terça-feira, 2 de dezembro de 2025
Prints de mensagens de WhatsApp obtidos por particular, confirmados em juízo e sem indícios de manipulação, não configuram violação à cadeia de custódia
Imagine a seguinte situação
hipotética:
Ricardo e Alice tiveram um
relacionamento de três anos marcado por episódios de ciúmes e controle
excessivo por parte dele.
Após o fim do namoro, Ricardo
passou a enviar diversas mensagens ameaçadoras para Alice pelo WhatsApp,
dizendo, entre outras coisas, que se ela se envolvesse com outra pessoa, iria
“acertar as contas”.
Assustada, Alice registrou
boletim de ocorrência e apresentou à polícia os prints das mensagens, tirados
diretamente de seu celular.
Foi instaurado inquérito policial
e, posteriormente, o Ministério Público ofereceu denúncia contra Ricardo pela
prática do crime de ameaça (art. 147 do Código Penal) no contexto da Lei Maria
da Penha.
Durante o processo judicial, ela
foi ouvida em juízo e confirmou que as mensagens foram realmente enviadas por
Ricardo. O acusado não negou ter trocado as mensagens, apenas alegou que não
teve intenção de ameaçá-la.
O juiz, considerando os prints
das conversas e o depoimento firme de Alice, condenou Ricardo a 1 mês e 10 dias
de detenção por ameaça, em regime aberto, além do pagamento de R$ 5.000,00 por
danos morais.
A defesa recorreu ao Tribunal de Justiça, alegando que os
prints de WhatsApp eram provas ilícitas, pois violavam o art. 158-A do CPP, que
estabelece regras sobre cadeia de custódia de vestígios:
Art. 158-A. Considera-se cadeia
de custódia o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e
documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas
de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento
até o descarte.
Segundo a defesa, como as
capturas de tela não foram realizadas por perícia oficial e não seguiram uma
metodologia técnica adequada (como uso de hash e documentação formal da
cadeia de custódia), deveriam ser consideradas inválidas.
O Tribunal de Justiça,
entretanto, manteve a condenação, consignando que “a autenticidade das
mensagens foi confirmada pela vítima” e que “não há indícios de adulteração ou
manipulação das provas”.
Ainda inconformado, o réu
interpôs recurso especial insistindo nos argumentos de nulidade da prova.
O que decidiu o STJ? Prints
de mensagens de WhatsApp obtidos por particular, confirmados em juízo e sem
indícios de manipulação, podem ser consideradas provas válidas?
SIM.
Prints de mensagens de WhatsApp
obtidos por particular, quando não apresentam indícios de manipulação e são
confirmados em juízo, não configuram violação ao art. 158-A do CPP.
Quanto ao ponto, a jurisprudência
do STJ tem diferenciado claramente essas hipóteses:
• quando a coleta é realizada por
autoridade policial, exige-se rigor técnico-metodológico;
• quando realizada por particular
e confirmada em juízo, sem indícios de adulteração, não há que se falar em
violação à cadeia de custódia.
Além disso, tratando-se de crime
praticado no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, a
palavra da vítima possui especial relevância probatória, mormente quando
coerente e corroborada por outros elementos de prova.
Nesse sentido, conforme a
Jurisprudência em Teses n. 231 do Superior Tribunal, publicada em março de
2024, nos julgamentos com perspectiva de gênero, a vítima de violência
doméstica deve ter seu depoimento valorado com a devida consideração ao
contexto de vulnerabilidade em que se encontra.
Assim, as provas obtidas mediante
prints de WhatsApp não configuram violação à cadeia de custódia, tendo em vista
que foram realizadas por familiar da vítima, utilizando ferramentas do próprio
aplicativo, sem qualquer manipulação indevida.
Em suma:
Prints de mensagens de WhatsApp obtidos por
particular, confirmados em juízo e sem indícios de manipulação, não configuram
violação à cadeia de custódia (art. 158-A do CPP).
A palavra da vítima em casos de violência doméstica
possui especial relevância probatória, especialmente quando corroborada por
outros elementos de prova.
STJ. 5ª
Turma. AgRg no AREsp 2.967.267-SC, Rel. Min. Messod Azulay Neto, julgado em
21/10/2025 (Info 869).
Outros julgados no mesmo sentido:
Para que se considere ilícita a prova obtida mediante print de
WhatsApp, é indispensável a comprovação de que houve a quebra da cadeia de
custódia, o que só é admissível no curso da instrução processual, momento em
que é possível, inclusive, a realização de perícia nos aparelhos eventualmente
apreendidos. STJ. Corte Especial. Inq 1.658/DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado
em 19/2/2025.
(...) As provas obtidas mediante prints de WhatsApp não
configuram violação à cadeia de custódia, tendo em vista que foram realizadas
por familiar da vítima, utilizando ferramentas do próprio aplicativo, sem
qualquer manipulação indevida. Além disso, tanto a vítima quanto o réu
confirmaram a troca de mensagens. (...)
STJ. 5ª Turma. EDcl no HC 945.157/SC, Rel. Min. Daniela
Teixeira, julgado em 4/11/2024.
A prova decorrente de print de conversa de WhatsApp é válida no
processo penal, sendo a nulidade reconhecida apenas se comprovada a quebra da
cadeia de custódia da prova.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 2.600.503/ES, Rel. Min. Antonio
Saldanha Palheiro, julgado em 17/6/2025.

