sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Súmula 662 do STJ

Presídios federais

A quase totalidade dos presídios existentes no Brasil é estadual. Com isso, mesmo as pessoas presas por conta de processos que tramitam na Justiça Federal, em regra, ficam custodiadas em presídios estaduais.

Na atualidade, existem cinco presídios federais:

• Penitenciária Federal de Catanduvas (PR);

• Penitenciária Federal de Campo Grande (MS);

• Penitenciária Federal de Porto Velho (RO);

• Penitenciária Federal de Mossoró (RN);

• Penitenciária Federal de Brasília (DF).

 

Cada penitenciária dessas possui um juiz federal corregedor, responsável pela unidade e com competências previstas em lei. Confira o que diz o art. 2º da Lei nº 11.671/2008:

Art. 2º A atividade jurisdicional de execução penal nos estabelecimentos penais federais será desenvolvida pelo juízo federal da seção ou subseção judiciária em que estiver localizado o estabelecimento penal federal de segurança máxima ao qual for recolhido o preso.

Parágrafo único. O juízo federal de execução penal será competente para as ações de natureza penal que tenham por objeto fatos ou incidentes relacionados à execução da pena ou infrações penais ocorridas no estabelecimento penal federal.

 

Base legal

A transferência e inclusão de presos em estabelecimentos penais federais são reguladas pela Lei nº 11.671/2008.

Além disso, podem ser citados outros instrumentos infralegais importantes:

• Decreto nº 6.877/2009;

• Decreto nº 6.049/2007;

• Resolução nº 557-CJF.

 

Segurança máxima

Os estabelecimentos penais federais são considerados, pela lei, como de segurança máxima.

 

Quem pode ser recolhido em presídio federal?

Poderão ser incluídos em presídio federal:

• presos provisórios ou condenados;

• presos estaduais ou federais.

 

Preso por “crime federal” ou “crime estadual”

O presídio federal pode receber tanto presos acusados e condenados por crimes de competência da Justiça Federal como da Justiça Estadual.

Desse modo, o critério para abrigar presos em estabelecimentos prisionais federais não é a competência para julgamento dos fatos por eles praticados, mas sim a necessidade de uma custódia de segurança máxima por razões ligadas à segurança pública ou do próprio preso.

 

Motivos que autorizam o recolhimento do preso em presídio federal

A lei é muito vaga quanto a isso (art. 3º), afirmando que serão recolhidos em presídios federais aqueles cuja medida se justifique por conta do interesse:

• da segurança pública; ou

• do próprio preso.

 

Art. 3º Serão incluídos em estabelecimentos penais federais de segurança máxima aqueles para quem a medida se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio preso, condenado ou provisório. (Redação dada Lei nº 13.964/2019)

 

Segundo o art. 3º do Decreto nº 6.877/2009, para a inclusão ou transferência, o preso deverá possuir, ao menos, uma das seguintes características:

• ter desempenhado função de liderança ou participado de forma relevante em organização criminosa;

• ter praticado crime que coloque em risco a sua integridade física no ambiente prisional de origem;

• estar submetido ao Regime Disciplinar Diferenciado — RDD;

• ser membro de quadrilha ou bando, envolvido na prática reiterada de crimes com violência ou grave ameaça;

• ser réu colaborador ou delator premiado, desde que essa condição represente risco à sua integridade física no ambiente prisional de origem; ou

• estar envolvido em incidentes de fuga, de violência ou de grave indisciplina no sistema prisional de origem.

 

Prazo de permanência no presídio federal

3 anos. Confira o que diz a Lei:

Art. 10.  (...)

§ 1º O período de permanência será de até 3 (três) anos, renovável por iguais períodos, quando solicitado motivadamente pelo juízo de origem, observados os requisitos da transferência, e se persistirem os motivos que a determinaram.

 

Quem tem legitimidade para pedir a inclusão do preso no Sistema Penitenciário Federal?

• Autoridade administrativa (exs.: delegado de polícia, secretário de segurança pública, secretário de justiça etc.);

• Ministério Público;

• o próprio preso.

 

A quem é endereçado o pedido de transferência para o presídio federal?

O requerimento de transferência deve ser endereçado ao juízo responsável pelo preso (juízo federal ou juízo estadual, a depender do caso), e nunca diretamente ao juiz federal corregedor da penitenciária federal.

