segunda-feira, 28 de julho de 2025
A manifestação sobre a proposta de acordo de não persecução penal deve ocorrer após o seu oferecimento, não cabendo ao réu ou ao investigado decidir quando se manifestará
Imagine a seguinte situação
hipotética:
João respondia a um processo
criminal que começou antes da criação do ANPP, ou seja, antes da Lei nº
13.964/2019 entrar em vigor.
Quando a lei passou a permitir o
ANPP, mesmo para processos antigos ainda em andamento, o Ministério Público
resolveu oferecer esse acordo para João, já com o processo em fase de recurso.
Intimado, João não disse se
aceitava ou não o acordo. Em vez disso, afirmou que só decidiria depois que o
tribunal analisasse algumas questões de nulidade suscitadas em seu recurso. Ele
queria esperar o julgamento dessas preliminares para, só então, responder sobre
o ANPP.
O STJ concordou com o
pedido de João?
NÃO.
O STJ e o STF consolidaram
entendimento no sentido de ser plenamente viável a celebração de ANPP em ações
penais que já estavam em trâmite quando entrou em vigor a Lei nº 13.964/2019,
cabendo ao Ministério Público, de ofício ou mediante provocação, na primeira
oportunidade que tiver para falar nos autos, manifestar-se de modo fundamentado
sobre a possibilidade ou não da propositura do acordo.
No caso, em atenção ao referido
entendimento, o Ministério Público Federal apresentou proposta de ANPP à parte,
que, todavia, deixou de expressar concordância, pugnando que antes de sua
manifestação fossem apreciadas pelo STJ preliminares processuais suscitadas ao
tempo do recurso especial interposto. No entanto, a pretensão não tem amparo
legal.
Isso porque, o ANPP possui a
natureza de negócio jurídico processual, atribuindo às partes a prerrogativa de
avaliar a pertinência (ou não) de evitar a instauração (ou continuidade) da
ação penal, desde que respeitados os requisitos legais previstos no art. 28-A
do CPP. Se, por um lado, não pode o órgão de acusação deixar de oferecer, sem
justificativa razoável, a proposta de acordo, por outro, não é dado ao
réu/investigado decidir em que momento deseja manifestar-se sobre um acordo que
foi efetivamente proposto.
De fato, sendo o caso de
arquivamento das investigações (nos termos da literalidade do art. 28-A, do
CPP), não se deve celebrar acordo de não persecução penal; isto é, se não há
razão legal para tramitar ação penal, tampouco há justificativa para negociar
acordo que pressupõe confissão e aceitação de cumprimento de obrigações
naturalmente gravosas.
Disto não decorre, todavia,
direito ao investigado/réu de decidir quando se manifestará sobre a proposta
formulada pelo Ministério Público, cabendo-lhe, isto sim, recusar a proposta,
indicando as razões pelas quais sua celebração não se justifica, razões estas a
serem analisadas pelo juízo no momento do julgamento das teses defensivas.
Portanto, considerando que a
parte, devidamente intimada para se manifestar sobre o ANPP proposto pelo
Ministério Público Federal, entendeu (dentro de seu espaço de
discricionariedade) que o acordo não lhe seria vantajoso, uma vez que pretende
ver reconhecidas nulidades suscitadas no recurso especial interposto, mostra-se
de rigor a regular continuidade do feito para que sejam julgadas as teses
recursais.
Em
suma:
A manifestação sobre
a proposta de acordo de não persecução penal deve ocorrer após o seu
oferecimento, não cabendo ao réu ou ao investigado decidir quando se
manifestará.
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp
2.171.590-SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 14/5/2025 (Info 852).
