o seu descarte.

Além disso, há que se ter em mente que o entendimento do STJ fora firmado sob a égide do CPC revogado. É perfeitamente legítimo ao Poder Legislativo editar nova regulamentação legal em sentido diverso do que vinham decidindo os tribunais. Cabe aos tribunais interpretar e observar a lei, não podendo, entretanto, descartar o texto legal por preferir a redação dos dispositivos decaídos. A atuação do legislador que acarreta a alteração de entendimento firmado na jurisprudência não é fenômeno característico do Brasil, sendo conhecido nos sistemas de common law como overriding.

 

Art. 8º do CPC não autoriza que se aplique a equidade na fixação dos honorários fora das hipóteses legais

O art. 8º do CPC prevê o seguinte:

Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.

 

Havia algumas vozes defendendo que esse dispositivo poderia ser invocado para se aplicar a equidade nos casos em que os honorários fossem fixados em valores muito altos.

O STJ não concordou com essa argumentação.

Não se pode alegar que o art. 8º do CPC permita que o juiz afaste o art. 85, §§ 2º e 3º, com base na razoabilidade e proporcionalidade, quando os honorários resultantes da aplicação dos referidos dispositivos forem elevados.

O CPC/2015, preservando o interesse público, estabeleceu disciplina específica para a Fazenda Pública, traduzida na diretriz de que quanto maior a base de cálculo de incidência dos honorários, menor o percentual aplicável. O julgador não tem a alternativa de escolher entre aplicar o § 8º ou o § 3º do art. 85, mesmo porque só pode decidir por equidade nos casos previstos em lei, conforme determina o art. 140, parágrafo único, do CPC/2015:

Art. 140. (...)

Parágrafo único. O juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei.

 

Mas e se a causa foi mais “simples” e demandou “pouco” trabalho do advogado?

O argumento de que a simplicidade da demanda ou o pouco trabalho exigido do causídico vencedor levariam ao seu enriquecimento sem causa, deve ser utilizado não para respaldar apreciação por equidade, mas sim para balancear a fixação do percentual dentro dos limites do art. 85, § 2º, ou dentro de cada uma das faixas dos incisos contidos no § 3º do referido dispositivo.

Assim, se a causa foi mais “simples”, o juiz fixará no percentual mínimo, no entanto, desde que dentro das faixas previstas nos §§ 2º e 3º do art. 85.

Desse modo, a suposta baixa complexidade do caso não pode ser considerada como elemento para afastar os percentuais previstos na lei. Esse dado já foi levado em consideração pelo legislador, que previu “a natureza e a importância da causa” como um dos critérios para a determinação do valor dos honorários (art. 85, § 2º, III, do CPC), limitando, porém, a discricionariedade judicial a limites percentuais.

Assim, se tal elemento já é considerado pelo suporte fático abstrato da norma, não é possível utilizá-lo como se fosse uma condição extraordinária, a fim de afastar a incidência da regra.

Idêntico raciocínio se aplica à hipótese de trabalho reduzido do advogado vencedor, uma vez que tal fator é considerado no suporte fático abstrato do art. 85, § 2º, IV, do CPC/2015 (“o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço”).

 

Valor dos honorários deve ser analisado antes de se ajuizar a demanda e serve como desestímulo contra lides temerárias

Cabe ao autor - quer se trate do Estado, das empresas, ou dos cidadãos - ponderar bem a probabilidade de ganhos e prejuízos antes de ajuizar uma demanda, sabendo que terá que arcar com os honorários de acordo com o proveito econômico ou valor da causa, caso vencido. O valor dos honorários sucumbenciais, portanto, é um dos fatores que deve ser levado em consideração no momento da propositura da ação.

É muito comum ver no STJ a alegação de honorários excessivos em execuções fiscais de altíssimo valor posteriormente extintas. Ocorre que tais execuções muitas vezes são propostas sem maior escrutínio, dando-se a extinção por motivos previsíveis, como a flagrante ilegitimidade passiva, o cancelamento da certidão de dívida ativa, ou por estar o crédito prescrito. Ou seja, o ente público aduz em seu favor a simplicidade da causa e a pouca atuação do causídico da parte contrária, mas olvida o fato de que foi a sua falta de diligência no momento do ajuizamento de um processo natimorto que gerou a condenação em honorários. O Poder Judiciário não pode premiar tal postura.

A fixação de honorários por equidade nessas situações - muitas vezes aquilatando-os de forma irrisória - apenas contribui para que demandas frívolas e sem possibilidade de êxito continuem a ser propostas diante do baixo custo em caso de derrota.

O art. 20 da LINDB (Decreto-Lei nº 4.657/1942), incluído pela Lei nº 13.655/2018, prescreve que, “nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão”. Como visto, a consequência prática do descarte do texto legal do art. 85, §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 8º, do CPC, sob a justificativa de dar guarida a valores abstratos como a razoabilidade e a proporcionalidade, será um poderoso estímulo comportamental e econômico à propositura de demandas frívolas e de caráter predatório.

