quinta-feira, 16 de março de 2023

O teto mínimo para ajuizamento de execução fiscal é igual a 5 vezes o valor máximo que o Conselho poderia cobrar de anuidade, não importando que se tenha fixado um valor menor

 

EXPLICANDO O VALOR MÍNIMO NECESSÁRIO PARA QUE OS CONSELHOS PROFISSIONAIS AJUIZEM EXECUÇÃO FISCAL (ART. 8º DA LEI 12.514/2011)

Qual é a natureza jurídica dos Conselhos Profissionais (exs.: CREA, CRM, COREN, CRO etc.)?

Os Conselhos Profissionais possuem natureza jurídica de autarquias federais.

Exceção: a OAB que, segundo a concepção majoritária, é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro.

 

Anuidades

Os Conselhos podem cobrar um valor todos os anos dos profissionais que integram a sua categoria. A isso se dá o nome de anuidade (art. 4º, II, da Lei nº 12.514/2011).

 

Qual é a natureza jurídica dessas anuidades?

Tais contribuições são consideradas tributo, sendo classificadas como “contribuições profissionais ou corporativas”.

As anuidades devidas aos conselhos profissionais constituem contribuições de interesse das categorias profissionais e estão sujeitas a lançamento de ofício, o qual apenas se aperfeiçoa com a notificação do contribuinte para efetuar o pagamento do tributo e o esgotamento das instâncias administrativas, em caso de recurso, sendo necessária a comprovação da remessa da intimação.

STJ. 2ª Turma. AgInt no AREsp 1689783/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 26/10/2020.

 

Fato gerador

O fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício (art. 5º da Lei nº 12.514/2011).

 

 

Execução fiscal

Como a anuidade é um tributo e os Conselhos profissionais são autarquias, em caso de inadimplemento, o valor devido é cobrado por meio de uma execução fiscal.

 

Competência

A execução fiscal, nesse caso, é de competência da Justiça Federal, tendo em vista que os Conselhos são autarquias federais (Súmula 66 do STJ).

 

Lei nº 12.514/2011 fixou valor mínimo para ajuizamento da execução

O volume de inadimplência nesses Conselhos profissionais é muito alto, o que fazia com que fossem ajuizadas, anualmente, milhares de execuções fiscais, a maioria referente a pequenos valores, abarrotando a Justiça Federal. Além disso, o custo do processo judicial muitas vezes era superior ao crédito perseguido por meio da execução.

Pensando nisso, o legislador editou a Lei nº 12.514/2011, trazendo uma restrição de valor para que o Conselho possa ajuizar a execução fiscal cobrando as anuidades em atraso. Veja a redação do art. 8º, que foi recentemente alterado pela Lei nº 14.195/2021:

Art. 8º Os Conselhos não executarão judicialmente dívidas, de quaisquer das origens previstas no art. 4º desta Lei, com valor total inferior a 5 (cinco) vezes o constante do inciso I do caput do art. 6º desta Lei, observado o disposto no seu § 1º. (Redação dada pela Lei nº 14.195, de 2021)

 

Art. 4º Os Conselhos cobrarão:

I - multas por violação da ética, conforme disposto na legislação;

II - anuidades; e

III - outras obrigações definidas em lei especial.

 

Art. 6º As anuidades cobradas pelo conselho serão no valor de:

I - para profissionais de nível superior: até R$ 500,00 (quinhentos reais);

(...)

§ 1º Os valores das anuidades serão reajustados de acordo com a variação integral do Índice Nacional de Preços ao Consumidor - INPC, calculado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, ou pelo índice oficial que venha a substituí-lo.

 

Desse modo, o art. 8º da Lei acima referida traz uma nova condição para que os Conselhos profissionais ajuízem execuções fiscais: o total da quantia executada deverá ser, no mínimo, cinco vezes o valor máximo da anuidade.

Vale ressaltar que no valor correspondente a 5 anuidades no ano do ajuizamento computam-se também as multas, juros e correção monetária, e não apenas a quantidade de parcelas em atraso. Assim, o processamento da execução fiscal fica desautorizado somente quando os débitos exequendos correspondam a menos de 5 vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente, tomando-se como parâmetro para definir este piso o valor máximo da anuidade referente ao ano de ajuizamento, bem como os encargos legais (multa, juros e correção monetária).

Vale frisar que, mesmo não podendo ajuizar a execução, os Conselhos poderão tomar outras medidas contra o inadimplente:

Art. 8º (...)

§ 1º O disposto no caput deste artigo não obsta ou limita a realização de medidas administrativas de cobrança, tais como a notificação extrajudicial, a inclusão em cadastros de inadimplentes e o protesto de certidões de dívida ativa.  (Incluído pela Lei nº 14.195, de 2021)

 

 

O art. 8º trata somente de execuções fiscais cobrando anuidades?

NÃO. O art. 8º disciplina a execução fiscal proposta pelos Conselhos para cobrança das dívidas de:

I - multas por violação da ética, conforme disposto na legislação;

II - anuidades; e

III - outras obrigações definidas em lei especial.

