sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Se o servidor público estadual está respondendo a PAD e pede a concessão de aposentadoria, a Administração Pública poderá determinar a suspensão da tramitação do requerimento até a conclusão do processo, mesmo que isso não esteja previsto na lei estadual?


Imagine a seguinte situação hipotética:

Em julho de 2015, foi instaurado processo administrativo disciplinar contra João, Auditor de Tributos Estaduais no Estado do Paraná.

Logo em seguida, em agosto de 2015, João requereu sua aposentadoria por tempo de contribuição.

A Administração Pública determinou que o processo de concessão da aposentadoria deveria ficar suspenso até que fosse concluído o processo administrativo disciplinar. Essa suspensão foi determinada com base no art. 172 da Lei nº 8.112/90 (Estatuto dos Servidores Públicos federais):

Art. 172. O servidor que responder a processo disciplinar só poderá ser exonerado a pedido, ou aposentado voluntariamente, após a conclusão do processo e o cumprimento da penalidade, acaso aplicada.

 

Mandado de segurança

João impetrou mandado de segurança contra esse ato administrativo alegando que a sua carreira se sujeita ao regime jurídico da Lei Complementar Estadual nº 131/2010 e que esse diploma não prevê a possibilidade de suspensão do pedido de aposentadoria de Auditor Fiscal que responda a PAD.

O impetrante argumentou ainda que o Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado do Paraná (Lei nº 6.174/1970), que lhe é aplicável subsidiariamente, também não traz nenhuma previsão nesse sentido.

Logo, como a lei de carreira e a lei geral dos servidores públicos estaduais não preveem essa suspensão, ela seria ilegal por ofensa ao princípio da legalidade administrativa segundo a qual o administrador somente pode fazer aquilo que está autorizado expressamente na lei.

Afirmou, ainda, que a aplicação do art. 172 da Lei nº 8.112/90 seria indevida e caracterizaria analogia in malam partem.

 

O STJ concordou com os argumentos do impetrante?

NÃO.

O STJ afirma que é possível a aplicação da Lei nº 8.112/90, como regra geral, de forma subsidiária aos servidores públicos estaduais, quando os Estatutos de Servidores Públicos Civis Estaduais tiverem lacunas e essa aplicação não representar nenhum conflito com norma específica. Nesse sentido:

É possível aplicar, de forma analógica, a Lei Federal nº 8.112/90 em face da falta de regulamentação específica sobre determinada questão na legislação própria do ente federativo.

STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1576667/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 15/03/2016.

 

A partir dessa premissa jurisprudencial, o STJ já reconheceu a possibilidade de se determinar a suspensão do processo de concessão de aposentadoria de servidor público local durante o período em que esse responde processo administrativo disciplinar, tendo sido, inclusive um precedente também oriundo do Estado do Paraná:

A lacuna na Lei Complementar Estadual n. 131/2010 do Estado do Paraná acerca da possibilidade de suspender o processo de aposentadoria enquanto tramita o processo administrativo disciplinar deve ser suprida com a aplicação subsidiária da Lei n. 8.112/1990.

Trata-se de legítima integração da legislação estadual por meio da aplicação subsidiária da norma federal, consoante pacífica jurisprudência.

STJ. 2ª Turma. AgInt no RMS 58.568/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 19/10/2020.

 

Em suma:

 

DOD Plus

E a aplicação analógica em benefício do servidor, é possível? Ex: para o pagamento de determinado adicional?

Neste caso, há algumas restrições adicionais:

(...) I - Na origem, trata-se de ação em que se pretende o pagamento de adicional de insalubridade. Na sentença, julgou-se procedente o pedido. No Tribunal a quo, a sentença mantida. Esta Corte deu provimento ao recurso especial para julgar improcedente o pedido.

(...)

IV - A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que a analogia das legislações estadual e municipal com a Lei n. 8.112/1990 somente é possível se não houver regramento de cunho constitucional autoaplicável, bem como que importe em aumento de gastos públicos. Nesse sentido: RMS n. 46.438/MG, relator Ministro Humberto Martins, segunda turma, julgado em 16/12/2014, DJe 19/12/2014.

V - Na hipótese, verifica-se que a aplicação analógica da Lei n. 8.112/1990 aos servidores estaduais geraria inegável aumento nos gastos públicos, uma vez que se trata do pagamento de adicional de insalubridade. Desse modo, é incabível a aplicação analógica da mencionada Lei Federal à presente hipótese. No mesmo sentido, a seguinte decisão monocrática, de minha relatoria: REsp n. 1.694.891-AP, de 24 de maio de 2018.

(AgInt no REsp 1.839.014/AP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 30/11/2020)

 

(...) 1. Na hipótese dos autos, extrai-se do acórdão vergastado que o entendimento do Tribunal de origem não está em consonância com a orientação do STJ. Com efeito, a analogia das legislações estaduais e municipais com a Lei 8.112/90 somente é possível se houver omissão no tocante a direito de cunho constitucional autoaplicável, e se a situação não der azo ao aumento de gastos, não se enquadrando nessa hipótese o adicional de insalubridade. (...)

(REsp 1.826.962/AP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 6/2/2020)

 


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