sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

Não é possível assegurar, na via administrativa, o direito à restituição do indébito tributário reconhecido por decisão judicial

Imagine a seguinte situação hipotética:

A empresa Alfa Ltda paga, desde 2011, uma taxa (tributo) cobrada pela União.

Em 2018, o STF reconheceu que essa taxa é inconstitucional.

Com fundamento nesse julgado, a empresa impetrou mandado de segurança pedindo:

a) para que seja declarado que a impetrante não tem obrigação jurídica de recolher a referida taxa; e

b) que seja reconhecido seu direito de obter a restituição administrativa dos valores indevidamente pagos nos últimos cinco anos.

 

O juiz federal concedeu a segurança nos termos pleiteados, sendo essa decisão confirmada pelo TRF3.

O TRF3 reconheceu a possibilidade de restituição administrativa de indébito tributário reconhecido judicialmente, consignando que a hipótese não representa ofensa ao art. 100, da CF/88, por não se tratar de sentença de repetição/restituição de indébito, nem de execução por título judicial.

A União não concordou e interpôs recurso extraordinário. A Fazenda Nacional sustentou que a restituição administrativa dos valores pagos viola frontalmente o art. 100 da Constituição Federal, que trata do regime de precatórios.

A União explicou que as causas de restituição de indébito tributário envolvem, não raras vezes, milhões de reais e que eventual determinação para restituição administrativa desses valores comprometeria o planejamento orçamentário da Fazenda Pública, desrespeitaria o regime cronológico de preferências fixadas pela Constituição Federal, além de afastar o tratamento igualitário entre os cidadãos.

Além disso, ao inaugurar novas exceções ao regime de precatórios, como o caso presente, estar-se-ia criando um perigoso precedente que poderia comprometer a ordem orçamentária dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios.

 

O STF concordou com os argumentos da União?

SIM.

Ao reconhecer o direito do impetrante à restituição administrativa do indébito tributário nos autos do mandado de segurança, o acórdão do TRF divergiu da firme jurisprudência do STF que se orienta no sentido de que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em decorrência de pronunciamentos jurisdicionais devem ser realizados por meio da expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, nos termos do art. 100 da Constituição da República:

Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

 

Nesse sentido:

(...) 1. O Tribunal de Origem, em sede de mandado de segurança, assentou ter a impetrante direito à restituição administrativa do indébito tributário reconhecido judicialmente na demanda, sem a observância do regime de precatórios.

2. Ao assim decidir, a Corte a Quo divergiu da orientação da Suprema Corte de que os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas em razão de decisão judicial devem se dar mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, nos termos do art. 100 da Constituição Federal. Precedentes.

3. Agravo regimental e recurso extraordinário providos, assentando-se que a restituição do pagamento indevido, decorrente de decisão em sede de mandado de segurança, se dê mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o caso.

STF. 1ª Turma. ARE 1.387.512-AgR/RS, Red. p/ acórdão Min. Dias Toffoli, DJe 08/11/2022.

 

Em suma:

A restituição de indébito tributário reconhecido na via judicial não pode ser efetivada administrativamente, eis que deve plena observância ao regime constitucional de precatórios (art. 100, da CF/88).

Os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em decorrência de pronunciamentos jurisdicionais devem ser realizados por meio da expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação.

 

Tese fixada pelo STF:

Não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal.

STF. Plenário. RE 1.420.691/SP, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 21/8/2023 (Repercussão Geral - Tema 1262) (Info 1108).

 

DOD Plus – entendimento do STJ está superado

O STJ possuía decisões em sentido contrário ao que foi explicado acima:

É possível assegurar, na via administrativa, o direito à restituição do indébito tributário reconhecido por decisão judicial em mandado de segurança.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.951.855-SC, Rel. Min. Manoel Erhardt (Desembargador convocado do TRF da 5ª Região), julgado em 08/11/2022 (Info 756).

 

Vale ressaltar, contudo, que o STJ já se adaptou e passou a seguir a orientação do STF fixada no Tema 1.262.


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