A competência para decidir se haverá a transferência, conforme veremos mais abaixo, é uma decisão tanto do juízo de origem como do juízo federal corregedor do presídio.

 

Oitiva prévia

Após o requerimento ser recebido, é formado um processo de transferência.

O juiz deverá determinar, de imediato, que sejam ouvidas, no prazo de 5 (cinco) dias cada:

• a autoridade administrativa;

• o MP;

• a defesa; e

• o Departamento Penitenciário Nacional — DEPEN (a quem é facultado indicar o estabelecimento penal federal mais adequado).

 

Na hipótese de imprescindibilidade de diligências complementares, o juiz federal ouvirá, no prazo de 5 (cinco) dias, o Ministério Público Federal e a defesa e, em seguida, decidirá acerca da transferência no mesmo prazo.

 

É possível a transferência ou manutenção do preso em presídio federal mesmo sem a oitiva da defesa?

SIM. A Lei nº 11.671/2008 prevê que, havendo extrema necessidade, o juiz poderá autorizar a imediata transferência do preso e, após o preso estar incluído no sistema penitenciário federal, ouvir as partes interessadas e decidir pela manutenção ou revogação da medida adotada.

Desse modo, em caso de situações emergenciais, o contraditório será diferido.

 

Nesse sentido já decidiu o STF:

A transferência de preso para presídio federal de segurança máxima sem a sua prévia oitiva, desde que fundamentada em fatos caracterizadores de situação emergencial, não configura ofensa aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa, da individualização da pena e da dignidade da pessoa humana.

STF. 1ª Turma. HC 115539/RO, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 3/9/2013 (Info 718).

 

É também a posição do STJ:

Súmula 639-STJ: Não fere o contraditório e o devido processo decisão que, sem ouvida prévia da defesa, determine transferência ou permanência de custodiado em estabelecimento penitenciário federal.

 

De quem é a competência para decidir se um preso deve ou não ser incluído no Sistema Penitenciário Federal?

Inicialmente, o juízo de origem (federal ou estadual), isto é, o juízo responsável pelo preso, faz um juízo de admissibilidade sobre o requerimento de transferência.

• Se nesse juízo de admissibilidade, o pedido for indeferido: encerra-se o processo de transferência. Há possibilidade de recurso.

• Se houver concordância com o pedido: o próprio juízo de origem formulará requerimento ao juízo federal competente pelo presídio federal, encaminhando os autos do processo de transferência.

 

O juiz federal corregedor do presídio federal irá, então, decidir, de forma fundamentada, se aceita ou não o preso.

Desse modo, a inclusão dependerá de duas decisões:

• do juízo de origem (estadual ou federal, a depender do caso);

• do juízo federal corregedor do presídio.

 

O que o juízo federal corregedor do presídio analisa para decidir se haverá ou não a inclusão do preso?

Apenas a regularidade formal da solicitação.

Segundo entende o STJ:

Ao Juízo Federal não compete realizar juízo de valor sobre as razões de fato emanadas pelo Juízo solicitante, sendo-lhe atribuído pelo art. 4.º da Lei n.º 11.671/2008, tão somente, o exame da regularidade formal da solicitação.

STJ. 3ª Seção. CC 168.595/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 11/03/2020.

 

Prevalece, no Superior Tribunal de Justiça, o entendimento no sentido de que, acaso devidamente motivado pelo Juízo estadual o pedido de manutenção do preso em presídio federal, não cabe ao Magistrado Federal exercer juízo de valor sobre a fundamentação apresentada, mas apenas aferir a legalidade da medida.

STJ. 3ª Seção. AgRg no CC 169.736/RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 12/02/2020.

 

Não cabe ao Juízo Federal discutir as razões do Juízo Estadual, quando solicita a transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima, assim quando pede a renovação do prazo de permanência, porquanto este é o único habilitado a declarar a excepcionalidade da medida.

STJ. 3ª Seção. AgRg no CC 160.401/PR, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 10/04/2019.

 

O que acontece se o juízo federal corregedor do presídio não admitir a transferência do preso?

Rejeitada a transferência, o juízo de origem poderá suscitar o conflito de competência perante o tribunal competente, que o apreciará em caráter prioritário.

Enquanto não decidido o conflito de competência e sendo caso de renovação, o preso permanecerá no estabelecimento penal federal.

