terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Os Correios têm o dever jurídico de motivar, em ato formal, a demissão de seus empregados



Em que consiste a estabilidade do art. 41 da CF/88?
- É a garantia constitucional
- conferida ao servidor público estatutário,
- nomeado em virtude de concurso público
- para cargo de provimento efetivo,
- de permanecer no serviço público,
- desde que tenha completado mais de três anos de efetivo exercício e
- tenha sido aprovado em avaliação especial de desempenho realizada por comissão instituída para essa finalidade.

Veja o texto constitucional:
Art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público.
(...)
§ 4º Como condição para a aquisição da estabilidade, é obrigatória a avaliação especial de desempenho por comissão instituída para essa finalidade.

Os servidores de empresas públicas e sociedades de economia mista, admitidos por concurso público, gozam da estabilidade do art. 41 da CF/88?
NÃO. A estabilidade do art. 41 da CF/88 é conferida apenas aos servidores estatutários. Os agentes públicos que atuam nas empresas públicas e sociedades de economia mista são servidores celetistas (empregados públicos). Logo, não gozam de estabilidade.

Os empregados das empresas públicas e sociedades de economia mista podem ser demitidos sem motivação?
Em 2013, o STF, ao analisar um caso envolvendo um empregado dos Correios que havia sido demitido sem motivação, decidiu que NÃO.
Em outras palavras, o STF afirmou que a conduta da empresa pública foi errada e que a ECT (Correios) tem o dever de motivar formalmente o ato de dispensa de seus empregados.
STF. Plenário. RE 589998, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/03/2013 (Info 699).

Principais argumentos para essa conclusão:
• Os servidores dos Correios, mesmo admitidos por concurso público, não gozam da estabilidade preconizada no art. 41 da CF/88. No entanto, apesar de não possuírem estabilidade, somente podem ser demitidos por meio de um procedimento formal, assegurado ao empregado o direito ao contraditório e à ampla defesa, e ao final, esta demissão deverá ser sempre motivada.
• Os Correios possuem natureza jurídica de direito privado, mas se submetem a um regime híbrido, ou seja, sujeitam-se a um conjunto de limitações que tem por objetivo a realização do interesse público.
• Explicando de outra forma, esta entidade submete-se a regras de direito privado, mas tais normas sofrem uma derrogação parcial (mitigação) em favor de certas regras de direito público.
Logo, o regime aplicável à ECT não é inteiramente privado.
• Exemplos de derrogações das normas de direito privado em favor de normas de direito público: teto remuneratório, proibição de acumulação de cargos, empregos e funções, exigência de concurso etc.
• Assim, o regime dos empregados públicos não está sujeito integralmente às regras da CLT, havendo uma derrogação (mitigação) em favor de regras de normas de direito público, dentre elas os princípios administrativos contemplados no art. 37 da CF/88.
• No caso, a motivação da demissão é justificada com base nos princípios da isonomia e impessoalidade, evitando favorecimento ou perseguição de empregados públicos.
• Além disso, como os empregados são admitidos por concurso público, não é razoável que sejam dispensados de forma imotivada, ou seja, sem que se observe um paralelismo entre a admissão e a dispensa.

Sobre o tema, vale mencionar os seguintes entendimentos do TST:
Súmula nº 390
I – O servidor público celetista da administração direta, autárquica ou fundacional é beneficiário da estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988.
II – Ao empregado de empresa pública ou de sociedade de economia mista, ainda que admitido mediante aprovação em concurso público, não é garantida a estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988.

OJ nº 247 SDI-I
I – A despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato motivado para sua validade;
II – A validade do ato de despedida do empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) está condicionada à motivação, por gozar a empresa do mesmo tratamento destinado à Fazenda Pública em relação à imunidade tributária e à execução por precatório, além das prerrogativas de foro, prazos e custas processuais.

Redação ampla da ementa
Conforme já dito, o caso concreto no qual o STF decidiu esse tema envolvia um empregado dos Correios.
Ocorre que a ementa do julgado ficou extremamente genérica, especialmente o item II. Confira:
EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – ECT. DEMISSÃO IMOTIVADA DE SEUS EMPREGADOS. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO DA DISPENSA. RE PARCIALEMENTE PROVIDO.
I - Os empregados públicos não fazem jus à estabilidade prevista no art. 41 da CF, salvo aqueles admitidos em período anterior ao advento da EC nº 19/1998. Precedentes.
II - Em atenção, no entanto, aos princípios da impessoalidade e isonomia, que regem a admissão por concurso publico, a dispensa do empregado de empresas públicas e sociedades de economia mista que prestam serviços públicos deve ser motivada, assegurando-se, assim, que tais princípios, observados no momento daquela admissão, sejam também respeitados por ocasião da dispensa.
III – A motivação do ato de dispensa, assim, visa a resguardar o empregado de uma possível quebra do postulado da impessoalidade por parte do agente estatal investido do poder de demitir.
IV - Recurso extraordinário parcialmente provido para afastar a aplicação, ao caso, do art. 41 da CF, exigindo-se, entretanto, a motivação para legitimar a rescisão unilateral do contrato de trabalho.
STF. Plenário. RE 589998, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/03/2013.

Além disso, se você ler o voto do Min. Ricardo Lewandoski, vai perceber que ele fala de forma também genérica, incluindo indistintamente todas as empresas públicas e sociedades de economia mista.
Diante disso, os livros e os professores passaram a dizer que a decisão do STF no RE 589998 valeria para todas as empresas públicas e sociedades de economia mista.

Inconformismo de outras empresas públicas e sociedades de economia mista
Ocorre que outras empresas públicas e sociedades de economia mista que exploram atividade econômica não se conformaram com isso dizendo que elas são diferentes dos Correios e que a ECT recebe tratamento muito parecido com o de Fazenda Pública, tanto que goza de imunidade tributária (STF RE 601392, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 28/02/2013).
Assim, o Banco do Brasil (sociedade de economia mista federal que explora atividade econômica) ingressou com embargos de declaração dizendo o seguinte: olha, há uma obscuridade no acórdão. Isso porque só se discutiu a questão dos Correios e a tese ficou muito genérica. Seria bom o STF esclarecer essa questão.

Decisão dos embargos
Em 2018, o STF, ao julgar os embargos de declaração, afirmou que a referida decisão (RE 589998/PI) só se aplica realmente para os Correios, considerando que o caso concreto envolvia um empregado da ECT.
Quanto às demais empresas públicas e sociedades de economia mista, o STF afirmou que ainda não decidiu o tema, ou seja, terá que ser analisado caso a caso.
Assim, por enquanto, essa decisão, ao menos formalmente, só se aplica para os Correios.
O STF retificou a tese genérica que havia fixado anteriormente e agora afirmou que:
A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) tem o dever jurídico de motivar, em ato formal, a demissão de seus empregados.
STF. Plenário. RE 589998 ED/PI, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 10/10/2018 (Info 919).




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