 

O STJ estabeleceu essas premissas no Tema 1076, tendo sido fixada a seguinte tese:

I) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do art. 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor:

a) da condenação; ou

b) do proveito econômico obtido; ou

c) do valor atualizado da causa.

II) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação:

a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou

b) o valor da causa for muito baixo.

STJ. Corte Especial. REsp 1.850.512-SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 16/03/2022 (Recurso Repetitivo – Tema 1076) (Info 730).

 

TENTATIVA DE DISTINGUISHING

Imagine a seguinte situação hipotética:

João faleceu e deixou como herança um imóvel.

O inventário judicial foi iniciado.

A empresa Alfa opôs embargos de terceiro, alegando ser a proprietária do imóvel deixado por João.

O juiz da Vara de Família e Sucessões suspendeu a partilha.

O espólio de João interpôs agravo de instrumento contra essa decisão, argumentando que os embargos deveriam ser liminarmente rejeitados, uma vez que a empresa embargante não teria legitimidade para figurar como terceiro no processo de inventário considerando que não é herdeira nem tem crédito constituído.

O Tribunal de Justiça deu provimento ao agravo de instrumento para reconhecer a ausência interesse processual e, consequentemente, julgou extintos os embargos de terceiro sem resolução do mérito. Para o TJ, o Juízo de origem não produziu qualquer ato que recaísse sobre o imóvel, inexistindo, portanto, constrição judicial ou ameaça ao bem, o que inviabiliza a interposição de embargos de terceiro.

Como consectário da rejeição dos embargos, o TJ condenou a empresa Alfa ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC.

Vale ressaltar que o valor atualizado da causa é de R$ 20 milhões, de forma que os honorários foram fixados em R$ 2 milhões.

A empresa Alfa interpôs recurso especial pedindo que os honorários fossem fixados com base equidade, nos termos do art. 85, § 8º, do CPC/2015:

Art. 85 (...)

§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.

 

A empresa argumentou que se tratou de uma demanda simples, tendo os embargos tramitado durante apenas três meses. Logo, a condenação em honorários advocatícios tão vultosos seria desproporcional e injusta.

A recorrente argumentou, resumidamente, o seguinte:

- não desconheço que o STJ, no Tema 1076,  fixou a tese segundo a qual a fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando o valor da causa for elevado;

- no entanto, essa tese não deve ser aplicada no caso dos autos, haja vista que geraria condenação desproporcional e injusta, considerando o valor da verba em relação ao trabalho efetivamente desempenhado pelo patrono dos requeridos;

- o art. 85, § 2º, do CPC/2015, ao fixar honorários advocatícios mínimos de 10% sobre o valor da causa, teve em vista as decisões judiciais que apreciassem a causa por completo. Decisões que, com ou sem julgamento de mérito, abrangessem a totalidade das questões submetidas a Juízo;

- na espécie, por se tratar de julgamento fundado no art. 485 do CPC/2015, os honorários devem observar proporcionalmente a matéria efetivamente apreciada;

- logo, é precisa fazer um distinguishing em relação ao caso concreto.

 

No caso concreto, o Conselho Federal da OAB pediu para intervir no recurso especial atuando como amicus curiae. O STJ admitiu essa intervenção?

NÃO.

Não se justifica a intervenção do Conselho Federal da OAB para atuar como amicus curiae em processos nos quais é discutido o valor da verba honorária advocatícia sucumbencial. Nesse sentido:

A intervenção de amicus curiae nas ações de natureza subjetiva é excepcional, justificando-se em hipóteses nas quais seja identificada uma multiplicidade de demandas similares, a indicar a generalidade do tema discutido, devendo ficar demonstrado que a intervenção tem como finalidade colaborar com a Corte e defender interesse público relevante, objetivos que não restam demonstrados no caso. A fixação dos honorários advocatícios depende das características próprias de cada demanda.

STJ. 3ª Turma. EDcl no REsp 1.645.719/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 22/5/2018.

 

Vamos agora ao mérito recursal. O STJ acolheu os argumentos da Alfa, empresa recorrente?

NÃO.

A posição atual do STJ é no sentido de que a fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados.

Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação:

a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou

b) o valor da causa for muito baixo.

Antes de 2019, o STJ não entendia assim.

No julgamento do REsp 1.746.072/PR, o STJ deu o primeiro sinal concreto de que poderia mudar a sua histórica orientação a respeito da possibilidade de fixação equitativa de honorários advocatícios quando a fixação rígida resultasse em verba demasiadamente vultosa. Na ocasião, ficou assentado que:

Os honorários advocatícios só podem ser fixados com base na equidade de forma subsidiária, ou seja:

• quando não for possível o arbitramento pela regra geral; ou

• quando for inestimável ou irrisório o valor da causa.

Assim, o juízo de equidade na fixação dos honorários advocatícios somente pode ser utilizado de forma subsidiária, quando não presente qualquer hipótese prevista no § 2º do art. 85 do CPC.

