segunda-feira, 4 de agosto de 2025
A simples localização do crime em mar territorial, bem pertencente à União, não atrai, por si só, a competência da Justiça Federal, sendo necessária a demonstração de que o dano ambiental gerou reflexos em âmbito regional ou nacional
Imagine a seguinte situação
hipotética:
João foi flagrado pescando o
peixe Cioba (Lutjanus analis), dentro da área do Parque Estadual Marinho da
Laje de Santos, uma unidade de conservação criada por decreto estadual.
Vale ressaltar que essa unidade
de conservação está localizada no mar territorial.
O Ministério Público estadual ofereceu denúncia contra João
imputando-lhe o crime do art. 34, parágrafo único, III, da Lei nº 9.605/98
(pesca proibida):
Art. 34. Pescar em período no
qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:
Pena - detenção de um ano a três
anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas
mesmas penas quem:
(...)
III - transporta, comercializa,
beneficia ou industrializa espécimes provenientes da coleta, apanha e pesca
proibidas.
O Juiz de Direito, contudo, declinou da competência,
enviando o processo para a Justiça Federal, alegando que o crime teria ocorrido
em mar territorial, bem pertencente à União (art. 20, VI, da CF/88):
Art. 20. São bens da União:
(...)
VI - o mar territorial;
Logo, haveria interesse federal
e, portanto, a competência seria da Justiça Federal.
O Ministério Público Estadual
recorreu, argumentando que a competência deveria ser estadual considerando que:
• o parque foi criado por decreto
estadual;
• a espécie (peixe Cioba) não
está ameaçada de extinção; e
• os danos foram apenas locais.
O que decidiu o STJ? A
competência é da Justiça Estadual ou Federal?
Justiça Estadual.
O interesse da União que enseja o
deslocamento da competência para a Justiça Federal para o julgamento de crime
ambiental se caracteriza quando a área de preservação for criada por decreto
federal.
No caso concreto, o Parque
Estadual Marinho da Laje de Santos é uma unidade de conservação criada pelo
Estado de São Paulo, por meio do Decreto Estadual nº 37.537/1993, o que atrai a
competência da Justiça Estadual para o julgamento do feito.
O peixe “Cioba” não consta na
lista de espécies ameaçadas de extinção da Portaria MMA 445/2014, o que afasta
o interesse da União sob tal fundamento.
Por fim, importante registrar que
os danos ambientais afetaram apenas a localidade em que a infração foi
verificada, não havendo notícia de dano regional ou nacional aptos a vulnerar
os interesses da União.
A simples localização do crime em
mar territorial, bem pertencente à União, não atrai, por si só, a competência
da Justiça Federal, sendo necessária a demonstração de que o dano ambiental
gerou reflexos em âmbito regional ou nacional, o que não ocorreu no caso
concreto.
Em suma:
A simples localização do crime em mar territorial,
bem pertencente à União, não atrai, por si só, a competência da Justiça
Federal, sendo necessária a demonstração de que o dano ambiental gerou reflexos
em âmbito regional ou nacional.
STJ. 6ª
Turma. AgRg no AREsp 2.313.729-SP, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado
em 3/6/2025 (Info 853).