No julgamento dos conflitos de competência, a lei afirma que o tribunal competente (no caso, o STJ) deverá negar a transferência em caso de o presídio federal já estar com lotação máxima.

 

Quem julga esse conflito de competência?

Se o juízo de origem for

Quem julgará

 o conflito?

Juiz estadual

STJ

Juiz federal vinculado a um TRF diferente do juiz federal corregedor do presídio.

Ex.: quem solicitou foi o juiz federal do Rio de Janeiro (TRF2) e quem rejeitou foi o juiz federal de Porto Velho (TRF1).

STJ

Juiz federal vinculado ao mesmo TRF do juiz federal Corregedor do presídio.

Ex.: quem solicitou foi o juiz federal de Manaus (TRF1) e quem rejeitou foi o juiz federal de Porto Velho (TRF1).

TRF respectivo

(no exemplo dado será o TRF1)

 

Feita essa revisão, vamos agora entender a súmula a partir do seguinte caso concreto:

Alexandre, membro de conhecida organização criminosa, foi condenado e cumpre pena na Penitenciária Federal de Campo Grande/MS, considerando ter sido o responsável pelo atentado contra a Polícia de São Paulo, que vitimou um policial militar, executado com 17 tiros.

Expirado o prazo de 3 anos, Alexandre deveria sair do presídio federal e ser transferido para uma penitenciária estadual.

Ocorre que o Juízo Estadual solicitou a renovação da permanência do condenado no Sistema Penitenciário Federal argumentando que isso seria necessário para resguardar a segurança pública, haja vista sua extrema periculosidade, verificada por ele integrar organização criminosa voltada à prática reiterada de crimes violentos e, ainda, pelo fato de ele exercer forte papel de liderança sobre outros detentos.

Vale ressaltar que o magistrado estadual não apresentou fatos novos em relação ao primeiro pedido. Em outras palavras, durante o período em que o apenado permaneceu no presídio federal não aconteceu nada novo que pudesse ser mencionado no pedido de prorrogação.

O Juízo Federal concordou com o pedido do Juízo estadual e foi renovado o prazo de permanência do sentenciado na Penitenciária Federal de Campo Grande/MS.

A defesa interpôs agravo de execução alegando que não houve justificativa idônea para a renovação do prazo de permanência do condenado no presídio federal.

Para a defesa, a prorrogação da permanência do condenado no presídio federal somente poderia ser autorizada se o juízo estadual tivesse apresentado fatos novos, não sendo suficiente invocar os mesmos motivos que levaram originalmente a sua inclusão no Sistema Penitenciário Federal.

O TRF negou provimento ao recurso e a defesa impetrou habeas corpus ao STJ.

 

O STJ concordou com os argumentos da defesa? É necessário algum fato novo para que ocorra a prorrogação do prazo de permanência do condenado no presídio federal?

NÃO.

A possibilidade de renovação do período de permanência, quando solicitada motivadamente pelo juízo de origem, está prevista no art. 10, § 1º, da Lei nº 11.671/2008:

Art. 10 (...)

§ 1º O período de permanência será de até 3 (três) anos, renovável por iguais períodos, quando solicitado motivadamente pelo juízo de origem, observados os requisitos da transferência, e se persistirem os motivos que a determinaram. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)

 

Para a prorrogação do prazo de permanência no sistema federal de segurança máxima, não é imprescindível (indispensável) a ocorrência de fato novo. Para a prorrogação, basta a indicação, em decisão fundamentada, da persistência dos motivos que ensejaram a transferência inicial do preso (STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 1273391/RS, Rel. Min. Rogerio Schietti, DJe 24/10/2018).

Essa é a redação literal do dispositivo: “se persistirem os motivos que a determinaram”.

Logo, não é preciso fato novo para a manutenção da medida, bastando que a situação não tenha se alterado, ou seja, que os motivos ainda estejam presentes.

(...) 2. Na situação dos autos, o Juízo estadual apontou a necessidade de permanência do detento em presídio de segurança máxima federal. A demonstração da permanência dos fundamentos que levaram à inclusão do detento no Sistema Prisional Federal é suficiente para justificar o deferimento do pedido de prorrogação, não sendo exigida a indicação de fatos novos. (...)

STJ. 3ª Seção. AgRg no CC 197.970/PA, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 3/8/2023.


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