quinta-feira, 24 de novembro de 2022

A atuação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) em investigações específicas representa violação ao princípio do promotor natural?

 

Imagine a seguinte situação hipotética:

A Promotoria de Defesa do Consumidor recebeu um estudo do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica, autarquia federal, vinculada ao Ministério da Justiça) afirmando que havia indícios de prática de cartel no Estado.

Diante disso, o Promotor de Justiça que atua na Promotoria de Defesa do Consumidor solicitou auxílio do GAECO (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) para realizar uma apuração.

A investigação conseguiu obter inúmeros elementos informativos que serviram para embasar denúncia criminal oferecida pelo Ministério Público contra os envolvidos.

Um dos denunciados impetrou habeas corpus alegando que a atuação do GAECO representou burla à livre distribuição e ao princípio do promotor natural. Logo, deveria ser reconhecida a nulidade da investigação e das provas obtidas.

 

O STJ concordou com os argumentos da defesa?

NÃO.

 

Princípio do promotor natural

De acordo com o postulado do promotor natural, a definição do membro do Ministério Público competente para oficiar em determinado caso deve observar as regras previamente estabelecidas pela instituição para distribuição de atribuições no foro de atuação, proibindo-se a interferência hierárquica indevida da chefia do órgão por meio de eventuais designações especiais.

Nessa medida, a proteção efetiva e substancial ao princípio do promotor natural impede que o superior hierárquico designe o promotor competente, bem como imponha a orientação técnica a ser observada.

O princípio do promotor natural, embora não esteja expressamente previsto, é amplamente reconhecido pela jurisprudência. Sua observância tem por finalidade evitar a constituição da figura do acusador de exceção, cuja atuação durante a persecução penal ocorre de forma arbitrária, injustificada e não prevista em regras abstratas anteriormente estabelecidas.

Nesse sentido:

“O postulado do Promotor Natural consagra uma garantia de ordem jurídica, destinada tanto a proteger o membro do Ministério Público, na medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente do seu ofício, quanto a tutelar a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o Promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e pré-determinados, estabelecidos em lei” (STF. 2ª Turma. HC 103038, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 27/10/2011).

Em concursos públicos, as alternativas também apontam no sentido da existência deste princípio. Confira:

þ (Cartório TJRR 2013 CESPE) O fundamento constitucional do princípio do promotor natural assenta-se nas cláusulas da independência funcional e na inamovibilidade do s membros do MP. (CERTO)

þ (Técnico do TST 2012 FCC) Ao discorrer sobre os princípios constitucionais que devem informar a atuação do Ministério Público, Pedro Lenza afirma que o acusado “tem o direito e a garantia constitucional de somente ser processado por um órgão independente do Estado, vedando-se, por consequência, a designação arbitrária, inclusive, de promotores ‘ad hoc’ ou por encomenda” (Direito Constitucional Esquematizado, Saraiva, 2011, p. 766). Trata-se do princípio do promotor natural. (CERTO)

ý (Procurador TCE/PB 2014 CESPE) Apesar do direito de não ser processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, não se admite a figura do promotor natural, tendo em vista a unidade do MP. (ERRADO)

ý (Promotor MPE SC 2016 banca própria) Dentre os princípios institucionais do Ministério Público encontram-se os da unidade e o da indivisibilidade. Esses princípios afastam, conforme posicionamento mais recente do Supremo Tribunal Federal, a incidência do denominado princípio do promotor natural. (ERRADO)

 

A atuação do GAECO não viola o princípio do promotor natural

A jurisprudência do STJ consolidou-se no sentido de que a atuação do GAECO não viola o princípio do promotor natural. Nesse sentido:

A atuação de promotores auxiliares ou de grupos especializados não ofende o princípio do promotor natural, uma vez que, nessa hipótese, se amplia a capacidade de investigação, de modo a otimizar os procedimentos necessários à formação da opinio delicti do Parquet.

STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1.425.424/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 6/8/2019.

 

Vale ressaltar, contudo, que, para que não haja ofensa ao princípio do promotor natural, o promotor a quem foi distribuído livremente o feito deverá solicitar ou anuir com a participação ou ingresso do GAECO nas investigações.

 

No caso concreto, não houve designação casuística; houve pedido do Promotor responsável

Na hipótese em exame, não há que se falar em violação do princípio do promotor natural, uma vez que não houve designação casuística ou arbitrária do grupo especializado para sua atuação nos autos da investigação. O Promotor de Justiça a quem a investigação foi atribuída solicitou a atuação do GAECO.

 

Em suma:

 

DOD Plus

Jurisprudência em Teses (Ed. 167)

12) A atuação de promotores auxiliares ou de grupos especializados, como o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), na investigação de infrações penais, a exemplo do crime de lavagem de dinheiro, não ofende o princípio do promotor natural, não havendo que se falar em designação casuística.

 

 


Print Friendly and PDF