STJ. 2ª Seção. REsp 1746072-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Raul Araújo, julgado em 13/02/2019 (Info 645).

 

Cerca de três anos depois, essa sinalização inicial se concretizou em forma de precedente vinculante, quando, então, a Corte Especial do STJ julgou o Tema 1076, em acórdãos publicados em 31/5/2022.

No julgamento do Tema 1076, houve intenso debate acerca da desproporcionalidade, irrazoabilidade, necessidade de conformação constitucional e injustiça. O entendimento foi fixado fundando-se naquilo que havia de mais profundo e moderno na doutrina da sociologia jurídica, da filosofia jurídica, da teoria da constituição e da teoria geral do direito.

 

Mas no caso concreto acima mencionado os embargos de terceiro foram extintos sem resolução do mérito. Isso não serve como distinguishing para diferenciar do que foi decidido Tema 1076?

NÃO. O fato de a ação ser extinta sem resolução de mérito já foi expressamente considerado no precedente. A Corte Especial, no julgamento do Tema 1076, analisou também essa hipótese e afirmou que o entendimento seria aplicável também nesse caso.

“A técnica de distinção é basicamente uma forma de verificar se existem diferenças relevantes entre dois casos ao ponto de se afastar a aplicação de precedente invocado por uma das partes ou pelo magistrado. Quando um dos sujeitos processuais argumenta com base em um precedente, que, de acordo com ele, aplica-se ao caso concreto, deverá demonstrar a similitude fática dos casos. A parte contrária, por sua vez, caso discorde, deverá demonstrar que existem fatos relevantes que impedem a sua aplicação.” (PEIXOTO, Ravi. O sistema de precedentes desenvolvido pelo CPC/2015: uma análise sobre a adaptabilidade da distinção (distinguishing) e da distinção inconsistente (inconsistente distinguishing) in Revista de Processo: RePro, ano 40, vol. 248, São Paulo: Revista dos Tribunais, out. 2015, p. 341/343).

Assim, a distinção (distinguishing) - que permite que os órgãos fracionários se afastem de um precedente vinculante firmado no julgamento de recursos especiais submetidos ao rito dos repetitivos somente poderá existir diante de uma hipótese fática diferente daquela considerada relevante para a formação do precedente.

Não se deve, portanto, reconhecer a existência de uma distinção entre o precedente firmado no Tema 1076 e a hipótese em exame, de modo a impor-se solução jurídica diversa, razão pela qual é preciso dar balizas exatas ao que se deve compreender como distinguishing. Quanto a esse ponto:

“Ao contrário do que ocorre na revogação de precedentes, a diferenciação de casos pode ser realizada por qualquer magistrado, não existindo problemas atinentes à competência, havendo a possibilidade de distinção de um precedente do STF por um juiz de primeiro grau. É uma espécie de técnica que visa o afastamento de um precedente não por ele ser injusto, mas simplesmente por não se adequar à situação fática”. (PEIXOTO, Ravi. idem.)

 

Não há que se falar em distinção pela injustiça, pela desproporcionalidade, pela irrazoabilidade, pela falta de equidade ou pela existência de outros julgados do Supremo Tribunal Federal que não se coadunariam com o precedente, pois tais circunstâncias importariam na eventual necessidade de superação do precedente, mas não no uso da técnica de distinção, que é lícito fazer, quando de sua aplicabilidade prática, mas desde que presente uma circunstância fática distinta. Tais circunstâncias, quando muito, importariam na eventual necessidade de superação do precedente, mas jamais no uso da técnica de distinção que se pode fazer quando de sua aplicabilidade prática, desde que presente uma circunstância fática distinta.

Assim, o art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, deverá ser aplicado, de forma literal, pelos órgãos fracionários do STJ se e enquanto não sobrevier modificação desse entendimento pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 1.412.073/SP, do RE 1.412.074/SP e do RE 1.412.069/PR, todos em tramitação perante o Supremo Tribunal Federal, ou se e enquanto não sobrevier, no STJ, a eventual superação do precedente formado no julgamento do Tema 1076.

 

Em suma:

A circunstância de a ação ter sido extinta sem resolução de mérito, conquanto se trate de uma situação de fato, não é suficientemente relevante para aplicar distinguishing em relação ao precedente firmado no julgamento do Tema 1076, especialmente porque essa circunstância fática também estava presente em dois dos recursos representativos daquela controvérsia e, ainda assim, a Corte Especial compreendeu se tratar de hipótese em que a regra do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, igualmente deveria ser aplicada de maneira literal.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.743.330-AM, Rel. Min. Moura Ribeiro, Rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 11/04/2023 (Info 771).

 

Assim, em embargos de terceiro extintos sem resolução do mérito por ausência de interesse processual, aplica-se o Tema repetitivo 1076, impondo-se o arbitramento de honorários advocatícios sucumbenciais ao patrono do vencedor no percentual de 10 a 20% sobre o valor atualizado da causa.


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