 

 

O TETO MÍNIMO PARA AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL NÃO DEPENDE DO EFETIVO VALOR ESTABELECIDO COMO ANUIDADE PELOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL

Imagine a seguinte situação hipotética:

Durante fiscalização realizada em Santa Catarina, um fiscal do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia – CREA/SC constatou que estava sendo realizada uma obra de engenharia (construção de um edifício) executada por empresa que não tinha registro no conselho profissional.

Em razão desse fato, a empresa foi autuada e multada.

Como a multa não foi paga, o CREA/SC ajuizou execução fiscal contra a empresa na Justiça Federal.

Na ocasião, o valor do débito, acrescido de juros e correção, totalizava R$ 3.426,84.

O Juiz Federal extinguiu a execução por ausência de interesse de agir.

O magistrado explicou na sentença que o art. 6º, I e §1º, da Lei nº 12.514/2011 estabelece que o valor máximo da anuidade dos conselhos será de R$ 500,00, corrigido pelo INPC:

Art. 6º As anuidades cobradas pelo conselho serão no valor de:

I - para profissionais de nível superior: até R$ 500,00 (quinhentos reais);

(...)

§ 1º Os valores das anuidades serão reajustados de acordo com a variação integral do Índice Nacional de Preços ao Consumidor - INPC, calculado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, ou pelo índice oficial que venha a substituí-lo.

 

Já o art. 8º da Lei nº 12.514/2011 estabelece como valor mínimo para propositura de execução fiscal o montante correspondente a cinco vezes o valor estabelecido no dispositivo legal anteriormente citado (5x R$500,00 corrigidos pelo INPC).

À época da sentença (maio/2022), esse piso correspondia a R$ 4.729,25 (o teto para a anuidade, corrigido, seria de R$ 945,85; logo, 5 x R$ 945,85 = 4.729,25).

Assim, como o valor da execução (R$3.426,84) seria inferior a esse piso (R$ 4.729,25), o magistrado concluiu que a execução não poderia prosseguir.

O CREA/SC não concordou e interpôs apelação, alegando que o valor de R$500,00 previsto no art. 6º, I, da Lei nº 12.514/2011 seria o teto (valor máximo) da anuidade. Ocorre que, cada Conselho, no exercício de sua autonomia, pode fixar um valor menor para a sua anuidade, desde que observado o teto de R$500,00, corrigido pelo INPC.

Assim, a interpretação a ser dada ao art. 8º da Lei nº 12.514/2011 (mínimo para execução fiscal) deveria ser no sentido de que o Conselho pode executar o valor da anuidade efetivamente cobrada pelo conselho multiplicada por cinco.

Como o valor da anuidade estipulada pelo CONFEA (Conselho Federal), à época da propositura da execução fiscal, era de R$ 577,11, o teto para execução fiscal deveria ser cinco vezes esse valor, ou seja, R$ 2.885,55, inferior, portanto, ao valor da execução fiscal.

O TRF4 negou provimento ao recurso e manteve a sentença.

O CREA/SC interpôs recurso especial.

 

O STJ concordou com os argumentos do CREA/SC?

NÃO.

Como vimos acima, o art. 8º da Lei nº 12.514/2011 prevê uma restrição de valor para que o Conselho Profissional possa ajuizar a execução fiscal cobrando as anuidades em atraso:

Art. 8º Os Conselhos não executarão judicialmente dívidas, de quaisquer das origens previstas no art. 4º desta Lei, com valor total inferior a 5 (cinco) vezes o constante do inciso I do caput do art. 6º desta Lei, observado o disposto no seu § 1º. (Redação dada pela Lei nº 14.195, de 2021)

 

O teto mínimo para ajuizamento de execução fiscal pelos Conselhos Profissionais corresponde a 5 vezes o valor máximo que pode ser cobrado a título de anuidade. Ex: se o valor máximo que pode ser cobrado de anuidade for R$ 1.000,00, o valor mínimo para ser permitida a execução fiscal será R$ 5.000,00.

Se o Conselho Profissional, no caso concreto, decide fixar a anuidade em R$ 800,00 (mesmo sendo possível R$ 1.000,00), o teto mínimo para ajuizamento da execução fiscal continuará sendo R$ 5.000,00 (e não R$ 4.000,00, correspondente a 5 x R$ 800,00).

O teto mínimo para ajuizamento de execução fiscal independe do valor estabelecido pelos Conselhos de fiscalização profissional, pois o legislador optou pelo valor fixo do art. 6º, I, da Lei nº 12.514/2011.

O pleito para que o montante a ser considerado como limite mínimo para ajuizamento de execução fiscal seja de cinco vezes o valor definido por cada conselho profissional para a cobrança de anuidades - até o limite máximo constante do inciso I do art. 6º da Lei nº 12.514/2011, deve ser rejeitado por contrariar a literalidade do disposto no art. 8º, caput, da Lei nº 12.514/2011, com redação dada pela Lei nº 14.195/2021, que é explícito ao se referir ao “valor total inferior a 5 (cinco) vezes o constante do inciso I do caput do art. 6º desta Lei”, em vez de referir-se ao “valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente”, tal como estabelecia o mesmo dispositivo, em sua redação original.

 

Em suma:

O teto mínimo para ajuizamento de execução fiscal independe do valor estabelecido como anuidade pelos Conselhos de fiscalização profissional.

STJ. 2ª Turma. REsp 2.043.494-SC, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 14/2/2023 (Info 764).

 


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