sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

O que são alimentos compensatórios? O seu inadimplemento autoriza a prisão civil por dívida?

 

Imagine a seguinte situação hipotética:

João e Regina viviam em união estável.

O relacionamento não deu mais certo e Regina ajuizou ação de dissolução de união estável contra João.

O juiz proferiu sentença declarando que houve união estável e reconhecendo que ela foi dissolvida. Além disso, o magistrado condenou João a pagar, mensalmente, 15 salários-mínimos em favor de Regina, a título de alimentos compensatórios.

 

O que são alimentos compensatórios?

Conforme explica Anderson Schreiber,

“Os alimentos compensatórios são aqueles que buscam minimizar o desequilíbrio financeiro entre os cônjuges ocorrido em decorrência do divórcio ou dissolução da união estável, a fim de proporcionar aos ex-cônjuges ou ex-companheiros o mesmo padrão socioeconômico. Esses alimentos podem ser estabelecidos de forma limitada no tempo, como enquanto não for ultimada a partilha de bens, que atribuirá a um dos ex-consortes patrimônio suficiente para dele extrair rendimentos que assegurem a conservação do seu padrão de vida.” (Manual de Direito Civil Contemporâneo. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020, p. 1322)

 

Os alimentos compensatórios, conforme os ensinamentos de Rolf Madaleno (Manual de Direito das Famílias e das Sucessões, 3ª edição, Ana Carolina Brochado Teixeira e Gustavo Pereira Leite Ribeiro - coordenadores, Rio de Janeiro: Processo, 2017, p. 425), possuem o escopo de:

“(...) indenizar por algum tempo ou não o desequilíbrio econômico causado pela brusca perda do padrão socioeconômico do cônjuge ou convivente desprovido de maiores riquezas materiais, sem pretender a igualdade econômica do ex-casal, mas justamente a pensão compensatória procura reduzir os efeitos deletérios provocados pela repentina indigência social causada pela ausência de recursos e de ingressos que deixaram de aportar com a dissolução da união estável ou com o divórcio.

(...)

A pensão compensatória não tem natureza alimentícia de manutenção permanente do cônjuge ou convivente, mas carrega uma função de inquestionável finalidade indenizatória, para equilibrar a alteração econômica do cônjuge ou convivente financeiramente abalado pelo divórcio ou pela dissolução da convivência informal, até esta disparidade reencontrar o seu ponto de igualdade e serem desfeitas as desvantagens sociais causadas pela separação.”

 

Igualmente defende Maria Berenice Dias (Manual de Direito das Famílias, Revista dos Tribunais, 12ª edição, 2017, p. 621), pontuando que tais alimentos “não têm por finalidade suprir as necessidades de subsistência do credor, mas corrigir ou atenuar grave desequilíbrio econômico-financeiro ou abrupta alteração do padrão de vida do cônjuge desprovido de bens e de meação”.

 

Os chamados alimentos compensatórios, ou prestação compensatória, não têm por finalidade suprir as necessidades de subsistência do credor, tal como ocorre com a pensão alimentícia regulada pelo art. 1.694 do CC/2002, senão corrigir ou atenuar grave desequilíbrio econômico-financeiro ou abrupta alteração do padrão de vida do cônjuge desprovido de bens e de meação.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.290.313/AL, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 12/11/2013.

 

Voltando ao caso concreto:

Depois de algum tempo, João não mais pagou os alimentos, tornando-se inadimplente.

Regina ingressou com cumprimento de sentença e pediu a prisão civil do devedor, nos termos do art. 528, § 3º, do CPC:

Art. 528 (...)

§ 3º Se o executado não pagar ou se a justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o pronunciamento judicial na forma do § 1º, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses.

 

Cabe a prisão civil de João?

NÃO.

Nos termos do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal, somente quando houver o inadimplemento inescusável e voluntário por parte do responsável pelo pagamento de prestação alimentícia, afigura-se possível e cabível a sua prisão civil.

A prisão por dívida de alimentos é medida drástica e excepcional, que somente é admitida excepcionalmente, quando imprescindível à subsistência do alimentando, não estando atrelada a uma possível punição por inadimplemento, ou mesmo à forma de remição da dívida alimentar, tendo como escopo coagir o devedor a pagar os alimentos devidos a fim de preservar a sobrevivência do alimentando.

O inadimplemento dos alimentos destinados à manutenção do padrão de vida do ex-cônjuge, que sofreu drástica redução em razão da ruptura da sociedade conjugal - alimentos compensatórios - não justifica a execução pelo rito da prisão, em razão de sua natureza indenizatória, e não propriamente alimentar (STJ. 3ª Turma. RHC 117.996/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 2/6/2020).

 

Em suma:

O inadimplemento de alimentos compensatórios, destinados à manutenção do padrão de vida de ex-cônjuge em razão da ruptura da sociedade conjugal, não justifica a execução pelo rito da prisão, dada a natureza indenizatória e não propriamente alimentar.

STJ. 4ª Turma. HC 744.673/SP, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 13/09/2022 (Info 757).

 

Além disso, o STJ possui o entendimento de que:

Quando o credor de débito alimentar for maior e capaz, e a dívida se prolongar no tempo, atingindo altos valores, exigir o pagamento de todo o montante, sob pena de prisão civil, é excesso gravoso que refoge aos estreitos e justificados objetivos da prisão civil por dívida alimentar, para desbordar e se transmudar em sanção por inadimplemento.

STJ. 3ª Turma. HC 392.521/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/06/2017.

 

 


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